Audiência reúne mais de 400 atingidos em Cachoeiras de Macacu
Nesta segunda-feira (28), a Audiência Pública organizada pela Comissão de Trabalho da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) reuniu mais de 400 pessoas em Cachoeiras de Macacu (RJ), localizada […]
Publicado 30/04/2014
Nesta segunda-feira (28), a Audiência Pública organizada pela Comissão de Trabalho da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) reuniu mais de 400 pessoas em Cachoeiras de Macacu (RJ), localizada a cerca de 100 km da capital, para debater o projeto de barragem previsto para o rio Guapiaçu.
O evento – realizado à beira da área que pode ser alagada pelo lago da barragem – contou com a presença do Ministério Público Federal, Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Levante Popular da Juventude, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Sub Comitê de Bacia da Guanabara, sindicatos rurais da região, professores e estudantes da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), além representantes do legislativo federal, estadual e municipal.
Proposto pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente, o projeto para o rio Guapiaçu faz parte da compensação ambiental imposta ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) maior obra da história da Petrobrás -, que atualmente se encontra em fase de construção no município de Itaboraí, localizado ao lado de Cachoeiras de Macacu.
Atualmente empregando 29 mil trabalhadores, o Comperj deverá iniciar sua operação apenas em 2016. Apesar disso, os municípios do Leste Fluminense já sofreram um grande impacto com a chegada do empreendimento, que pode se tornar um dos maiores centros de refino de petróleo do mundo.
Entre os impactos está o aumento populacional da região e, conseqüentemente, o acrescimento nos níveis do consumo de água. A barragem do Guapiaçu serviria para suprir essa demanda.
A barragem, se construída, poderá atingir diretamente três mil pessoas, além de incidir sobre uma cadeia produtiva de quinze mil trabalhadores, que gera anualmente aproximadamente R$ 100 milhões. A região movimenta uma produção diária de 55 toneladas de alimentos, liderando o plantio de aipim e milho, produtos destinados principalmente ao consumo da cidade do Rio de Janeiro.
Nesse sentido, grande parte dos atingidos ressalta a importância de continuar em suas terras. É minha sobrevivência, eu não sei fazer mais nada, dependo desta terra, sem essa terra eu não sou nada. Você vai fazer o que com 60 anos por aí em outro lugar? Temos que lutar contra a barragem. Pra barragem aqui a resposta é não e não, afirma o agricultor Dionísio, morador de um dos 142 lotes da antiga fazenda Serra Queimada, submetida à reforma agrária no ano de 2002.
Dionísio vive na região há mais de 50 anos e retira de seus três hectares uma média de 20 mil reais anualmente a partir da sua plantação de mandioca. A agricultura familiar é a principal fornecedora de alimentos básicos para a população brasileira, segundo dados do IBGE. A produção do seu Dionísio integra os 87% de toda a mandioca produzida pelos pequenos agricultores que chega à mesa dos brasileiros.
Para o membro da coordenação nacional do MAB, Leonardo Maggi, as obras devem ser suspensas até que o Governo do Estado abra um canal de diálogo com os atingidos e apresente todas as informações referentes à barragem. Exigimos a suspensão imediata de todas as obras em andamento no leito da barragem, que já foi provada ser totalmente ilegal, imoral e injusta. O governo tem que explicar para o povo quais são seu verdadeiros planos para o rio Guapiaçu, afirma.
Ao final do evento foram tirados como encaminhamentos a abertura de uma Audiência Pública permanente para consulta da população, além da criação de um Grupo de Trabalho específico na Alerj para pensar alternativas ao projeto de barragem de Guapiaçu.
Uma nova audiência foi agendada para o próximo mês.
Irregularidades
O membro da Associação de Geógrafos Brasileiros e do Grupo de Trabalho sobre os impactos de grandes empreendimentos no espaço agrário do Rio de Janeiro, Eduardo Barcellos, aponta diversas irregularidades no processo de licenciamento da barragem do Guapiaçu.
A primeira e mais grave é o duplo papel exercido pela Secretaria de Meio Ambiente, que ao mesmo tempo é proponente e avaliadora do projeto. Ela está avaliando uma proposta que ela mesma propôs. É uma fragilidade enorme do ponto de vista institucional, você não tem um licenciamento isento, afirma.
Além disso, o pesquisador assinala irregularidades nos decretos expropriatórios, publicados pelo Governo Estadual em setembro e novembro de 2013, sem um parecer oficial do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), órgão ambiental responsável no Rio de Janeiro. Eles declararam uma área de utilidade pública que nem sequer foi avaliada pelo órgão ambiental. Isso fratura todo o processo de licenciamento, que seria apresentar os estudos ambientais, fazer as audiências públicas, consultar a população pra depois decidir a viabilidade do projeto, ressalta.
O decreto ainda prevê uma indenização de 5 mil reais para cada hectare desapropriado. Como a região do Guapiaçu é formada por pequenas propriedades minifúndios de 3 a 4 hectares – a indenização para cada família ficaria entre 15 e 20 mil reais em média. Você não consegue comprar um barraco na região metropolitana do Rio de Janeiro por esse valor, ressalta Eduardo.