NOTA | MAB repudia decisão judicial sobre anexo 1.1 do acordo de reparação de Brumadinho que prejudica atingidos

Movimento alerta que deliberação de instituições de justiça interfere na autonomia das pessoas atingidas e exige transparência no uso dos recursos da reparação

Foto: Joka Madruga / MAB

Nota do MAB sobre a Deliberação das Instituições de Justiça em relação ao Anexo 1.1

O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) manifesta surpresa e indignação diante da deliberação das Instituições de Justiça (IJs) sobre o Anexo 1.1 do acordo de reparação do crime de Brumadinho, protocolada no processo judicial em 25 de abril de 2025.

O Anexo 1.1 prevê a execução de projetos de demandas das comunidades atingidas, com a participação destas e das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) na definição, monitoramento e fiscalização das iniciativas. O início das ações previstas no anexo é urgente, e medidas que desrespeitam o direito das pessoas atingidas de decidir sobre o uso dos recursos agravam esse processo.

De acordo com o documento, o contrato entre a Entidade Gestora e as Instituições de Justiça para o início das atividades está sendo construído há seis meses. No entanto, foi apresentada uma manifestação formal das IJs impondo o início das ações, com diversas condições que ferem o direito à participação e à Assessoria Técnica Independente (ATI).

A indignação concentra-se em três pontos principais:

  1. O uso de recursos do Anexo 1.1 – e não da cláusula dos R$ 700 milhões – para o pagamento das ATIs durante os dois anos da Entidade Gestora;
  2. O estabelecimento de um valor máximo para o trabalho das três ATIs no período, limitado a aproximadamente R$ 62 milhões;
  3. A possibilidade da Entidade Gestora assumir as atividades das ATIs, caso as atuais ou outra entidade escolhida pelas pessoas atingidas não aceitem esse valor em 30 dias.

Essas decisões não podem ser tomadas unilateralmente pelas Instituições de Justiça. O uso de recursos do Anexo 1.1 para as ATIs desrespeita o Acordo Judicial, que destinou um fundo de R$ 700 milhões especificamente para “Estruturas de Apoio”, como as ATIs. Além disso, o próprio acordo prevê que, caso sobre algum valor desse fundo, a decisão caberá aos compromitentes — e não às pessoas atingidas.

Exigimos a prestação de contas dos R$ 700 milhões, e que as Instituições de Justiça expliquem quais gastos consideram mais prioritários que a garantia de ATIs. Esse pedido já foi feito diversas vezes pelo MAB, inclusive durante a mobilização de 14 de março de 2025, sem qualquer resposta até o momento. Antes de se decidir usar recursos do Anexo 1.1 para esse fim, é preciso esclarecer como o fundo das Estruturas de Apoio vem sendo gasto.

As ATIs devem ser prioridade no uso do fundo dos R$ 700 milhões, pois é um direito assegurado pelas Políticas Estadual e Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PEAB e PNAB). Elas atuam diretamente em benefício das pessoas atingidas, assessorando sua participação no processo de reparação. Qual apoio pode ser mais essencial ao Acordo Judicial do que a própria participação de quem foi atingido?

O Anexo 1.1 é a única parte do acordo que prevê aplicação direta nas comunidades atingidas, com decisões tomadas por elas mesmas. Esses recursos não chegam a 10% do valor total do acordo — o restante tem sido decidido por governos, Instituições de Justiça, prefeituras ou pela própria Vale. Não há nenhuma regra no Acordo Judicial que autorize o uso dos recursos do Anexo 1.1 para pagamento das ATIs, enquanto houver recursos disponíveis no fundo de R$ 700 milhões.

Além disso, enquanto as IJs tentam decidir no lugar das pessoas atingidas sobre o uso do dinheiro do Anexo 1.1, se recusam a deliberar sobre pontos sensíveis, como a divisão dos recursos entre as regiões, repassando essa responsabilidade à Entidade Gestora, com base em decisão das comunidades. O teto de recursos para a reparação foi definido pelas próprias Instituições de Justiça ao firmar o acordo. Agora, com o teto estabelecido, a divisão deve seguir critérios técnicos e transparentes.

Sobre o orçamento das ATIs, é essencial garantir as condições necessárias para a participação informada das pessoas atingidas — e cabe a elas decidirem se essa assessoria será necessária em todo o acordo ou apenas no Anexo 1.1. Negar esse direito significa ignorar um processo histórico de luta e conquista.

Outro ponto problemático é o depósito do valor dos projetos apenas com correção monetária, sem os rendimentos acumulados na conta judicial — que já são inferiores aos de mercado. Após quase dois anos da publicação do edital, as IJs decidem liberar os recursos sem considerar os rendimentos. Com a inflação acumulada desde 2023, os R$ 300 milhões previstos para os projetos já não têm o mesmo valor real.

Tentativas de mudar regras previamente estabelecidas (no Acordo Judicial e no edital da Entidade Gestora), ou de descumprir diretrizes da PEAB e PNAB, atrasam ainda mais o início do Anexo 1.1. Todo o tempo gasto na negociação do contrato poderia — e deveria — ter sido usado para consultar as pessoas atingidas.

Exigimos participação efetiva em todas as etapas desse processo. Não aceitaremos retrocessos em relação à conquista do Anexo 1.1, que finalmente reconhece o direito das pessoas atingidas de decidir sobre os recursos que lhes são destinados. Isso é o mínimo.

O MAB segue vigilante e em luta pela garantia do direito das pessoas atingidas de decidir sobre o uso do Anexo 1.1. Vamos seguir exigindo participação, transparência e agilidade para que a reparação avance. Já são mais de quatro anos de atraso.

É TEMPO DE AVANÇAR!

Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB

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