Ação judicial cobra descomissionamento de barragens à montante em MG

Prazo para descomissionamento (desativação) de barragens, que terminou em 2022, não foi atendido por mineradoras como a Vale

Depois que tragédia em Brumadinho custou a vida de 270 pessoas e causou devastação ambiental na bacia do Rio Paraoapeba em janeiro de 2019, o descomissionamento de barragens que utilizam o método de alteamento a montante se tornou obrigatório no país. Foto: Agência Brasil

No último dia 10, foi realizada audiência de instrução de julgamento da Ação Civil Pública que questiona os Termos de Compromisso celebrados pelo Ministério Público de Minas Gerais e pelo Estado de Minas Gerais prorrogando os prazos para acabar com as barragens de rejeitos à montante no estado.

Após o rompimento da barragem de Fundão, de propriedade das mineradoras Samarco/Vale/BHP Billiton, em 2015, passou a tramitar na Assembleia Legislativa de Minas Gerais um projeto de Lei, de iniciativa popular, chamado “Mar de Lama Nunca Mais” para proibir a existência de barragens do mesmo tipo no estado. Infelizmente, o projeto foi aprovado somente após o rompimento da barragem da Vale S.A em Brumadinho, em 2019. 

A Lei Estadual nº 23.291/2019, previa que, em até três anos contados da publicação da lei, ou seja, até o ano de 2022, as barragens alteadas pelo método à montante (mesma tecnologia utilizada nas barragens de Brumadinho e Mariana) deveriam ser descaracterizadas. Isto é, deveriam ser esvaziadas e perder a função de armazenar rejeitos, sendo descaracterizadas e reintegradas ao meio ambiente. 

Audiência sobre Ação Civil Pública que questiona extensão de prazo para descomissionamento de barragens.

Em 2022, porém, o Ministério Público Estadual e o governo de Minas Gerais elaboraram os Termos de Compromisso prorrogando os prazos para descomissionamento das barragens, sem consultar as populações atingidas do entorno das barragens e sem divulgar os acordos firmados, conseguindo inclusive que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais homologasse os acordo.

A ação judicial

Em 14 de março de 2022, no Dia Internacional de Luta dos Atingidos por Barragens, foi proposta uma Ação Civil Pública questionando a flexibilização dos prazos. A ação foi proposta pela Associação Nacional de Atingidos por Barragens (ANAB), a Associação Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular e a Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos da Tragédia do Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão Brumadinho (AVABRUM), tendo como interessados o Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o Fórum dos Atingidos e das Atingidas pelo crime da Vale em Brumadinho e o Projeto Manuelzão.

Em síntese, a ação e pede que a Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD) – rés na ação civil pública – suspendam licenças ambientais das empresas que não cumpriram a obrigação de descomissionar as barragens à montante, conforme previsão da lei.

Além disso, a ação afirma que os Termos de Compromisso (TCs) violaram os prazos da lei “Mar de Lama Nunca Mais” e que, por isso, devem ser declarados nulos pela falta de participação popular. As entidades destacam, na petição inicial, que os Termos de Compromisso se figuram como um ataque à Lei nº 23.291, de 25 de fevereiro de 2019, construída a partir do clamor da sociedade.

Após curso normal do processo, em audiência de instrução e julgamento ocorrida na última terça, dia 10, as atingidas destacaram suas preocupações em relação às barragens ainda existentes. Algumas delas ainda vivem na zona de auto-salvamento, outras perderam familiares no rompimento em Brumadinho e se dispuseram a contribuir com a justiça para que eventos como este nunca mais ocorram.

Barragens em risco e comunidades sob o medo constante

Atualmente, no Estado de Minas Gerais existem cerca de 30  barragens em situação de emergência. Diversas comunidades também se encontram à jusante de barragens com método de alteamento à montante – que ressalte-se, nem deveria mais existir.

O Estado de Minas Gerais e o Poder Judiciário mineiro seguem sendo cúmplices das mineradoras, pois, além da manobra para flexibilizar prazos previstos no art. 13 da lei, seguem descumprindo a Lei Estadual também no art. 12, à medida em que seguem concedendo licenças para empresas, mesmo ante a existência de comunidades nas zonas de auto salvamento.

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