Governo boicotou fiscalização contra garimpo em terras Yanomami, diz entidade de servidores
Associação afirma que última operação na região ocorreu há 5 meses. “sou psicopata”, declara presidente do Ibama
Publicado 11/05/2022 - Atualizado 11/05/2022
A Associação Nacional dos Servidores Ambientais (Ascema Nacional), que representa funcionários públicos federais da área ambiental, divulgou uma nota que acusa o governo federal de boicotar ações de fiscalização na Terra Indígena (TI) Yanomami.
Nas últimas semanas, multiplicaram-se denúncias de crimes bárbaros cometidos por garimpeiros ilegais contra a população indígena da TI. Lideranças divulgaram casos de assassinatos, mortes, prostituição, abuso sexual e indução do consumo de bebidas alcoolicas e ingestão de substâncias tóxicas, como gasolina.
A última vez que servidores do Ibama atuaram na Terra Indígena Yanomami foi em dezembro de 2021. Passaram-se cerca de 5 meses sem que qualquer ação de fiscalização do Ibama ocorresse no local”, diz trecho do comunicado emitido no sábado (7).
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A entidade afirma que o Ibama tem dificuldade para recrutar fiscais para atuar em operações de fiscalização. O motivo apontado são as “decisões desastrosas” dos dirigentes, que promoveram o “esvaziamento das condições de trabalho” da categoria.
Sob a gestão do atual presidente do Ibama, Eduardo Bim, houve “corte no adicional de periculosidade, jornadas exaustivas sem pagamento de horas extras e diárias insuficientes para o custeio das atividades de trabalho, obrigando muitas vezes o servidor a pagar do próprio bolso para trabalhar”, diz o comunicado.
60 mil multas podem prescrever
Segundo a Ascema, a alteração e interpretação distorcida de regras internas do órgão ambiental favoreceram a prescrição de multas. Quase 60 mil infrações em todo o país podem prescrever até 2024, uma “verdadeira anistia em massa”, escreveu a entidade.
“Serão anos de gastos públicos no combate aos delitos ambientais jogados no lixo. Essa impunidade gera descrença nas instituições e promove um ambiente favorável à destruição ambiental e ao ferimento dos direitos dos povos originários”, afirma a nota.
A Ascema reafirmou que servidores da área de fiscalização ambiental do Ibama e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) sofrem perseguição interna ao cumprir seu dever, mostrando que a cúpula dos órgãos atua em favor dos criminosos ambientais.
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A falta de servidores também dificulta o trabalho. Nem os concursos recentes da área ambiental foram suficientes para repor o quadro. Conforme o comunicado, foram preenchidas menos de 10% das vagas de analista ambiental para ambas as autarquias.
“Dessa forma, as invasões que ocorrem hoje na TI Yanomami, bem como em diversas outras Terras Indígenas, Unidades de Conservação, dentre outros locais ecologicamente sensíveis, também são frutos da desestruturação da carreira, dos institutos e do Ministério do Meio Ambiente”, escreve a associação de servidores.
O Brasil de Fato pediu que as assessorias de imprensa do Ibama, do ICMBio e do Ministério do Meio Ambiente respondessem às críticas da Ascema, mas não houve retorno até a publicação.
“Sou psicopata”, diz presidente do Ibama
Em uma declaração recente, o presidente do Ibama não demonstrou preocupação com a repercussão negativa do desmonte da fiscalização ambiental, denunciado também por ONGs e organizações indígenas.
Eduardo Bim se autointitulou “psicopata” e afirmou que não está “nem aí” para o que diz a imprensa. “Tem gestor que se sente constrangido por reportagem de jornal. Eu não. Eu sou um psicopata, não estou nem aí. Particularmente não estou nem aí”, declarou.
A fala foi gravada em um vídeo disponibilizado no Youtube e publicado pelo perfil no Twitter Política por Inteiro. Depois da divulgação, o material foi colocado como privado na plataforma.
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Em 2021, o chefe do Ibama foi afastado do cargo por 90 dias após uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Na época, ele era investigado pela Polícia Federal (PF) por ter afrouxado regras de exportação de madeira, favorecendo madeireiras ilegais.
No vídeo, Bim fez pouco caso do afastamento e o chamou de “licença prêmio”, um descanso remunerado concedido a cada cinco anos para servidores públicos que não faltam ao trabalho.
A mesma operação da Polícia Federal (PF) resultou no afastamento do então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, também investigado por tráfico de madeira.
Edição: Felipe Mendes