Famílias paulistanas enfrentam preços abusivos e dificuldade para comprar gás de cozinha

Moradoras relatam falta do produto, longas filas e valores que chegam até a R$ 150 por cada botijão   Projeto de lei pretende fornecer botijão gratuitamente para famílias de baixa […]

Moradoras relatam falta do produto, longas filas e valores que chegam até a R$ 150 por cada botijão

 


Projeto de lei pretende fornecer botijão gratuitamente para famílias de baixa renda durante pandemia (Foto: Eric Gonçalves/Sindipetro Unificado)

 

Por Guilherme Weimann

Há quase uma semana, Maria Jaqueline, de 32 anos, está sem gás na sua casa. A autônoma vive com seus três filhos na Favela da Caixa D’água, no bairro Cangaíba, na Zona Leste de São Paulo (SP). “Estou enfrentando dificuldade há seis dias para comprar o gás, as revendedoras dizem que as distribuidoras não estão mandando gás pra eles”, afirma.

Para manter a alimentação, Maria Jaqueline conta com a ajuda de vizinhos. “Moro em comunidade, graças à Deus. Daí uma cozinha o arroz, outra cozinha o feijão, a outra faz a mistura. Às vezes eu ganho marmita, outras vezes eu compro pão. Essa é a vida que a gente está levando sem gás”, explica.

Já as pessoas que encontram gás, como é o caso de Emília Aurichi, 38 anos, deparam-se com extensas filas e preços abusivos. A doceira e freelancer da área de pesquisa de mercado, e moradora bairro Engenheiro Goulart, na Zona Leste paulistana, afirma que chegou a encontrar o botijão de 13 quilos pelo valor de R$ 120 no aplicativo “Chama”.

 “Eu achei tão absurdo que tirei até esse print, que tem o meu endereço e o nome da revendedora que estava vendendo o botijão por R$ 120. Eu fiquei a semana inteira procurando e só encontrei na quinta-feira, por R$ 88”, recorda Emília.

A autônoma se indigna com o que ela descreve como “má fé” das revendedoras. “A situação econômica já não está boa, e as pessoas usarem de má fé para subirem os valores de produtos essenciais como o gás, feijão e arroz é um absurdo. Eles estão tentando enriquecer às custas de uma epidemia que está acontecendo. A gente tem que abrir mão de comprar algumas coisas para comprar o gás”, denuncia Emília.

Relato parecido é o da auxiliar de enfermagem Luciana Molina, moradora do bairro Ipiranga, da Zona Sul da capital. “Todos os lugares estavam fechados e os que eu ligava estavam cobrando um absurdo. Um lugar que eu liguei estava cobrando R$ 150. Depois de procurar muito, encontrei um por R$ 96, que acabou fazendo por R$ 90”, rememora.

Diante desse cenário, a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor de São Paulo (Procon-SP) determinou preço teto do botijão a R$ 70. Apesar disso, o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) está investigando práticas de sobrepreços nas revendedoras Laecio de Mello ME, Consigaz e Valgás Liquigás.

De acordo com dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP), o preço do gás de cozinha nas refinarias da Petrobrás já caiu 21% no acumulado do ano e está sendo comercializado por cerca de R$ 21. Entretanto, o preço para os consumidores subiu, até a semana passada, 0,5% no acumulado do ano, sendo comercializado entre R$ 50 e R$ 115.

Importação

Para a dirigente da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Cibele Viera, a Petrobrás vem diminuindo a produção de gás nas suas refinarias e priorizando a importação. “A gente nunca conseguiu dar conta da demanda interna de gás apenas com a produção da Petrobrás, sempre teve que importar. Mas, além dessa importação que sempre ocorreu por opção política da Petrobrás de não construir novas refinarias, ela está fazendo importação extra”, afirma.

De acordo com a sindicalista, a Petrobrás vem reduzindo sua carga de produção nas refinarias, para abrir espaço para importação de derivados no Brasil. “É uma opção o Brasil estar fazendo importação de derivados para complementar a demanda nacional. Como a produção de gás está associada à da gasolina e do diesel, e a demanda desses derivados está em baixa pelo coronavírus, o Sistema Petrobrás está sufocado como um todo”, explica Vieira.

A petroleira ainda denuncia que a atual situação sobrecarrega especialmente as mulheres, que ainda são as maiores responsáveis pelas tarefas domésticas e criação dos filhos. “Infelizmente, ainda é muito forte a responsabilidade do cuidado da casa, está tudo no ombro das mulheres. Deveria ser mais compartilhado, mas a gente sabe que a realidade ainda está longe de acontecer uma distribuição mais igualitária dos afazeres domésticos”, lamenta Vieira.

Como resultado dessa política de aumento dos preços do gás de cozinha nos últimos anos, o número de famílias brasileiras que utilizam lenha para cozinhar pulou de 11 milhões para 14 milhões, entre 2016 e 2018, um aumento de 27%. No Sudeste, o crescimento foi de 60%. No mesmo período, a taxa de desemprego no país passou de 11,5% para 12,3%, segundo IBGE.

Projeto de lei

Na última sexta-feira (3), o deputado federal Rogério Correia (PT-MG) apresentou o Projeto de Lei (PL) 1482/2020, o “PL do gás de cozinha”. A proposta visa garantir a oferta de um botijão de 13 quilos de gás liquefeito de petróleo (GLP) por mês para famílias beneficiárias do Bolsa Família e inscritas no Cadastro Único (CadÚnico), enquanto durar o período de calamidade pública decorrente da pandemia da covid-19.

Além disso, o PL pretende tabelar o preço do botijão a R$ 40 para famílias com renda mensal de até quatro salários. Este valor foi estabelecido a partir da campanha “Gás a preço justo”, organizada por sindicatos filiados à Federação Única dos Petroleiros (FUP).

A integrante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que contribuiu com a elaboração do projeto, Daiane Hohn, afirma que este valor foi estipulado a partir da média histórica dos preços do gás entre 2001 a 2015.

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| Publicado 21/12/2023 por Coletivo de Comunicação MAB PI

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