Cláudia Brandão | Os atingidos pela lama de Brumadinho pedem justiça
Agricultora, que viu seu sítio, uma casa e a produção agrícola serem tomados pela lama tóxica do Rio Paraopeba na enchente de 2021 quer uma chance pra recomeçar em outro lugar
Publicado 25/01/2023 - Atualizado 25/01/2023
Nascida em Belo Horizonte (MG), a agricultora Cláudia Brandão de Freitas, 51, se mudou para um sítio no município de Mário Campos, à beira do Rio Paraopeba em 2017, junto com o marido, dois filhos e uma nora que compartilhavam o sonho de terem uma vida mais tranquila perto do rio. “A gente queria viver do que podíamos produzir no sítio: começamos com uma horta grande de hortaliças, galinhas e um poço de peixes. Também tínhamos uma casa para alugar para turistas nos finais de semana”. O plano foi abruptamente interrompido em 2019. Com o rompimento da Barragem da Mina Córrego do Feijão, de propriedade da Vale, que provocou a devastação do Rio Paraopeba e trouxe o medo de contaminação, o turismo entrou em declínio na região e os turistas desapareceram. A água do rio ficou inutilizável para a produção agrícola, lazer ou qualquer outro fim.
Cláudia e a família tentaram manter a produção de alimentos com técnicas hidropônica e o uso de água de caminhão pipa. Apesar da persistência, tudo que seria uma fonte de renda pra família foi tomado de novo pela lama com rejeito de minério da Vale durante a enchente de 2021, em que o Rio Paraopeba subiu até o telhado de uma das casas da propriedade.
“A mesma lama que foi jogada no rio no dia 25 de janeiro de 2019 chegou aqui dentro de casa no ano passado. E agora agora saiu um estudo que mostra que o rio está contaminado com uma superbactéria que pode afetar a saúde dos moradores. E a gente continua dentro dessa mesma lama, cercado pela lama. Minha grama cresceu em cima da lama. Meus bichos andam nessa lama.”
Cláudia Diógenes
“E a qualidade de vida da gente hoje é zero. A gente está todo dia passando mal, todo dia tem dor de cabeça ou sente alguma coisa diferente e a gente fica sem saber se é intoxicação”, continua a moradora.
Enquanto caminha pela propriedade sobre a grama que nasceu da lama, Cláudia reflete sobre o projeto de vida interrompido. Segundo ela, o crime que se completa quatro anos hoje, 25, mudou completamente as suas perspectivas e destruiu um sonho que sua família levou muitos anos pra concretizar.
“A gente não caiu aqui de paraquedas. A gente escolheu aqui justamente porque tinha o rio no fundo e poderia ser uma fonte de lazer e porque a gente poderia usar para o cultivo das hortaliças e criar os bichos. Mas os peixes morreram por causa do cloro da água do caminhão pipa. A horta – de alface, rúcula, cebolinha, coentro, cebola, abobrinha, milho – virou lama”.
Além do prejuízo econômico, Cláudia relata que o drama vivido pela família é agravado pela falta de perspectivas e a lentidão da justiça. “Tudo aqui é uma luta. A gente não tem nem informações sobre o que vai acontecer com a gente. Nos primeiros dias, foi o pessoal do MAB que veio aqui conversar com a gente e explicou que não podíamos beber a água que a gente tinha. Eu tive que sair falando com todos os vizinhos. Quando a nossa casa foi tomada pela lama da enchente, no ano passado, a Vale disse que não era responsabilidade dela. Foram dias de enxada tentando tirar lama tóxica de dentro de casa. O Ministério Público veio aqui disse que a Vale estava errada, mas até hoje não nos deu nenhuma resposta sobre a nossa situação. ”
A agricultora conta que o que ela mais deseja hoje é uma chance de recomeçar a vida.
“A Vale deveria tirar todos os ribeirinhos da beirada do rio. Não sou só eu que estou nessa situação. Ela deveria tirar todo mundo e pagar o que a gente precisa pra recomeçar em outro lugar, mas é tudo tão lento. A justiça não anda. Eu não tenho pra onde ir e tenho que conviver com essa realidade todos os dias, me arriscando a adoecer”.