Pelo menos 80 medidas antiambientais de Bolsonaro precisam ser anuladas ou corrigidas nos primeiros dias do mandato
Publicado 14/11/2022
A degradação ambiental que marcou o mandato de Jair Bolsonaro (PL) só foi possível graças à colaboração do próprio Estado brasileiro. Segundo o Instituto Talanoa, ONG que reúne pesquisadores da área socioambiental, foram pelo menos 400 decretos, portarias e resoluções que permitiram o aumento do desmatamento ilegal.
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Editadas pelo Executivo, essas medidas estão agora na mira da equipe de transição de governo, comandada por Geraldo Alckmin (PSB). Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se comprometeu a reconstruir a política ambiental brasileira, atraindo apoio de pesquisadores, ativistas e povos tradicionais que vivem nos biomas.
Assista ao vídeo:
Resistência do agro desmatador
O deputado federal Nilto Tatto (PT-SP), um dos coordenadores do setor ambiental da campanha de Lula, diz que o presidente eleito está comprometido com o “revogaço” ambiental. Ele reconhece que pode haver resistência de setores do agronegócio que lucraram alto com a expansão quase sem limites da fronteira agropecuária.
“Nós sabemos que vai ter resistência. Estamos assistindo um bando de malucos contestando o resultado das eleições. Mas ficou muito explicitado durante a campanha que é necessário tomar uma série de medidas, inclusive para o benefício do agronegócio”, afirma o parlamentar.
Segundo ele, as mudanças climáticas já começam a dar prejuízos para produtores rurais. Além disso, setores do agronegócio que vivem de exportação encontraram barreiras internacionais aos seus produtos.
“O programa de Lula passou pelo processo eleitoral e venceu. Então o ‘revogaço’ tem a força de um presidente que foi escolhido pelo povo brasileiro. Evidente que vai ter um setor minoritário que vai resistir, mas é um setor que eu acredito que logo vai ficar isolado dentro do próprio campo”, projeta Tatto.
100 normas devem ser revistas urgentemente
Das 400 normas antiambientais de Bolsonaro, entre 80 e 100 precisam ser revistas logo nos primeiros dias de governo, segundo o Observatório do Clima. São medidas que estruturaram o desmonte da política ambiental da era Bolsonaro. Com elas em vigor, não será possível avançar.
Segundo a ex-presidente do Ibama e especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima (OC), Suely Araújo, rever as medidas é imprescindível, mas não suficiente. Será preciso reescrevê-las e atualizá-las. Uma das prioridades deve ser a reestruturação do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), esvaziado por Bolsonaro.
“O Conama foi enxugado e desestruturado. A representação da sociedade civil foi toda deturpada, porque passaram a fazer escolha [dos integrantes] por sorteio. Nós temos que editar um novo decreto corrigindo isso e atualizando a composição do Conama. Não basta voltar ao que ele era”, pontua Araújo.
Outra política que deve ser revogada é o programa Adote um Parque, que repassou a grandes empresários a gestão de unidades de conservação, sob a justificativa de desonerar o Estado. O Observatório do Clima diz que o investimento da iniciativa privada nas áreas de preservação nunca aconteceu. É um exemplo de uma política ambiental fracassada, que deve ser extinta a partir de 2023.
A expectativa é que Lula revogue também as normas que dificultaram a aplicação e a cobrança de multas ambientais por parte do Ibama.
Especialistas otimistas com “revogaço”
A coordenadora de Política e Direito do Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos, aposta que o “revogaço” será colocado em prática. Quando foi presidente, lembra Ramos, Lula e Marina Silva (Rede), então ministra do Meio Ambiente, reduziram o desmatamento na Amazônia em 70%.
“O fato de Lula ter ao lado dele, nessa campanha de segundo turno, a Marina, trazendo uma proposta que deu mais consistência à agenda ambiental no programa de governo, é uma sinalização muito objetiva para quem já teve oportunidade de ver que essas pessoas juntas conseguiram fazer a diferença”, afirmou ao Brasil de Fato.
“Com certeza o governo fará o ‘revogaço’ logo nas primeiras semanas, talvez nos primeiros dias”, concorda Suely Araújo, do OC. Ela ressalta que a expectativa pela reconstrução da política ambiental brasileira não está restrita a especialistas, pesquisadores e ativistas, mas presente no conjunto da sociedade.
“A política ambiental está em situação de terra arrasada e precisa ser toda reconstruída. Nós precisamos realmente começar com esse trabalho coletivo, que é grande e difícil, mas que coloca esperança em todos que viram a destruição causada pelo governo Bolsonaro”, diz Araújo.