Mulheres bordam resistências e debatem justiça climática nas periferias do Distrito Federal

Oficinas de arpilleras unem arte, memória e denúncia nas regiões administrativas de Ceilândia e Sol Nascente

Oficina de arpilleras realizada no Distrito Federal. Foto: Ágatha Barbosa

Desde o ano passado, linhas, agulhas e memórias vêm costurando histórias de resistência em dois dos territórios mais potentes do Distrito Federal: Ceilândia e Sol Nascente. O projeto “Vidas trans(bordadas): conectando mulheres, arte e resistências através do bordado em Arpilleras como linguagem artística e política na identificação e enfrentamento às mudanças climáticas e na defesa de uma transição energética justa”, tem criado um espaço coletivo onde o bordado é ferramenta de denúncia, de cura e de luta.

Inspiradas na tradição latino-americana das arpilleras chilenas – criadas como forma de resistência à ditadura de Pinochet -, as mulheres utilizam pedaços de tecido, costuras e colagens para narrar as suas lutas e sonhos, as violações de direitos das mulheres, a realidade da periferia, suas dores e os impactos sentidos em seus territórios por conta da desigualdade socioambiental, injustiça climática e da precariedade e falta dos serviços públicos. O projeto é realizado pela Associação de Proteção ao Meio Ambiente (Apema) em parceria com a Secretaria de Formação, Livro e Leitura, do Ministério da Cultura.

“Aqui a gente sente na pele o que é a injustiça ambiental. Quando a seca é grande no DF, e precisa racionar, é aqui que falta água. Quando a energia sobe, quando alaga… é sempre a gente que sofre primeiro”, relata Ivanete Silva dos Santos, moradora do local e integrante da Casa da Natureza, um dos lugares que recebeu as oficinas.

Mulheres atingidas bordam peças com diversos temas, entre eles racismo ambiental e direito à moradia. Foto: Comunicação MAB DF

As oficinas de arpilleras são ferramentas de organização da luta das mulheres do Movimento dos Atingidos por Barragens em todo o país. Brasília já recebeu exposições na Universidade de Brasília, no Congresso Nacional, de peças de arpilleras feitas em todo o Brasil pelas mulheres do MAB. Agora o movimento vem também bordando a resistência e luta das mulheres da periferia da capital do país.

Nas peças de arpilleras já feitas, os temas centrais foram o racismo ambiental na periferia do DF, as queimadas – que foram recorde no ano de 2024 -, direito à moradia e à cidade (retratando a forte especulação imobiliária e grilagem no DF, que dificultam a moradia popular e ameaçam a natureza), a poluição do Rio Melchior (um dos mais poluídos do DF, localizado em Ceilândia), além de sonhos de como a cidade poderia ser se fosse feita para o povo.

Diante da ameaça da Usina Termelétrica (UTE) de Brasília, as oficinas com as mulheres também passaram a retratar os riscos de implantação do projeto, que está planejado para ser construída em Samambaia e Recanto das Emas, regiões vizinhas a Ceilândia e Sol Nascente.

“Mais do que uma atividade artística, as oficinas se firmam como espaços de formação política, escuta ativa, organização das mulheres e construção de estratégias coletivas para enfrentar essa conjuntura tão violenta e desigual”, afirma Sara Oliveira, da coordenação do MAB no Distrito Federal.


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