NOTA | Um ano do crime em Aracruz: por Memória, Justiça e Reparação

MAB faz lista de reivindicações relacionadas à reparação para as vítimas de atentado neonazista que matou quatro pessoas, incluindo uma militante do MAB

Escola Primo Bitti, em Aracruz, reformada após o ataque — Foto: Sedu/Divulgação

No dia 25 de novembro de 2022, aconteceu um dos mais graves crimes de ódio no estado do Espírito Santo, o atentado de caráter neonazista às escolas de Aracruz.

Portando duas armas, uma pertencente ao Estado e outra ao pai, o filho de um tenente da Policia Militar atingiu toda uma comunidade de professores, estudantes, servidores e, de maneira geral, todos os moradores do bairro de Coqueiral, de Aracruz, e seu entorno.

Esse crime nos tirou quatro vidas: Selene, Cibelle, Maria da Penha e Flávia Amboss (militante do Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB). Flávia, que tinha 38 anos, foi atingida antes pelo crime do rompimento da barragem do Fundão, cometido pelas mineradoras Samarco/Vale/BHP, em novembro de 2015, e vivia na vila de Regência, foz do rio Doce, em Linhares.

Flávia Amboss. Foto: Comunicação MAB

Nesses oito anos de luta por justiça na bacia do Rio Doce, foram muitos os casos de ameaças explícitas e tentativas de agressão física e verbal sofridas por nossos militantes, por parte de agentes do Estado ou diretamente das empresas criminosas, principalmente nessa região de Aracruz. Nenhum deles foi tão grave quanto o atentado neonazista.

Toda a comunidade de Coqueiral de Aracruz e as comunidades vizinhas, como Santa Cruz, aldeias Três Palmeiras e Boa Esperança, entre outras, eram atingidas pelo grave crime ambiental da bacia do Rio Doce, e agora, também são atingidas por esse ataque com intenções neonazistas e misóginas.

Nesses casos, temos a sobreposição de violações de direitos por parte do Estado. Violação no trato do Governo do Espírito Santo com as famílias e com toda a comunidade escolar, atingida pelo atentado neonazista e pelo crime do rompimento da barragem da Vale. Em ambos os casos, o Estado é omisso ou tendencia suas ações contra as vítimas. Há um cenário de apagamento do crime e falta de transparência junto aos familiares e atingidos por parte dos poderes em diversas instâncias.

Diante de tais fatos, da impunidade e da injustiça com as vítimas e demais atingidos por esse atentado no decorrer desse último ano, reivindicamos:

• Que o Governo Federal com suas áreas afeitas promova uma diligência com escuta qualificada da comunidade escolar e corpo docente das escolas atingidas em Aracruz – em especial as professoras e professores que estão afastados; além dos servidores terceirizados da escola;

• Que seja criado um Fundo e uma Política Nacional de Amparo às Vítimas de Crimes de Ódio, que abarque todos os que sofreram abalo psíquico com os crimes; 

• Que o Governo Federal continue a apoiar a investigação do crime até que haja responsabilização de todos os responsáveis;

• Que seja fornecido um relatório público semestral das medidas tomadas pelo governo federal em relação a esse caso e outros semelhantes, que seja entregue aos familiares das vítimas e à comunidade atingida;

• Que seja criada uma Política de Educação em Direitos Humanos que previna a disseminação de ideologias fascistas e nazistas, em especial voltado para crianças e adolescentes;

E que o Mistério dos Direitos Humanos endosse nossa cobrança junto ao Governador Renato Casagrande para que:

• O Estado do Espírito Santo peça de forma pública as desculpas oficiais a todas as famílias atingidas e vítimas diretas ou indiretas desse atentado neonazista;

• Que o Governo do Estado exonere imediatamente o Tenente da PM, pai do jovem e responsável pelas armas, por crime de apologia ao Nazismo em suas redes sociais;

• Que o Governo do Estado reconheça toda a comunidade das duas escolas atacadas como atingidas e passe a dar o tratamento digno que os profissionais, pais, mães e estudantes devem ter;

• Que a Escola Estadual Primo Bitti se torne um memorial das vítimas do atentado e demais crimes de ódio em nosso país, e que novas escolas construídas tenham os nomes das companheiras tombadas nesse atentado.

Por fim, reafirmamos que o nosso compromisso como organização popular seguirá sendo o de lutar pelo direito a Memória, Justiça e Reparação, e que manteremos vivos os legados de Flávia Amboss, em sua luta contra as mineradoras Samarco/Vale/BHP, contra os demais crimes ambientais que assolam as comunidades de nosso país, na luta pelo feminismo, pelos direitos humanos, pela democracia e contra o fascismo.

Com trajetória no movimento estudantil, refundando o Centro Acadêmico de Ciências Sociais da UFES durante a graduação, Flávia se tornou professora de sociologia após o rompimento e teve sua tese de Doutorado na UFMG sobre essa temática aprovada em abril de 2022, com o título “Imprensados no tempo da crise – A gestão das afetações no desastre da Samarco (Vale e BHP Billiton) e a crise como contexto no território tradicionalmente ocupado na foz sul do rio Doce”.

O exemplo de Flávia nesses oito anos de luta nos mantém vivos e fortes para seguir lutando pelo justo. Eles tentaram nos enterrar, mas não sabiam que éramos sementes.

Por memória, verdade, Justiça e reparação!
Flávia Amboss, Presente!
Conteúdos relacionados
| Publicado 21/12/2023 por Coletivo de Comunicação MAB PI

Desenvolvimento para quem? Piauí, um território atingido pela ganância do capital

Coletivo de comunicação Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) no Piauí, assina artigo sobre a implementação de grandes empreendimentos que visam somente o lucro no território nordestino brasileiro

| Publicado 23/11/2023 por Coletivo de Comunicação do MAB ES

Defensora Pública do Espírito Santo ajuíza ação contra governo no caso do atentado de Aracruz

Ação civil pública cobra reparação para vítimas do crime com base na pauta entregue pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)

| Publicado 16/05/2023 por Camila Fróis

6 meses sem Flávia Amboss: MAB cobra justiça, reparação e prevenção de novos atentados

Aos 36 anos, Flávia – que era professora e militante pelos direitos humanos dos atingidos por barragens do Rio Doce – foi assassinada em um atentado na escola em que trabalhava

| Publicado 08/06/2022 por Coletivo de Comunicação MAB ES

MAB participa de mobilização de pescadores atingidos por barragem da Suzano em Aracruz (ES)

Movimento organizouDurante assembleia foi discutida com Defensoria Pública do estado a situação de assoreamento do Rio Riacho provocado por barragem da Aracruz, que está impedindo acesso dos pescadores ao mar