“Ninguém vai para casa até conseguirmos mudanças”, afirma militante negro estadunidense

Robert Robinson, integrante do movimento Take Back the Land comenta os protestos recentes, as demandas do povo negro estadunidense e os desafios frente a situação de pandemia do novo coronavírus e as eleições presidenciais nos EUA, marcadas para novembro desse ano

Por Coletivo de Comunicação do MAB

O assassinato brutal de George Floyd por um policial branco nos Estados Unidos no dia 25 de maio provocou uma onda de protestos dentro e fora do país contra o racismo e a violência policial. Um tema bastante bem conhecido pela população das periferias do Brasil e de todo o mundo.

A revolta da população negra terminou virando notícia em todo o mundo, fazendo lembrar as grandes marchas pela igualdade racial lideradas pelo movimento dos Panteras Negras que, naquele mesmo país, fez emergir a demanda pelo fim do racismo nos anos e deu visibilidade à causa racial.

Em entrevista ao site do MAB, Robert Robinson, membro do Comitê em Solidariedade ao MAB e MAR nos Estados Unidos, integrante do movimento Take Back the Land e voluntário da Iniciativa Nacional de Direitos Econômicos e Sociais (NESRI), comenta os protestos recentes, as demandas do povo negro estadunidense e os desafios frente a situação de pandemia do novo coronavírus e as eleições presidenciais nos EUA, marcadas para novembro desse ano.

Confira:

MAB: Como você avalia o crescimento dos protestos raciais nos EUA e no mundo nos últimos dias?

Robert Robinson: Minha avaliação é que o assassinato de George Floyd foi o ponto de ruptura para muitas pessoas de cor nos EUA. Vimos gente se levantar depois de Ferguson, mas as coisas se acalmaram depois de uma semana. Esse assassinato, em particular, de um afro-americano, ocorreu durante uma pandemia mundial que afetou desproporcionalmente as pessoas negras. A perda de empregos durante a pandemia, pessoas incapazes de pagar aluguel e negros e negras morrendo por falta de assistência médica.

Quais são as principais bandeiras deste movimento? Eles têm alguma relação com os movimentos históricos negros e afro-americanos nos Estados Unidos?

A principal bandeira deste movimento, sua base, é o Movimento Vidas Negras Importam, formado pela juventude. Há um entendimento do histórico Movimento dos Direitos Civis e dos ganhos obtidos no passado. Eu também acho que a retórica do atual presidente Donald Trump e sua constante crítica ao único presidente afro-americano, o Obama, alimentaram o fogo dentro das pessoas a ponto de dizerem “estamos cansados e não aguentamos mais”. Eu também acredito que, além das questões já mencionadas, acrescenta-se uma injustiça econômica que não só afetou os afro-americanos, como também jovens estudantes brancos, que se aliam as mobilizações.

Como o questionamento do sistema capitalista e as desigualdades derivadas desse modelo estão na agenda dessas manifestações?

Com a eleição de uma jovem latina, Alexandra Ocasio-Cortez, que se identifica como socialista democrática no Congresso dos EUA, a questão da injustiça econômica, o sistema capitalista que retém e impedem continuamente as pessoas negras e as usa apenas como mão de obra para produzir riqueza para os 1% faz parte do que está alimentando esse movimento.

Robert Robinson, membro do Comitê em Solidariedade ao MAB e MAR nos Estados Unidos, integrante do movimento Take Back the Land e voluntário da Iniciativa Nacional de Direitos Econômicos e Sociais (NESRI)

Sabemos que a pandemia do novo coronavírus revelou contradições em nossa sociedade desigual. Na sua opinião, existe uma relação entre esses protestos e a situação de pandemia que estamos enfrentando atualmente?

Na cidade de Nova Iorque, nossas autoridades eleitos foram forçadas a revelar publicamente em abril dados que mostravam que as pessoas mais afetadas pelo coronavírus eram provenientes de comunidades negras e de baixa renda. As mesmas comunidades que são afetadas por moradias precárias, aluguéis altos, falta de empregos sustentáveis e seguros, assistência médica insuficiente e quase qualquer outra injustiça social que se possa citar.

Como você avalia a tentativa do governo dos EUA e da mídia hegemônica mundial de criminalizar o movimento popular, rotulando-os de manifestantes violentos?

Ficou muito nítido desde o início que os manifestantes e saqueadores eram um pequeno grupo de pessoas que nada tinham a ver com os movimentos maiores organizados. A mídia local acabou sendo forçada a separar as questões e rotular os manifestantes e saqueadores como oportunistas. No entanto, se você oprimir continuamente as pessoas e mantê-las economicamente miseráveis, em algum momento há aquelas que se tornariam oportunistas. Um exemplo disso são os muitos supermercados que foram saqueados. Acredito que porque esse saqueador em particular ou sua família foram privados de comida. A pandemia deixou as pessoas neste país passando fome.

Como essas manifestações podem impactar as eleições nos EUA, agendadas para novembro deste ano?

Muitos dos pensadores críticos do movimento, e espero que seja correto dizer isso, sou um pensador crítico, estão começando a perguntar: Como seria um país pós-pandemia? Será que haverá perda de empregos, pessoas despedidas de seus empregos? Famílias e pessoas se afogando em dívidas? Muitos de nós acreditam que isso seja verdade. Precisamos votar em um novo líder. Vimos e experimentamos o governo Trump, seus caminhos fascistas. Precisamos sair e votar. Biden não é a melhor alternativa, mas é melhor que Trump. Nós precisamos registrar os membros da nossa comunidade para votar e garantir que eles cheguem às urnas em novembro.

Bônus

O assassinato de George Floyd foi um ponto de inflexão crucial nos Estados Unidos. O vídeo visto por pessoas de todo o mundo provocou indignação, especialmente entre os jovens. Tomamos as ruas no passado, mas os eventos que levaram a ações passadas (o assassinato policial de afro-americanos) e a filmagem pareciam ter caído em ouvidos surdos. A persistência dos protestos desta vez, a quantidade de cidades protestando e um presidente que acende as chamas da indiferença, promovendo a supremacia branca e alimentando sua base, levou a fortes e poderosas ações que estamos testemunhando hoje. Como homem afro-americano, sinto-me honrado pelas demonstrações de solidariedade de comunidades em todo o mundo e, particularmente, honrado por receber mensagens de solidariedade do MAB e MAR. Enquanto escrevo esta mensagem, há uma grande marcha em Washington DC, em frente à Casa Branca. Ninguém vai para casa até conseguirmos mudanças!

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