Relatório anual aponta recorde de desmatamento ilegal na Amazônia

De iniciativa do projeto MapBiomas, o documento enfatiza a Amazônia como principal foco dos desmontes ambientais; menos de 1% dos crimes sofreram ações de fiscalização

Sendo o maior país da América Latina em extensão territorial com uma pluralidade de biomas específicos de região para região, o Brasil possui uma longa tradição e compromisso político e público de monitoramento e combate ao desmatamento. Segundo os dados alarmantes do Relatório Anual do Desmatamento 2020, publicado pelo projeto MapBiomas Alerta, 99% desses desmontes ambientais acontecem de forma ilegal, sem a autorização e acompanhando dos órgãos competentes e de referência. 

No final dos anos 80, por iniciativa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) foi criado o Programa de Monitoramento do Desmatamento da Amazônia (PRODES) e, pouco depois, o Mapa Remanescentes Florestais da Mata Atlântica. Desde então essas estruturas de monitoramento aumentaram e foram atualizadas, a fim de apresentar uma maior assertividade em termos de cobertura instantânea e geográfica, contudo, essas realizações confrontam-se com a ausência de ações legais e de conclusões punitivas aos responsáveis pelas destruições ilegais de vegetações nativas e de infrações ao meio-ambiente. 

Em 2020, foram identificados, validados e refinados 74.218 alertas de desmatamento em todo o território nacional, totalizando 13.853 km2 de área invadida. Os estados que lideram essas áreas detectadas são: 1º, Pará (366.335 ha), com o município de Altamira; 2º Mato Grosso (178.184 ha); 3º Maranhão (167.366 ha); 4º Amazonas (127.968 ha); 5º Rondônia (114.994 ha) e 6º, Bahia (108.315 ha). Juntos, estes cinco estados respondem por mais de 76% do desmatamento detectado no país em 2020, trazendo à luz as regiões mais atingidas em termos de negligência e irresponsabilidade ambiental. 

Os dados são oficiais e preocupantes, e embora existam políticas que visem combater, controlar e minimizar essas ilegalidades, há em contraponto a resistência no âmbito governamental, principalmente em escala federal, de que essas políticas sejam cumpridas efetivamente. Um exemplo dessas contradições foi a exoneração do ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, alvo da operação Akuanduba da Polícia Federal onde investigam-se suspeitas de facilitação à exportação ilegal de madeira do Brasil para os Estados Unidos e Europa. 

Francisco Kelvim, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), salienta que apesar da decisão de exoneração, persiste o interesse crônico do governo Bolsonaro de devastar a Amazônia. 

“Vivemos sob essa gestão de Ricardo Salles no MMA e que seguirá com o novo ministro um desmonte por completo de toda política ambiental. A destruição da Amazônia é o projeto de Bolsonaro para a região em conluio com os interesses tanto dos criminosos, quanto das grandes multinacionais que têm interesse na floresta”, afirma Francisco Kelvim. 

O monitoramento é a peça fundamental para a tomada de ações de controle e restrição do desmatamento, e atualmente existem pelo menos onze sistemas, nacionais e internacionais, que fazem essa cobertura no Brasil. Do total de alertas recebidos, 79% estão no bioma Amazônia, 10% no bioma do Cerrado, e 5,8% na Caatinga. Porém, dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) de 2018, revelam que menos de 1% dessas áreas desmatadas na região da Amazônia entre os anos de 2005 e 2018 foram repreendidas por multas, ações civis públicas ou embargos. 

Para que de fato hajam práticas resolutivas sobre o desmatamento ilegal, é vital o ataque às impunidades e a atuação em três principais frentes: (i) garantia que todo desmatamento seja detectado e reportado; (ii) garantia que todo desmatamento reportado de natureza ilegal receba ação para responsabilização e punição dos infratores (ex. autuações, embargo) e, por fim, (iii) assegurar que o infrator não se beneficie da área desmatada ilegalmente (ex. suspensão do Cadastro Ambiental Rural (CAR), cancelamento de regularização fundiária, exclusão de cadeias produtivas). 

Além desses apontamentos, também se faz necessário o entendimento de que essas práticas precisam ser um compromisso assumido a longo prazo com a preservação do meio ambiente. 

Com esse governo o pior para a Amazônia sempre estar por vir. Mas mesmo após Bolsonaro serão necessários anos para reverter essa agenda. O desmatamento, a grilagem, a mineração e a redução de áreas de proteção não é somente um projeto bolsonarista, mas da elite brasileira e de grandes transnacionais”, sinaliza Francisco Kelvim 

O desmatamento é uma intervenção de alto impacto ambiental e, no Brasil, deve ser precedido de uma Autorização de Supressão da Vegetação (ASV), emitida pelos órgãos estaduais de meio ambiente (OEMAs) e o IBAMA, nos casos em que envolve áreas públicas federais ou projetos que envolvem dois ou mais estados. 

A produção do Relatório Anual do Desmatamento 2020 compõe uma série de determinação do MapBiomas Alerta, que surgiu no final de 2018,  com o intuito de agregar valor aos sistemas já existentes de monitoramento do desmatamento no Brasil, garantindo que cada alerta de desmatamento pudesse ser inspecionado com imagens de satélite de alta resolução espacial e determinado o seu grau de regularidade legal. 

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