Como parte da jornada de luta, ato internacional denuncia casos de violações por empresas em outros países

Evento fortalece laços internacionais entre atingidos em diversos países, que também sofrem com os efeitos do “lucro a todo custo”

Como parte da jornada “Vale com a injustiça nas mãos: 5 anos sem reparação na bacia do Rio Doce”, ocorreu na manhã desta terça-feira (3) de forma virtual, um ato internacional com o objetivo de fortalecer o internacionalismo e a solidariedade entre os atingidos por barragens.

O evento contou com a presença de representantes de movimentos de luta de vários países, entre eles: Colômbia, Uruguai, País Basco, Bolívia, Honduras, Moçambique, Canadá, Venezuela, Panamá e Chile. A maioria dos presentes integram o MAR (Movimiento de los Afectados por Represas), a organização internacional de atingidos por barragens.

Juan Pablo Soler, do Movimiento Ríos Vivos, da Colômbia, afirmou que a BHP Billiton, uma das criminosas de Mariana, também atua em seu país de forma irresponsável. Segundo Soler, além da empresa também a Vale segue impune, atuando em outros países, fazendo o mesmo que fizeram em Mariana. “Por isso, precisamos mudar o modelo energético, avançando para um projeto energético popular, que só será possível se conseguirmos incluir as comunidades e os territórios nos processos de planejamento e decisão”, aponta Soler.

A Vale também foi denunciada por Maria do Céu, moçambicana que declarou quão nefasta a empresa é para as mulheres em seu país. Em vídeo enviado para a organização do ato, Maria do Céu afirmou que a mulheres são as principais prejudicadas com ação minerária da Vale. “Elas não são reconhecidas como atingidas e tem perdas financeiras muito grandes”, afirma.

Martin Mantxo, ativista no País Basco, disse que na primeira vez que esteve no Brasil, na Rio + 20, em 2012, participou de um protesto em frente à sede da Vale, no Rio de Janeiro, contra a forma de atuação da empresa em outros países. Não imaginava que pouco tempo depois essa empresa seria a responsável por dois crimes tão violentos em Minas Gerais. Em 2016, no marco de um ano do crime, pode ver o local destruído e conversar com muitos atingidos. “Vendo aquilo, me chamou atenção de que na lama nada crescia. Agora me chama atenção, que mesmo depois de cinco anos, as famílias ainda não receberam nada”, declara o ativista.

Karin Nansen, da organização Amigos da Terra Internacional, do Uruguai, mencionou que o Tratato Vinculante sobre Empresas Transacionais e Direitos Humanos, que está sendo construído no âmbito das Nações Unidas, inclusive com a contribuição do MAB, é uma tentativa de avançar em mecanismos que imponham limites e punam as empresas que atuam em diversas partes do mundo, sem um mínimo de regras e deveres a seguir.

O capitalismo é o responsável

Ainda segundo Karin, a ação criminosa que levou a morte de 20 pessoas não pode ficar impune. Para ela é preciso muita unidade para mudar este sistema que impõe o lucro ao mesmo tempo que despreza a vida humana, a natureza e os direitos do povo.

Para Karin Nansen, “o crime da Samarco deixou visível que o sistema capitalista é imcompatível à vida e tem consequencia irreversíveis aos povos e à natureza”. E complementa: “a imposição do racismo, do colonialismo, do deslocamento forçado das populações é inerente ao modo de operação capitalista, é instrínseco ao modelo de exploração da classe trabalhadora”.  

Martin Mantxo recorda que em janeiro deste ano teve a oportunidade de conversar com os atingidos de Brumadinho e também com os atingidos de Mariana. “É o mesmo crime, é o crime do capitalismo, que tem uma fé cega no seu poder, na sua tecnologia, na sua infalibilidade”, disse. Ele relatou que em seu país há uma barragem na iminência de rompimento há poucos quilômetros de um povoado de cinco mil habitantes, e que é muito provável que a história se repita, por isso pede por memória, reparação e justiça por Brumadinho, Mariana e para todos os atingidos por barragens.

Soniamara Maranho, da coordenação nacional do MAB, também lembrou das várias barragens na região metropolitana de Belo Horizonte com ameaça de rompimento. Lembrou também da responsabilidade da Vale sobre as 292 mortes nos crimes de Mariana e Brumadinho. No entanto, há uma grande contradição, declara: “A Vale tenta manter a Justiça nas suas mãos e ‘cuidar’ das vitimas que ela mesma cometeu”.

Soniamara refere-se ao sistema judiciário que tem sido cúmplice da atuação da empresa. A coordenadora do movimento também denunciou que nenhuma casa foi construída em cinco anos, que houve a tentativa de retirada de direitos dos atingidos em meio à pandemia do coronavírus e que a empresa nega que haja riscos à saúde relacionados aos metais pesados acumulados no corpo dos atingidos, além das questões ambientais.

Um viva à luta popular e ao internacionalismo

Todos os participantes manifestaram solidariedade ao MAB e a sua luta na bacia do Rio Doce. Para a uruguaia da Amigos da Terra, Karin Nansen, a disputa em torno do território e por um projeto político se reproduz em todo o mundo, “por isso a necessiadde de avançar na luta internacionalista, a justiça não será possível se não houver o internacionalismo”, declara.

“Nosso profundo reconhecimento ao MAB, aos atingidos que estão levando avante uma organização popular desde as bases, que possibilitará uma mudança, com direitos à classe trabalhadora, às mulheres, indígenas, quilombolas”, conclui.

Soniamara finalizou mencionando que a tarefa e o compromisso do MAB é de fortalecer a articulação internacional para a construção de um mundo junto, onde a produção da riqueza seja distribuida entre todos os trabalhadores e trabalhadoras que a produziram. “Temos o desafio de construir um projeto energético popular, primeiro em nossos países com a luta pela soberania, mas também em nível internacional”, finaliza.

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