MAB debate Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens em audiência no Senado
Senadores prestaram homenagem aos 31 anos do Movimento dos Atingidos por Barragens e anunciaram que a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens pode ser votada nas próximas semanas
Publicado 17/03/2022 - Atualizado 17/03/2022
Representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) participaram hoje, 16, de uma audiência pública no Senado Federal promovida pela Comissão de Meio Ambiente (CMA). A sessão tratou do Projeto de Lei 2.788/2019 , que cria um marco legal para estabelecer os direitos das populações atingidas por barragens, que é uma reivindicação histórica do MAB. A chamada Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) inclui uma definição mais abrangente do conceito de atingidos e lista as atribuições e responsabilidades dos empreendedores nos territórios impactados por barragens.
O PL, já aprovado pela Câmara dos Deputados em 2019, define também responsabilidades dos governos e os direitos dos atingidos e estabelece mecanismos de reparação de danos causados pelas obras. Também define medidas para reduzir os riscos oferecidos pelas barragens e para evitar novos crimes socioambientais envolvendo os empreendimentos de mineradoras e usinas hidrelétricas.
Durante a sessão, que integrou a programação de celebração do “Dia Internacional de Luta contra as Barragens, em Defesa dos Rios e da Vida”, comemorado em 14 de março, Iury Paulino, coordenador do MAB, reforçou que o projeto que institui a PNAB foi construído a muitas mãos.
“São 31 anos de lutas em defesa da população atingida, mas, sobretudo, construindo um modelo energético e uma proposta de desenvolvimento mais justa e mais igualitária para que vislumbremos a possibilidade de que bens tão essenciais ao povo brasileiro, como a energia elétrica, possam ser produzidos sem gerar grandes prejuízos e sem que a população tenha que pagar a conta desse processo. E que a gente possa também receber benefícios desse desenvolvimento que se produz, que se gera com a produção de energia, com a mineração, com essas atividades que demandam a construção de barragens e causam impacto à população”, afirmou Iury.
De acordo com o senador Jaques Wagner (PT-BA), presidente do colegiado, o projeto pode entrar em votação nos próximos dias. “Estamos em negociação. Se for conquistado o acordo que queremos, podemos trazer na semana que vem o PL para votação, para que o projeto possa ser um brinde ao MAB”, disse o senador, fazendo referência ao aniversário de 31 anos. “Eu tenho muito carinho pelo Movimento”, reforçou.
O senador Confúcio Moura (MDB-RO), que presidiu a reunião, considerou legítimas as demandas do MAB e também elogiou o Movimento. “É um Movimento de cidadãos que moram nas margens dos rios e que manifesta aqui o seu desejo de simplesmente ser ouvido, debater anteriormente à construção desses empreendimentos, em que possam ser acordados direitos que assegurem a vida, os benefícios, as indenizações, a garantia de sustento e de criação dos seus filhos adequadamente”, ressaltou Confúcio.
Já o representante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), o professor Carlos Vainer, em sua fala destacou que responsáveis pelos crimes de Mariana e de Brumadinho (ambas em Minas Gerais) seguem impunes, e as vítimas continuam sem reparação.
“A cada dia em que se posterga sua aprovação (da PNAB), se prolonga a agonia dos que foram vitimados e não foram reparados, e dos que estão ameaçados de serem as próximas vítimas. São medidas relativamente simples: medidas para prevenir e evitar novas tragédias e novas violações de direitos humanos, e medidas eficazes para reparar material e moralmente os indivíduos, famílias, comunidades e coletividades que foram vitimadas” afirmou o professor.
Iury Paulino também destacou a insegurança jurídica vivida pelos atingidos que são vítimas dos crimes cometidos pelas empresas detentoras de barregens. “Há uma questão muito grave na situação dos atingidos: com a ausência do marco regulatório, com a ausência de leis, não há referência. Então, nós somos vítimas da interpretação que os empreendedores fazem sobre os impactos dos seus empreendimentos. Por isso, estabelecer uma política nacional que deixe às claras os direitos das populações atingidas é extremamente importante.
Em sua fala, Cleidiane Barreto, coordenadora do MAB na Bahia, relatou a situação dos atingidos pelas inundações no estado, que foram potencializadas pela abertura das comportas de barragens da CHESF. “Os atingidos da Bahia não conseguiram comemorar o Natal e nem o Ano Novo com suas famílias por causa das chuvas extremas. Muitas famílias tiveram que fugir de suas casas na ceia de Natal. E nós não podemos naturalizar isso e atribuir a culpa a questões divinas ou à natureza, porque o que provoca tudo isso são as ações desenvolvidas em nome do capital. E a chuva ela não chega a todos de forma igual, porque os principais atingidos são a população pobre, que se encontra em vulnerabilidade social e sofre com a ausência de um plano de urbanização que atenda os trabalhadores e trabalhadoras. Por isso são obrigados a construir suas casas em áreas de risco e acabam perdendo tudo que conseguiram conquistar em uma vida inteira”.
Em sua fala, Roberto de Oliveira, que também integra a coordenação nacional do MAB, reforçou as violações sofridas pelos atingidos. “Nós somos vítimas constantes de uma política de construção de barragens e uma política de um estado que nega os direitos, que promove a destruição dos nossos rios, das florestas e das comunidades. Então, nesses 31 anos do Movimento, essa luta que tem muitos rostos e muitos sujeitos, que tem muitos sotaques, tem mostrado que só a união dos povos atingidos pode garantir direitos. E é por isso que viemos aqui cobrar a aprovação da PNAB, porque ela é um marco importante para as famílias que sofrem dia a dia com a ação das grandes empresas em seus territórios”, declarou.
Para Leandro Scalabrin, advogado do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a audiência foi muito importante, porque ela prestou uma homenagem aos 31 anos de história do Movimento.
“A data foi celebrada no Senado Federal, uma das casas da democracia no Brasil. E também celebrou o dia de Luta contra as barragens e em defesa dos rios e da vida. Essa audiência foi muito importante para visibilizar a violação do direito dos atingidos”, afirmou.
“A aprovação de uma lei que regulamente os direitos dos atingidos, que é fruto de conquistas de lutas através de acordos dos movimentos com as empresas, através de condicionantes, através de discussões com instituições de justiça vai ser um passo histórico. A aprovação dessa Política vai ser um marco histórico e uma contribuição também pro sistema internacional de direitos humanos porque seremos o primeiro país a criar uma regulamentação de conceito de atingido e de direito dos atingidos”, finalizou o advogado.