Continua a tragédia em Hidroituango

O número de evacuados já atinge 15 mil na região do projeto hidroelétrico Hidroituango, o maior da história da Colômbia. O risco de rompimento da barragem é alto. Foto: Luis […]

O número de evacuados já atinge 15 mil na região do projeto hidroelétrico Hidroituango, o maior da história da Colômbia. O risco de rompimento da barragem é alto.


Foto: Luis Benavides.

A situação em Antioquia, Colômbia, ainda é alarmante. A possibilidade da barragem de Hidroituango (a maior da história do país) estourar é alta, e as comunidades da região vivenciam há um mês a agonia diária de não saber o que pode acontecer com as suas vidas e as suas comunidades. É uma situação semelhante à vivenciada pelos atingidos pelo crime da Samarco em Mariana, Minas Gerais. Morte, despejo, incerteza e maus tratos das empresas – características que já se tornaram um padrão dos projetos hidroelétricos na América Latina.  

Vários técnicos colombianos já o anunciavam, e um informe recente de técnicos norte-americanos reafirma que a obra está em “risco máximo de colapso” e que os materiais usados na construção da barragem não cumprem os padrões internacionais. Os técnicos afirmam também que poderia acontecer uma avalanche dentre 10 e 40 milhões de metros cúbicos, criando a maior avalanche de história.

Segundo Empresas Públicas de Medellín (EPM), responsável pelo projeto, o risco continua “alto” por três motivos principais. O primeiro é o risco do caudal de água que está passando pela central de máquinas e impacta no nível de água do lago da barragem. O segundo é o risco de avalanche, já que na zona continuam as quedas e movimentações da terra. E, por último, as filtrações no muro da barragem.

A situação é tão caótica que se gerou uma grande polêmica entre o Governador de Antioquia Luiz Pérez e EPM. Pérez, que tinha dito em abril deste ano que “Hidroituango é o projeto mais importante que vai ter Colômbia em toda a sua história no setor elétrico” passou a atacar a empresa. Numa carta, Perez escreveu: “EPM tem que sair dessa bolha na que só aceita informação que lhe convém, porque o diretório está impreciso e desinformado”.  

Resistir sempre

A Fundação para a Liberdade de Imprensa (FLIP) advertiu num comunicado que recebeu diversas denuncias sobre casos de censura na informação que as autoridades da empresa permitem divulgar sobre o projeto. A FLIP também teve acesso a denuncias de ameaças aos trabalhadores da empresa para que não entregassem informação aos jornalistas que estão acompanhando a situação.

Neste sentido, a Aliança de Meios Alternativos denuncia que em Puerto Valdivia, primeira comunidade de águas abaixo da barragem, a Polícia e o mando do Exército não estão permitindo o ingresso da imprensa independente nos albergues onde os evacuados se encontram. Vários destes atingidos denunciam que só é permitido para eles falar com a grande mídia.

O Movimento Rios Vivos, que integra o Movimiento de Afectados por Represas en América Latina, luta nas comunidades contra o projeto Hidroituango desde antes de ele ser construído. Num comunicado publicado na terça 5 de junho, Rios Vivos expressa: “Não precisa ser especialista para saber que este projeto estava condenado ao fracasso. Não é preciso presumir sabedoria para entender que a arrogância nos impôs esta obra de destruição, e o mal chamado desenvolvimento, que hoje sabemos o que é. Desenvolvimento para Hidroituango é não ter água, não ter casa, ver as montanhas cair, ver as pontes inundadas ou destruídas, nossos cultivos perdidos, não ter comida, ter doença, não dormir de angustia, não ouvir os pássaros, não ter peixes, sofrer deslocamento forçoso, estar sometidos a que decidam por nós até o mais básico”. Nesse sentido, Rios Vivos demanda uma participação ativa dos atingidos nos processos de decisão e a possibilidade de decidir sobre seu destino, coisa que tem sido negada desde a chegada do projeto na região. 

Já desde aquele momento, por volta de 1997, a violência foi o caminho do capital e o Estado para impor o projeto. Um ano antes, em 1996, as Autodefesas Unidas de Colômbia (AUC, grupo paramilitar de extrema direita) se instalaram na região, e no ano seguinte, com Álvaro Uribe (denunciado pelo seu vínculo com o paramilitarismo) como presidente do país, criou-se uma sociedade de fomento do Projeto Hidroelétrico. No caminho, grandes massacres, e mais de 600 corpos de desaparecidos que já não poderão ser desenterrados depois da construção de Hidroituango.

O vale do Rio Cauca antes da barragem, em julho de 2015. Foto: Bibiana Ramirez/ Agência Prensa Rural.


O vale do Rio Cauca parcialmente inundado, durante a emergência na usina, maio de 2018. Foto: Bibiana Ramirez/ Prensa Rural.


Isabel Cristina Zuleta, uma das porta-vozes do movimento, disse: “O que queremos é que deixem o rio livre e deixem a gente em paz, que já tivemos suficiente. Porque deixar o rio livre? Porque se não o risco não vai desaparecer. É simples e claro. Venderam-nos a mentira de que todos têm que rezar para que o muro chegue à quota 410 que seria a “segura”, mas o problema de fundo é que há um deslizamento constante da montanha”.

O que Rios Vivos reivindica é o desmonte controlado da obra como único caminho para garantir o bem-estar das comunidades: “a única forma de diminuir a pressão que a água represada faz sobre as montanhas, a casa de máquinas, os túneis e o próprio muro, é esvaziar a barragem”. 

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