No Brasil de Bolsonaro: lideranças cristãs são ameaçadas por conta de trabalho social

Diante do acirramento da violência política promovida pelo bolsonarismo, padres e pastores que, assim como Jesus, defendem os direitos da parcela mais oprimida da população, têm sofrido ameaças e agressões verbais em todo o país

Padre Claret em Audiência Pública em Barra Longa (MG) em 2015. Foto: Joka Madruga

Diante da escalada de violência promovida por Bolsonaro e sua família especialmente através das redes sociais, muitas lideranças religiosas passaram a ser acusadas de satanistas e esquerdopatas e entraram no foco das milícias digitais e da cultura do ódio, que assolam o país. Alguns temem pela própria vida e precisaram recorrer à Justiça e ao Estado por proteção física.

São sacerdotes e pastores que tentam praticar o Evangelho junto aos mais pobres – como fazia Cristo segundo a Bíblia- e, para isso, adentram as periferias do Brasil e comunidades tradicionais para lutar contra as desigualdades, os desastres ambientais, o direito à moradia ou pela inclusão das minorias.

Padre Antonio Claret conheceu o Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB no início da década de 1990, quando diversos projetos de barragens de hidrelétricas eram previstos para a região do Alto Rio Doce, zona da Mata Mineira, onde ele vivia. “Na época, o povo organizado conseguiu resistir a vários deles em uma luta contra duas grandes empresas: a Fiat e a mineradora Alcan. Foi uma vitória histórica”, conta o padre.  

O sacerdote ressalta que, anos depois, os crimes da Vale em Mariana e Brumadinho transformaram a dinâmica da região. Em 2019, ele foi deslocado pela Arquidiocese de Mariana para Congonhas com o objetivo de atuar com comunidades atingidas pelas barragens da região a partir da metodologia das comunidades eclesiais de base.

Ao todo, vinte e quatro barragens cercam a histórica Congonhas, 54% delas com alto dano potencial associado. Em caso de desastres, bairros inteiros seriam devastados, já que a barragem de maior risco (Casa de Pedra) está muito próxima do perímetro urbano.

“Muitas pessoas adoecem. Em toda a cidade, a qualidade do ar é muito ruim por causa da poeira que provoca muitas doenças respiratórias. Além disso, as empresas vão se apropriando da água. Enquanto a cidade consome 470 metros cúbicos de água por dia, somente a CSN tem 3.170 metros cúbicos diariamente. Em caso de rompimento, a Casa de Pedra atinge as bacias do Paraopeba e do São Francisco. O governo Bolsonaro agrava muito essa situação, pois, com ele, as mineradoras ficam completamente à vontade”, afirma o sacerdote.

Segundo Claret, hoje ele vive na Paróquia Nossa Senhora da Conceição com a missão a articular o povo (que vive dia e noite com medo de ser soterrado) para reivindicar os seus direitos em relação à segurança, moradia digna e proteção do território.  

“Em 2021, as mineradoras tiveram 16 bilhões de lucro a partir da exploração do minério de ferro e deixaram 600 milhões em royalties. A prefeitura bolsonarsta tem um caixa, hoje, de 1 bilhão e 600 milhões num município com 55 mil habitantes, mas a dívida ambiental e social com o povo ainda é enorme”, afirma o sacerdote.

Segundo Claret, além de lutar contra a exploração e os abusos das mineradoras, as lideranças sociais da região hoje precisam enfrentar os bolsonaristas que promovem ameaças contra todos que defendem os direitos humanos e a população mais vulnerável.

Bolsonaro participa da Marcha para Jesus em 2019. Foto: Reprodução

“O clima de insegurança no governo Bolsonaro aumentou muito, porque a violência disseminada pelas autoridades acaba se reproduzindo nos municípios. Mesmo colegas nossos que não estão diretamente na linha de frente da luta são confrontados, inclusive dentro das celebrações”.

Em todo o Brasil muitas lideranças religiosas sofrem ameaças e são acusadas de uso político da fé em meio à tensão do encontro entre uma igreja mais próxima das comunidades defendida pelo papa Francisco e o ultraconservadorismo empoderado por Bolsonaro.

“O que se nota é que esse governo aflorou uma militância aguerrida da ultradireita, com o agravante do elemento religioso. A apropriação da sensibilidade religiosa e sua manipulação para interesses da burguesia é algo extremamente violento”.

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