Segundo dia de Jornada de Lutas teve atos em diferentes capitais do país e repressão policial violenta no Piauí
Programação da Jornada de Lutas incluiu reunião no CNJ em Brasília, audiência com membros do governo em Fortaleza (CE) e marcha em Teresina que terminou com violência policial
Publicado 16/03/2022 - Atualizado 16/03/2022
Dando sequência à Jornada de Lutas de Março, militantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) participaram, ontem, 15, de diferentes atividades de protesto e debate sobre os direitos dos atingidos e o modelo energético do Brasil. As ações fazem referência ao Dia Internacional de Luta contra as Barragens, em Defesa dos Rios, das Águas e da Vida, que é celebrado oficialmente no dia 14 de março em todo do mundo.
Em Brasília, representantes do MAB e outros movimentos sociais fizeram uma reunião no Conselho Nacional de Justiça para discutir o acordo de repactuação do Rio Doce, que está sendo debatido entre órgãos de justiça, governos estaduais e mineradoras responsáveis pelo crime de Mariana. No encontro, integrantes do Movimento apresentaram as principais reivindicações dos atingidos e exigiram a participação destes nos debates sobre a reparação dos seus direitos. Na ocasião, o conselheiro Luiz Fernando Bandeira se comprometeu a visitar as comunidades atingidas de Minas Gerais e Espírito Santo para ouvir suas pautas.
No Ceará, MAB promove conquistas para atingidos
No Ceará, membros do MAB foram recebidos no Palácio do Governo pelo secretário Nelson Martins, representando o governador Camilo Santana, e outros secretários para discutir as reivindicações dos atingidos no estado, como o apoio para capacitação e assistência técnica, além de compras de áreas de reassentamento para famílias atingidas, entre outras demandas que foram aprovadas pelo executivo.
Ainda na capital cearense, como resultado de um protesto em frente à Enel, distribuidora de energia no estado, representantes da empresa receberam uma comissão de representantes do MAB, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) para dialogar sobre a pauta dos movimentos. Durante o encontro, foram discutidas demandas como a inserção das famílias de baixa renda no programa da Tarifa Social de Energia, a aplicação de tarifas mais justas para a população, o fim das cobranças duplicadas e a melhoria da qualidade na prestação de serviços. Durante o encontro, foi agendada uma nova reunião com a direção da empresa entre os dias 28 e 30 de abril.
Na capital paraense, militantes organizados em ato em frente à Assembleia Legislativa do estado reivindicavam a defesa dos direitos das famílias atingidas pelas enchentes e alagamentos e protestavam contra o projeto da hidrovia Araguaia-Tocantins, que pode causar prejuízos socioambientais irreversíveis ao modo de vida das cidades e comunidades locais no entorno dos rios.
No Maranhão, a coordenação do MAB realizou uma audiência pública na Assembleia Legislativa do estado para discutir a segurança das barragens no território com parlamentares e órgãos ligados à defesa dos direitos humanos e a defensoria pública do estado. No encontro, foi definida a formação de uma comissão de parlamentares que vai visitar a comunidade de Aurizona pra conhecer a realidade enfrentada no distrito um ano após o rompimento da barragem Pirocaua da mineradora Equinox Gold, que deixou a população sem acesso à água potável.
Também foram solicitados relatórios da defesa civil e de órgãos competentes sobre a situação do acesso à água no distrito para que se possa promover a reparação de direitos dos atingidos. Foi apresentada ainda uma minuta do projeto da Política Estadual de Direitos das Populações Atingidas por Barragens que vai ser colocada em tramitação urgente pelo deputado José Inácio (PT).
Ato em Teresina termina com truculência policial
Em Teresina, um grupo de cerca de 200 atingidos da capital e dos municípios de Amarantes e Palmeirais fizeram uma ação em frente a à distribuidora de energia Equatorial para denunciar os altos preços da conta de energia e seguiram em marcha para a prefeitura da cidade, onde uma comissão tentou negociar uma conversa com o prefeito, Dr Pessoal Leal, para discutir as reivindicações do movimento.
Lá, o prefeito se recusou a receber o grupo, que foi dispersado por uma tropa de choque que usou gás lacrimogêneo e balas de borracha contra os militantes do MAB e professores da rede pública que estão em greve e também protestavam no local. No total, cerca de 500 pessoas estavam mobilizadas na Prefeitura.
O coordenador do MAB que participava da mobilização, Charles Freitas, conta que a ação da polícia foi totalmente inesperada e truculenta.
“A nossa luta sempre foi pacífica. Acontece que, quando a comissão que tentava dialogar com o prefeito saiu de dentro da sede, a polícia já começou a dispersar o povo, empurrando os militantes que estavam lá com suas faixas e seus cartazes. E dentro da prefeitura tinha uma tropa de choque com bomba e gás de efeito moral, que até agora eu estou com minha garganta aqui pegando fogo e os olhos ardendo. E sendo que tinha muita criança, mulheres grávidas e idosos. Foi aquela situação de gente correndo pra todo lado. E a nossa preocupação era juntar o povo do MAB, porque tinham inclusive muitas crianças que vieram das comunidades e a teve que sair procurando porque teve adolescente que saiu correndo desesperado pra longe”, conta o militante.
A maior parte das famílias que participavam do ato são vítimas das enchentes que atingiram o estado recentemente e também lutavam pelo direito à moradia digna, pois receberam ordem de despejo nas ocupações onde vivem. De acordo com o MAB, a ordem fere os direitos básicos desses cidadãos, tendo em vista o decreto nacional que impede o despejo de comunidades durante a pandemia. O MAB denunciava ainda o aumento abusivo nas tarifas de água e energia no estado.
Charles afirma que a repressão não desencoraja o Movimento. “Os policiais estavam chamando todo mundo de vagabundo. Quem estava ali eram trabalhadores, mães e jovens que sonham em ter uma moradia digna. A gente estava ali porque a gente sonha em ter um mundo mais justo e uma sociedade igualitária, mas quem deveria dar uma perspectiva pra essa população que vive uma situação de tanta vulnerabilidade faz o contrário: reprime, bate e violenta mais. Mas a luta vai continuar. Não vai ser uma bomba de gás ou um governo fascista que vai nos deter, porque a gente sabe se organizar”, desabafou Charles.