Em Rondônia, negociação entre MAB e Santo Antônio Energia segue sem avanços

Na tarde de ontem (03), integrantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) tiveram uma reunião com o consórcio Santo Antônio Energia, na qual apresentaram uma pauta de reivindicações para […]

Na tarde de ontem (03), integrantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) tiveram uma reunião com o consórcio Santo Antônio Energia, na qual apresentaram uma pauta de reivindicações para melhoria das condições de vida dos atingidos pela barragem de Santo Antônio. Apesar dos esforços, o consórcio se esquivou da responsabilidade sobre os impactos da obra e não possibilitou avanços significativos na pauta.

A reunião, que aconteceu no Rio Shopping, em Porto Velho, foi agendada ainda em março, durante a Jornada Nacional de Lutas do MAB, quando aproximadamente 400 atingidos realizaram protestos na capital. Participaram da reunião, pela Santo Antônio Energia, Ricardo Márcio (Gerente de Sustentabilidade) e Ivan Siqueira (Coordenador Fundiário). A reunião também contou com presença de Nilton Tubino, da Secretaria Geral da Presidência da República, e representantes da EMATER.

O MAB apresentou uma pauta específica para a reunião, contemplando pontos relacionados à melhoria da qualidade de vida e geração de renda nos reassentamentos criados pelo consórcio. A pauta ainda incluía reivindicações referentes às áreas atingidas (envolvendo Baixo Madeira, P.A. Joana D’arc, Jaci Paraná e bairro Triângulo) e aos programas de ações à jusante e de apoio a atividade pesqueira.

Problemas e dificuldades

Durante a reunião, os atingidos expuseram os diversos problemas e dificuldades que estão vivenciando. Nos reassentamentos, em que as famílias dependem de um auxílio mensal para sobreviver, existem dificuldades com o abastecimento de água e saneamento e com a fertilidade da terra e falta de assistência técnica. O alto preço da tarifa de energia também foi alvo de reclamações, com contas superiores a R$200,00. Há, ainda, lotes atingidos pela formação do reservatório da usina.

No P.A. Joana D’arc, por exemplo, de onde a obra removeu famílias de 176 lotes, as aulas ainda não começaram. As estradas, impactadas pelos caminhões do consórcio que fazem a retirada de madeira da área, não permitem o transito do ônibus escolares. Mais de 240 crianças correm o risco de perder o ano letivo. Ademais, moradores das linhas 17 e 19 estão sofrendo com o alagamento de seus lotes, em que perderam completamente sua produção. O consórcio respondeu que a responsabilidade pela manutenção da estrada caberia à prefeitura do município e que está realizando o monitoramento da água do reservatório.

No bairro Triângulo, 115 casas foram interditadas devido aos riscos causados pelo desmoronamento do barranco. As famílias já estão vivendo em hotéis há quase de quatro meses. Segundo o relatório técnico apresentado pelo consórcio ao Ministério Público, em apenas 18 casos as famílias terão oportunidade de acesso a uma nova moradia ou indenização. As demais famílias das 97 casas deverão retornar ao bairro praticamente como se nenhum transtorno ou impacto tivesse ocorrido.

“O consórcio permanece com sua postura autoritária e insensível às demandas das famílias atingidas. Esquivam-se de suas responsabilidades sobre os impactos gerados, buscando delegar a terceiros os problemas que eles mesmos geraram”, afirmou Océlio Muniz, da Coordenação Estadual do MAB.

A denúncia do MAB conta com respaldo do Tribunal de Contas do Estado de Rondônia (TCE), que apresentou no último dia 26 um relatório, fruto de auditoria realizada durante 10 meses, em que aponta diversas irregularidades na construção da usina.  Segundo o próprio diagnóstico do relatório, “o empreendedor, com omissão do Poder Público, preocupou-se unicamente com o deslocamento dos moradores, sem, contudo, alertar para o monitoramento da reinserção social e a qualidade de vida das comunidades atingidas”. O relatório do TCE apresentou 40 medidas corretivas que devem ser executadas em 120 dias para amenizar os problemas, mas o consórcio foge da responsabilidade.

“As águas do Madeira já proporcionam a geração dos lucros que as empresas terão nos próximos 30 anos e, por outro lado, Porto Velho, as comunidade e famílias atingidas, sofrem com as consequências da construção das usinas”, diz Walisson Rodrigues, militante do MAB.

Governo Federal visita reassentamento

Ao final da tarde, por convite do MAB, o representante da Secretaria Geral da Presidência, Nilton Tubino, participou de uma reunião com as famílias atingidas do reassentamento Nova Vila de Teotônio.

A constatação na piora da qualidade de vida foi recorrente e marcante em cada relato das famílias. “Tínhamos o rio, os peixes, nossa casa e terra e todos viviam muito bem… lá ninguém passava dificuldades para comer e ganhar dinheiro, seja na pesca ou turismo. Hoje estamos jogados aqui, sem nada. O consórcio nos iludiu dizendo que nossa vida seria melhor, e nos enganou”, conta Pedro, reassentado.

A falta de peixes foi motivo de revolta. “Em anos subindo e descendo pelo rio Madeira, nunca imaginei que ficaria sem peixe para comer”, disse Sabá, outro morador.

O consórcio buscou montar uma estrutura para o turismo na região, com uma pequena praia artificial e a construção de um píer, divulgando como oportunidade de trabalho para as famílias. “O turismo nós tínhamos lá na cachoeira, quando tinha rio e peixe. O povo vinha passear com a família toda, pescava, nadava. Agora ninguém chega perto d’água… eles botaram esta praia aí e até o corpo de bombeiros interditou”, diz dona Ivanete.

O MAB cobrou da Secretaria a necessidade de se avançar na consolidação da política nacional de direitos das famílias atingidas, bem como na regulamentação do Decreto 7.342, sobre o cadastro socioeconômico da população atingida. O decreto seria um importante instrumento para evitar situações como, por exemplo, a dos pescadores da região, que até fevereiro não estavam listados pelo consórcio Santo Antônio Energia.

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