Abertura de comportas de barragens no Rio São Francisco causa inundações em Juazeiro (BA)

A Chesf emitiu alerta sobre maior vazão dos últimos 13 anos, que também deve atingir municípios de Pernambuco, Alagoas e Sergipe

A Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf) alertou, nas últimas semanas, que abriria as comportas de suas barragens, provocando inundações em pelo menos 16 pontos nas regiões do Submédio e do Baixo São Francisco, com vazões entre 2.500 a 4.000 m³/s. Diversas cidades entraram em alerta, como Juazeiro, Paulo Afonso e Curaçá, na Bahia, Petrolina e Santa Maria da Boa Vista, em Pernambuco, e outros municípios de Alagoas e Sergipe.

Em Juazeiro (BA), o aumento do nível do rio é visível na orla e algumas famílias do bairro Angary foram orientadas a deixarem as suas casas por conta das inundações com vazões a partir de 3 mil m³/s.

Em Petrolina (PE), as ilhas já começaram a ser inundadas, incluindo a Ilha do Fogo e o Balneário do Rodeadouro, que é ponto turístico da cidade.
Em Santa Maria da Boa Vista (PE), o aumento do nível do rio já impactou áreas produtivas de pequenos produtores, causando perdas agrícolas.

Segundo a Chesf, essa que é a maior vazão dos últimos 13 anos acontece em decorrência das fortes chuvas que atingiram os estados da Bahia e Minas Gerais nos últimos meses. A vazão de 4 mil m³/s, proveniente das hidrelétricas de Sobradinho (BA) e Xingó (SE), representam a metade da vazão máxima que a Chesf pode praticar no rio de acordo com as regras de controle de cheias.

Segundo Carlos Augusto, morador e liderança comunitária do bairro de Angary, as inundações atingiram as casas de várias famílias ribeirinhas. “O que nos preocupa é o que vem depois que o rio baixar, porque agora as pessoas estão alojadas, tendo assistência, mas depois que puderem voltar para suas casas, esperamos que não sejam esquecidas novamente”, afirma o morador, que é conhecido como Neguinho do Angary.

Inundações em Angary: problema estrutural

Inundações no bairro Angary em Juazeiro (BA) provocadas pela abertura das comportas da Hidrelétrica de Sobradinho. Foto: Marcos Souza / MAB

Para Marcos Souza, um dos coordenadores do MAB na Bahia, a insegurança das famílias ribeirinhas é relacionada a um contexto estrutural de abandono. “As inundações no Angary não são uma novidade para os moradores. Esse processo é histórico e precisa ganhar visibilidade. Estamos falando de um bairro de luta e resistência, que, embora passe por diversas dificuldades diárias, carrega consigo uma história de pertencimento e construção do que Juazeiro é hoje”, afirma o militante.

Segundo Marcos, o MAB vem alertando há muitos anos sobre as insuficiências institucionais no processo de proteção e reparação das populações atingidas. “O estado de alerta instaurado com as chuvas e a possibilidade de rompimento de barragens já faze parte do cotidiano dos atingidos. A ajuda humanitária é essencial no primeiro momento em que as inundações acontecem, porém, as questões estruturais que provocam esses alagamentos e os danos que decorrem deles devem ser analisadas com maior atenção”, ressalta Marcos.

Atualmente, está em tramitação no Senado Federal a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens. O objetivo da política – reivindicada pelo MAB – é garantir os direitos da população afetada por esses empreendimentos, assim como evitar o rastro de destruição da natureza que o processo de construção dessas estruturas gera.

Para a coordenação do MAB, a dívida socioambiental, acumulada por décadas com a construção de barragens no Brasil, só cresce com o descaso do governo federal e sua conivência com a falta de reparação por parte das empresas responsáveis pelos empreendimentos. Os danos causados incluem a violação dos direitos das famílias atingidas pelas chuvas e enchentes, pela abertura de comportas e rompimentos de barragens. “Além disso, as leis que já asseguram os direitos dos atingidos, como a Lei Nº 14.066/2020, que altera o regramento aplicável à segurança de barragens no Brasil, precisam ser concretamente implementadas pelas empresas, como a Chesf”, afirma Marcos Souza.

Marcos destaca ainda a importância das campanhas de solidariedade para as famílias que tiveram suas casas tomadas pela água e também da organização e articulação das pessoas atingidas para reivindicar seus direitos. “Nesse momento, é muito importante a organização das famílias, a garantia da assistência pelos órgãos competentes e a certeza de que nenhuma outra violação passe despercebida”, pontua.

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