Violação de direitos das atingidas por barragens é tema de Seminário das mulheres do MAB em Brasília

Falta de acesso aos serviços de saúde, exploração sexual, dificuldades no mundo do trabalho, problemas de reconhecimento por parte das emprensas no processo de reparação são algumas questões enfrentadas nas […]

Falta de acesso aos serviços de saúde, exploração sexual, dificuldades no mundo do trabalho, problemas de reconhecimento por parte das emprensas no processo de reparação são algumas questões enfrentadas nas regiões onde as barragens estão instaladas.




Compartilhando experiências, mais de 60 atingidas por barragens de 15 estados estiveram reunidas no Seminário “Em defesa da vida: mulheres atingidas na luta por direitos” que ocorreu na terça-feira (25) em Brasília. O evento, organizado pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), teve como objetivo trazer as particularidades das violações de direitos contra as mulheres – que são muitas, de diferentes formas, e se agravam à medida que as mulheres se tornam atingidas por barragens. 

No período de construção dos grandes empreendimentos, com a chegada de um número expressivo de trabalhadores homens nas regiões, as taxas de crescimento de exploração sexual e prostituição explodem. Foi assim, no contexto das barragens de Jirau e Santo Antônio, que registrou um aumento de 208% no número de estupros, com o início das obras no distrito de Jaci Paraná – Rondônia.

Outro forte desafio colocado para as atingidas está na esfera financeira. Com a desestruturação das comunidades e com o fim das atividades enconômicas locais em casos de rompimentos de barragens, as mulheres têm dificuldades de acessar auxílios emergenciais devido ao conceito que coloca os homens como “chefes de família”. Mesmo enquanto responsáveis pelo sustento da casa, elas não são reconhecidas como agentes sociais nas negociações com as empresas.

Judiciário, igreja e as camponesas


Na parte da manhã da atividade, as palestrantes Dr. Ela Volkmer de Castilho, que é subprocuradora do Ministério Público Federal e professora da UNB, e Ir. Delci Franzen,  coordenadora de projetos do Movimento de Educação de Base (MEB), apresentaram os desafios de combater práticas machistas nos respectivos segmentos – judiciário e dentro das comunidades de base da igreja. Para tratar dos desafios colocados para as mulheres no campo, esteve presente a educadora popular Eliane Martins, doutoranda em Sociologia que atua na Escola Nacional Florestan Fernandes.  

Dr. Ela Volkmer de Castilho destacou que o sistema de justiça é um sistema de conservação dos paradigmas que já estão colocados na sociedade e opina que, atualmente, o judiciário está ainda mais conservador e com foco voltado para a criminalização dos movimentos populares. A subprocuradora ponderou o crescimento das condenações de mulheres no sistema penal (muitas vezes acobertando crimes promovidos por homens) e a relação deste fenômeno com o processo amplo de culpabilização das mulheres na sociedade.  

“Querem que as mulheres voltem para dentro de casa”, afirma Ir. Delci Franzen que diz que, com os efeitos da crise econômica e a perda dos direitos sociais, o sistema tende a empurrar as mulheres para o trabalho relacionado ao cuidado, tido como “feminino” no senso comum. Ir. Franzen lembrou que as mulheres realizam, em média, quatro horas de tarefas domésticas por dia, enquanto os homens dedicam menos de uma hora. Para a religiosa, “a culpa produz o medo” – sobre o cenário atual de retrocessos combinado com a eterna culpa que todas as mulheres são provocadas a sentir na construção de suas personalidades. 

Para apresentar a gravidade da dominação provocada pelo machismo, Eliane Martins trouxe elementos que contam que, ao longo da história, o sistema tentou provar que as mulheres são inferiores. “Fornecemos a mercadoria mais preciosa para o capitalismo que é a força de trabalho, gerando novas vidas, e ainda também nós somos força de trabalho”, explica. 

A educadora resgatou o papel das “comadres” para a manutenção da saúde mental das camponesas e pontuou que, com a aceleração do ritmo de vida, o processo de culpabilização  das mulheres em meio às tarefas cotidianas aumentou, o que provoca cada vez mais o adoecimento.  

Trabalhadoras, defensoras de direitos, vítimas de abuso e o debate da saúde

 

Durante a tarde, o debate trouxe um caráter mais técnico – com apresentações de dados levantados em regiões onde há violações de direitos. A defensora pública do Espírito Santo Mariana Sobral destacou a relevância do MAB para a construção da articulação dos atingidos com o poder público. “O processo de reparação do crime da Samarco não foi pensando para ter participação popular”, diz.

A defensora também expos dados da bacia do Rio Doce que mostram que dos atingidos  responsáveis pelo recibemento do cartão com o auxílio financeiro 66% são homens. Além da dificuldade na etapa de reparação, as mulheres sofrem a fragilidade da inserção feminina no mundo do trabalho, especialmente em regiões vulneráveis. Muitas são donas de casa, outras têm trabalhos informais com pequenos comércios e prestação de serviços realizados em casa: costureiras, cozinheiras, entre outras. “A adaptação ao mercado de trabalho urbano é complicada, as empresas não reconhecem o trabalho feminino e preferem sentar para dialogar com os homens”, comenta Soniamara Maranho, da coordenação nacional do MAB.

Com experiências voltadas à pesquisa acadêmica, Anamaria Corbo, professora e pesquisadora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fiocruz, e Maria Berenice Tourinho, doutora em psicologia social do trabalho e professora da Universidade Federal de Rondônia, relataram a problemática das atingidas conseguirem acessar os serviços públicos de saúde nas regiões. 

“As demandas de saúde das atingidas estão totalmente invisibilizadas”, afirma a pesquisadora da Fiocruz, que desenvolve um trabalho de campo em parceria com o MAB no Rio de Janeiro. 

Tratando da temática da exploração sexual das adolescentes e jovens em Rondônia, a professora da Unir aponta: “é preciso levar em consideração o padrão cultural das regiões que, por si só, já apresentam histório de violações; temos que tentar, com nosso trabalho, empoderar as adolescentes porque o estado só atua depois que o problema acontece”. 

 

 

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| Publicado 21/12/2023 por Coletivo de Comunicação MAB PI

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