Em reunião com lideranças do bairro Gapara, MAB recebeu denúncias sobre má qualidade da água causando doenças aos moradores
Publicado 01/02/2021 - Atualizado 01/02/2021
Famílias atingidas responsabilizam a Vale pelos casos de contaminação da água que abastece mais de 15 mil moradores da região do Itaqui Bacanga, em São Luís, capital do Maranhão.
Há quase 26 anos os moradores da região veem sair de suas torneiras um líquido com a coloração diferente do que sai em outras torneiras de São Luís. A água, que é um direito humano inviolável, está com uma coloração escura, um sabor estranho e vêm causando queda de cabelo e problemas de pele em muitas pessoas da região.
A resposta para o que causa a contaminação da água e outros problemas está bem próxima da comunidade, uma empresa localizada do outro lado de um muro que perpassa todos os seis bairros da região, a empresa Vale.
A Vale tem o Maranhão como ponto estratégico para escoar toneladas diárias de minério de ferro, extraídas no Pará e da região norte, para a China. É pelo Terminal Marítimo Ponta da Madeira e o Porto de Itaqui que os minérios são exportados para fora do Brasil.
Somente no terceiro trimestre de 2020, foram mais de 139 mil toneladas métricas de minério de ferro extraídos do sistema Norte, transportados pela estrada ferrovia Carajás e escoados pelo Portos Marítimos, em São Luís, o que corresponde a uma das maiores fontes de lucro da Vale no Brasil.
A mineradora está instalada há 50 anos na região do Itaqui-Bacanga que é conhecida como a área industrial de São Luís devido a presença de vários empreendimentos da Vale (virador de vagões, uma usina de pelotização e um armazém de grãos), além de outras empresas como a ENEVA (usina termelétrica a base de carvão mineral) e a ALUMAR (barragens de rejeito).
Durante esse período, a atuação da Vale tem causado impactos sociais e ambientais imensuráveis, desde o início das suas operações descarregam e transportam diariamente minério de ferro e lingotes de ferro-gusa, o que ao longo dos anos, trouxe para a população poluição do ar, da água e do solo.
Em relação a contaminação da água, além do bairro Gapara, outros cinco bairros da região são atingidos atualmente. Cerca de 15 mil atingidos sofrem um grave impacto social, o empobrecimento, e ainda precisam comprar água para consumo, principalmente para beber e cozinhar. É comum os moradores precisarem comprar água de caminhões pipas, quando a coloração está mais escura ou pela recorrente falta de água, que vem dos três poços tubulares construídos pela ONG Plan Internacional e administrados pelos próprios moradores.
“Tinham meses que eu gastava R$ 550 de água do caminhão pipa e mineral, pra mim que ganho dois salários mínimos e sustento uma casa com nove pessoas, é muito, tira do nosso arroz e feijão”, fala Francineide, que mora na região há 29 anos, antes mesmo da formação do bairro.
A atingida conta que os moradores que não tem condição de comprar água mineral e a do caminhão pipa precisam tirar água de poços cacimbão, feitos pelos primeiros moradores, e que ainda são vistas cenas de pessoas carregando balde de água nas ruas.
“A Vale está aqui e não faz nada por ninguém, já estamos cansados só de aula de pintura e entrega de mudas, cadê o dinheiro que mandam para o município e para o estado? Aqui sempre foi esquecido, não tem água, não tem saneamento básico, não tem rua, só tem a Vale”, completa Mauro, liderança comunitária atuante na região.
Vale acredita ser dona do território
Além da contaminação da água, existem outros problemas graves na região, como doenças respiratórios decorrentes de um pó que sai da Vale, além da comunidade não ter acesso a itens básicos, como caminhão de lixo, ruas asfaltadas, documento de posse da terra. Todos esses problemas tem a Vale como central, ela contamina o solo, a água, o ar, e ainda se apresenta como a dona legal da terra, o que, inclusive, é a justificativa dos governos para não agir na região.
O MAB esteve na região participando de uma reunião na última quarta-feira (27), com moradores e lideranças do bairro Gapara, local mais atingido atualmente para prestar apoio e somar nas ações de luta da região contra a Vale.
Impunidade
No Brasil e no mundo, a Vale é denunciada por diversos crimes, alguns são casos de contaminação da água. Na avaliação do MAB, a Vale não pode mais seguir ilesa dos crimes que pratica contra a população e contra o meio-ambiente.
“O padrão de violação de direitos humanos que as grandes empresas seguem praticando em nosso país não pode mais ser permitido pelos povos. Não podemos aceitar que o Estado brasileiro siga sendo conivente com a atuação criminosa da Vale em nosso país. É preciso que a população organizada reaja a façanha do capital. O lucro não pode continuar acima da vida”, afirma o movimento.