Atingidas da Bahia denunciam a prisão política de Solange e Vanderlei

Durante a Jornada de lutas, em Brasília, que reuniu mais de mil mulheres atingidas do Brasil, militantes da Bahia denunciam repressão e prisão injusta

Mulheres atingidas exigem liberdade a Solange e Vanderlei. Foto: Nivea Magno / MAB

Nesta quinta-feira, 12 de junho, completam-se 27 dias desde a prisão arbitrária de Solange Moreira e Vanderlei Silva, fecheiros e militantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que vivem na comunidade tradicional de Fundo e Fecho de Pasto de Brejo Verde, no município de Correntina (BA). Com atuação na luta por direitos nos territórios e pela preservação dos modos de vida tradicionais do Cerrado baiano, o casal foi detido de forma repentina em 16 de maio, no Aeroporto Internacional do Galeão (RJ), enquanto realizava uma viagem de férias. A prisão foi decretada sem que houvesse qualquer notificação prévia ou possibilidade de defesa.

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Fecheiros e militantes do MAB são presos e criminalizados injustamente

Dado a gravidade da violação de direitos e ataque à organização popular, atingidas de diversas regiões da Bahia denunciaram, durante a Jornada Nacional de Luta das Mulheres Atingidas: para enfrentar o fascismo, a crise climática e avançar nos direitos – realizada em Brasília entre os dias 2 e 5 de junho – a prisão injusta dos companheiros. Em diversos momentos da programação, as mulheres denunciaram publicamente o caso como exemplo da criminalização das lideranças populares e da repressão aos que lutam pelos direitos das comunidades tradicionais.

Militante do MAB na comunidade de Nova Colônia, em Coribe, Oeste da Bahia, Maria José Sodré reafirma a arbitrariedade da prisão de Solange e Vanderlei. “Por defenderem o Cerrado em pé e os modos de vida das comunidades tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto, Solange e Vanderlei estão presos no Rio de Janeiro. Trata-se de uma prisão política, sem provas.

A luta pelo direito de permanecer no território não pode ser criminalizada, nem silenciada com o apoio do Estado. Não podemos permitir que o avanço do agronegócio destrua nossos modos de vida e nos tire a água e a terra”, aponta.

Durante a mesa “Patriarcado e violência: os desafios da luta das mulheres no atual contexto histórico e o legado das lutadoras atingidas”, que compôs a Jornada de Nacional de Luta, Vanessa Moreira, filha de Solange e Vanderlei, foi convidada para trazer depoimentos sobre as lutas no território. Na ocasião, ela fez denúncias sobre as violações de direitos sofridas pelos pais. “A prisão deles é uma prisão política. Defender a vida é um direito e eles estão presos por defender a vida das populações atingidas, dos ribeirinhos e dos fecheiros”, relata.

Filha de Solange e Vanderlei, Vanessa Moreira, durante a fala na Jornada de Luta. Foto: Marta Fleita / MAB

Vanessa lembra que os conflitos na região têm raízes históricas: “O nosso inimigo não é novo. Desde a década de 1970 nós somos ameaçados e expulsos dos nossos territórios. Vivemos sob intimidação, sofrendo pela falta de acesso a água e impedidos de defender a nossa terra e proteger o Cerrado. Não podemos permitir que isso continue se perpetuando”, ressalta.

A Jornada Nacional de Luta das Mulheres Atingidas reuniu, em Brasília (DF), mais de mil mulheres de diferentes regiões do Brasil, criando um espaço de troca de experiências e pressionando o poder público pela garantia de direitos. Entre as principais pautas estavam a regulamentação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas (PNAB), a implementação de Planos de Segurança e o enfrentamento à devastação ambiental. A denúncia da prisão de Solange e Vanderlei esteve presente todos os dias.

Mulheres da Bahia reafirmam que “Lutar não é crime” durante a Jornada Nacional de Luta. Foto: Marcos Souza / MAB
Mulheres da Bahia reafirmam que “Lutar não é crime” durante a Jornada Nacional de Luta. Foto: Marcos Souza / MAB

De acordo com Cleidiane Barreto, membro da Coordenação do MAB, as atingidas da Bahia levaram para Brasília um panorama de como as comunidades e modos de vida tradicionais têm sido violentados nos territórios. “Levar essa denúncia traz à tona o contexto do Oeste da Bahia para o Brasil. Mas, mais do que isso, revela como a direita tem avançado sobre as comunidades tradicionais, criminalizando aqueles que defendem os territórios. Na Jornada, tivemos a oportunidade de mostrar como são essas comunidades e também afirmar que estamos diante de um caso de prisão política”, afirma.

Para Cleidiane, esse processo é ainda mais cruel quando se trata das mulheres atingidas, por isso a importância do fortalecimento da organização e de espaços como o da Jornada. “São as mulheres que assumem a linha de frente na defesa dos territórios, denunciando as atrocidades cometidas pelo agronegócio e pelos megaprojetos.

“São as mulheres as mais atingidas e são as que mais sentem, no corpo e na vida, as violações de direitos. Por isso, são também as primeiras a se levantar, se organizar e a mobilizar suas comunidades”, conclui.

As atingidas da Bahia levaram a Brasília denúncias sobre os impactos causados pela construção de barragens e megaempreendimentos. Expuseram os dramas provocados pelas enchentes, denunciaram a grilagem de terras e a criminalização de defensoras e defensores da vida. Em unidade com atingidas de outros estados e outras regiões do Brasil, fortaleceram a luta contra o fascismo, a crise climática e em defesa da conquista de direitos.


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