Manifesto de 4 anos de lama e luta no Espírito Santo
Foto: Thais Gobbo No dia em que se completam 4 anos do crime da Samarco no Rio Doce, cerca de 600 atingidos paralisaram a rodovia estadual ES-248 na altura […]
Publicado 06/11/2019
Foto: Thais Gobbo
No dia em que se completam 4 anos do crime da Samarco no Rio Doce, cerca de 600 atingidos paralisaram a rodovia estadual ES-248 na altura da barragem do rio Pequeno em Linhares, Espírito Santo.
Escolhemos este local para denunciar a injustiça e a ineficiência do processo de reparação que, passados 4 anos desde o crime, não resolveu sequer o problema que é o risco de contaminação da lagoa Juparanã, a segunda maior em volume de água do Brasil.
Pescadores organizados em Associações, Colônias, Comissão Pastoral da Pesca, SINDIPESMES, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, e Movimento dos Atingidos por Barragens-MAB, viemos denunciar que:
1 – A Fundação Renova não consegue explicar como não concluiu o programa de cadastro, o primeiro previsto no seu escopo de ações. Como consequência direta ainda existem pessoas lutando para terem seus direitos como atingidos reconhecido.
2 – Todas as câmaras técnicas da Fundação e mesmo o comitê interfederativo – as instâncias as quais os atingidos começaram a ter acesso somente esse ano – estão subordinadas ao conselho curador que é quem realmente manda em toda estrutura da Fundação Renova.
3 – Os atingidos mobilizados exigem portanto uma reunião no Espírito Santo com o conselho curador da Renova – formado por representantes das empresa Vale, BHP Billiton e Samarco, e que tem o real poder de voz na Fundação.
4 – A Fundação Renova foi criada como uma barreira entre os atingidos e as empresas responsáveis pelo crime, isolando a vontade das vítimas da responsabilidade dos criminosos. Não podemos aceitar que o governo do Estado siga o exemplo e vire as costas para os cidadãos atingidos, estes o elo frágil desta corrente de governança criada à sua revelia.
5 – Apesar de já ter se reunido diversas vezes com a Fundação, o governador ainda não teve um momento de escuta com os atingidos. Conhecendo a prática da Fundação Renova, nos preocupa o tipo de relatório apresentado que a julgar pelas peças publicitárias que ela divulga nos veículos de comunicação e redes sociais, tem pouco compromisso com a verdade.
6 – Entendendo portanto a sobrecarga que a Fundação Renova traz inclusive para o setor público do nosso Estado, reinvindicamos também uma reunião com o governador Renato Casagrande.
7 – As Assessorias Técnicas foram pensadas para equilibrar a balança entre atingidos e empresas criminosas – essas já assessoradas pela Fundação Renova e o aparato técnico que esta mobiliza – as AT´s deveriam capacitar e qualificar os atingidos para a participação nos programas e da governança da Fundação.
8 – Passado mais de um ano da escolha das AT´s na maioria dos territórios do Espírito Santo, a contratação ainda depende da negociação com as empresas que, quanto mais demoram em contratar as AT´s, mais liberdade têm para fazer o que querem na estrutura de governança que elas criaram.
9 – A demora na contratação das AT´s faz com que o poder público e os atingidos que participam das estruturas de governança em última instância trabalhem para a Fundação Renova – já que a mesma tem a liberdade de só executar o que o conselho consultivo delibera, e tem à sua disposição centenas de técnicos, empresas de consultoria terceirizadas e redes de pesquisadores contratadas com garantia de sigilo e confidencialidade, o que garante que as informações divulgadas sejam somente àquelas do seu interesse, comprometendo a tomada de decisão dos atingidos e do próprio Poder Público.
10 – Exigimos portanto a contratação imediata das assessorias técnicas, com sua presença o quanto antes nos territórios, para ajudar o povo a se esclarecer e sair do laço armado pelas empresas criminosas chamado Fundação Renova.
11 – A exemplo do que vem acontecendo na questão do derramamento de óleo no nordeste que se aproxima perigosamente do Espírito Santo, entendemos que só o povo esclarecido e organizado pode fazer frente à desastres deste tipo. A partir dessa compreensão, consideramos essencial a participação dos atingidos no processo de tomada de decisão, respeitando-se a centralidade do sofrimento da vítima em qualquer processo de reparação de danos decorrentes destes graves crimes ambientais.
Nem lama, nem óleo: Águas para a Vida!