NOTA | Novo acordo no Rio Doce e seus reflexos no Espírito Santo – justiça e participação
MAB participa de audiência na Assembleia Legislativa do ES para discutir repactuação do Rio Doce e Política de Atingidos por Barragens
Publicado 21/08/2021 - Atualizado 21/08/2021
Nesta terça feira, dia 24 de agosto, a Assembleia Legislativa abre as suas portas às 10 horas da manhã que os atingidos e as atingidas capixabas possam discutir os impactos do crime da Samarco, Vale e BHP Billiton na Bacia do Rio Doce. A Audiência Pública é organizada pela Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, a partir da articulação dos deputados estaduais Iriny Lopes e Hudson Leal, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e do Sindicato dos Pescadores do Espírito Santo (SINDIPESMES).
Apesar de passados seis anos, o crime da Vale, Samarco e BHP na Bacia do Rio Doce segue causando danos aos indivíduos, famílias e comunidades atingidas em Minas Gerais e no Espírito Santo. Com o intuito de dar agilidade e eficiência à reparação, foi criada uma fundação que, na prática, representou os interesses das suas mantenedoras, as empresas rés Samarco, Vale e BHP Bilinton durante todo o seu período de existência. Hoje, o que todos envolvidos na reparação constatam – poder público, instituições de justiça e atingidos – é que a Fundação Renova não cumpriu praticamente nenhum dos objetivos para o qual foi criada.
Um exemplo é que o programa “Retomada Produtiva da Pesca” não executou sequer 10% do orçamento previsto no primeiro Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) sobre o crime. Mesmo sem ter propiciado as condições acordadas para a retomada deste setor produtivo – que indiscutivelmente é um dos mais atingidos – atualmente a Renova vem cortando subsídios financeiros que sustentam pescadores, como o Auxílio Financeiro e Emergencial (AFE) que compensaria o lucro cessante dos trabalhadores.
De acordo com o MAB, a situação calamitosa das comunidades que viviam em interdependência com o Rio Doce se agrava com a atual crise econômica e sanitária do país. A falta de celeridade da Fundação Renova torna crescente a pauperização dos atingidos.
Entendemos que o aprendizado com os erros cometidos nos acordos anteriores – constantemente descumpridos pela Fundação Renova – deve ser o norte para qualquer discussão de novo acordo. A centralidade do sofrimento da vítima, o protagonismo das comunidades atingidas e a participação livre e informada são princípios norteadores de todos os acordos que, infelizmente, nunca foram postos em prática nesta situação.
O MAB acha procedente a retomada do papel do Estado através dos entes federativos na discussão de um novo acordo. Em última instância, os órgãos públicos terão a responsabilidade de cumprir metas dos acordos não cumpridos: garantir a restauração do Rio Doce, reconstruir a estrutura das comunidades e proporcionar a segurança sobre o seu futuro.
Esperamos que os governadores, prefeitos, deputados e vereadores foquem no legado que pretendem deixar para os territórios – estes que continuarão existindo e resistindo, passados mandatos e vencidas procurações. Eles serão testemunhos do que o Brasil foi capaz de oferecer em reparação às vítimas do maior crime ambiental da sua história.
O acordo de Brumadinho não foi só um acordo com valores, desenhos e responsabilidades, ele despertou na sociedade mineira uma vontade de aperfeiçoar os instrumentos legais que possam evitar injustiças como as praticadas no contexto da mineração no estado. Infelizmente, este é um aprendizado que veio com o processo falho de reparação do Rio Doce. Hoje, em Minas Gerais, já vigora uma Política Estadual de Atingidos por Barragens (PEAB), que prevê os direitos das vítimas e as responsabilidades dos criminosos de forma muito bem desenhada.
O Espírito Santo tem condições de seguir o mesmo exemplo – apesar de não sofrer com a reincidência da Vale – e assumir o compromisso com o futuro dos seus territórios atingidos e segurança de toda a sociedade.
A discussão de uma PEAB – ES é direito de toda a sociedade e uma responsabilidade republicana de todos homens e mulheres públicas do estado do Espírito Santo. A lei deve resguardar direitos dos atingidos e atribuir responsabilidades pelo crime para que o futuro de territórios inteiros não fiquem à mercê de acordos obscuros, processos pouco transparentes e impermeáveis à vontade popular, que foi escanteada desde o primeiro acordo a vigorar sobre a reparação no Rio Doce.