Não à barragem El Zapotillo: a força coletiva no III Encontro Internacional
Os olhos do mundo já estão voltados para Belém, onde inicia, na próxima sexta (07), o IV Encontro Internacional de Comunidades Atingidas por Barragens e Crise Climática. Concluímos a série que aprofunda a história dos encontros internacionais relembrando o terceiro, no México
Publicado 04/11/2025 - Actualizado 04/11/2025

Temacapulín, Acasico e Palmarejo são vilarejos históricos à beira do Rio Verde, no estado de Jalisco, oeste mexicano. Ameaçada, desde o fim dos anos 1990, pela construção da barragem El Zapotillo, a região foi terra fértil para o III Encontro Internacional de Atingidos por Barragens, sete anos depois da Tailândia.
De 1º a 07 de outubro de 2010, os moradores de Temacapulín acolheram em suas próprias casas mais de 300 atingidos, representantes de organizações civis e de movimentos sociais de todo o mundo. Os delegados, vindos de 60 países, além de realizarem um ato no local onde a barragem estava sendo construída, internacionalizaram a luta que os atingidos dos três povoados travavam há cinco anos e se comprometeram a realizar em todo o mundo ações contra a construção de El Zapotillo.
O Encontro chamou a atenção internacional para a luta contra a barragem e em defesa dos direitos dos atingidos, aumentando a compreensão e o apoio global e, consequentemente, a pressão contra a construção da barragem, que inundaria Temacapulín, Acasico e Palmarejo, para garantir o abastecimento hídrico à grande cidade de Guadalajara. Esse cenário provocou o imediato recuo do governo mexicano, já que o projeto apresentava uma série de irregularidades administrativas, além de que previa o despejo de mais de 800 famílias dos três povoados históricos.

O porta voz do Comitê Salvemos Temaca, Acasico e Palmarejo, Gabriel Iñiguez, lembra que a presença de delegados de tantos países ajudou os mexicanos a compreenderem a abrangência do problema das barragens, dos deslocamentos forçados, dos desequilíbrios ecológicos, da privatização da água, da violação dos direitos humanos, da apropriação e da voracidade das empresas e dos governos que causam a morte dos rios.
Gabriel comenta que um legado fundamental do III Encontro Internacional foi “a força organizativa e a convicção de que, unidos, internacionalizamos a esperança”. Para ele, foi esta articulação coletiva que garantiu que o projeto da barragem fosse substancialmente modificado. Depois de paralisada por 10 anos, a barragem foi construída a partir de um novo projeto: ao invés de atingir 4.000 hectares – como estava prevista em 2010 -, apenas 400 foram alagados, de modo que as vilas e as terras de cultivo não foram inundadas.
“A operação da pequena represa, com seis comportas, fornece hoje uma quantidade de água necessária para a cidade de Guadalajara. E a partir da nossa luta, outros povos do México aprenderam a lição de nunca se render. Foi tão forte o nosso grito de dignidade e autodeterminação, que obrigamos o governo a ouvir e a agir”, conta Iñiguez.
Ainda que tenham conquistado a garantia de seu território contra o projeto da El Zapotillo, os atingidos seguem lutando contra os projetos de privatização e outras iniciativas que ameaçam seus territórios e suas culturas, o acesso à água e a organização dos moradores destas localidades. “O problema persiste porque empresas e governos buscam privatizar a água para interesses industriais e econômicos nacionais e internacionais. É urgente restaurar a organização social para resistir, apegando-se aos princípios de autonomia e respeitando os usos e costumes de cada território”, conclui Gabriel Iñiguez.


Rumo ao IV Encontro Internacional
O mexicano Gabriel se soma a outros companheiros de seu país e a centenas de atingidos de todo o mundo no IV Encontro Internacional de Comunidades Atingidas por Barragens e Crise Climática, que inicia na próxima sexta-feira (07), em Belém, no Norte do Brasil.
Ele conta que traz na bagagem a luta contra a El Zapotillo como inspiração para os novos enfrentamentos necessários e que espera sair do encontro motivado a novos caminhos: “Espero aprender no IV Encontro novas rotas para superar a crise climática e levar o testemunho de nossas conquistas e a memória de nossos antepassados que, em espírito, têm sido fundamento essencial do nosso trabalho a favor da vida, da justiça e da paz”.
O encontro em Belém deve marcar a decisão de consolidar o Movimento Internacional de Atingidos por Barragens e pela Crise Climática, como relata Soniamara Maranho, da coordenação do Movimento de Afectados por Represas (MAR) na América Latina. Segundo ela, esta é a primeira decisão a ser tomada, antecedendo um processo de reposicionamento e de nacionalização de todas as organizações, em todos os países, com uma estratégia comum em nível internacional.
Sonia partilha as suas expectativas e acredita que o encontro será ocasião para que “consigamos nos articular de forma mais qualificada por continente e sair com a definição do V Encontro Internacional”. Para os anos que chegam, acredita que este IV Encontro deve abrir caminhos para que seja possível “construir um processo de formação política-ideológica, com a construção de uma coordenação em cada continente e de uma coordenação internacional.
“Que ampliemos a força dos atingidos por barragens e a crise climática em todo o mundo, interferindo na lógica do sistema capitalista, construindo a força necessária para ter em cada país uma outra ordem, uma sociedade alternativa que se aproprie da construção de projetos energéticos populares em todos os países e continentes”, afirma Soniamara.
A partir de quinta-feira (06), você acompanha em nosso site a cobertura do IV Encontro Internacional de Comunidades Atingidas por Barragens e Crise Climática e, na sequência, da participação dos delegados do Encontro na Cúpula dos Povos, entre 12 a 16 de novembro.
