Energia do Movimento: Ciranda do MAB garante participação política das crianças durante Jornada de Lutas em Brasília (DF)
Cerca de 130 crianças de todo o Brasil participam da Ciranda Infantil durante mobilizações dos atingidos por barragens
Publicado 06/11/2023 - Atualizado 06/11/2023
“E se as crianças governassem o Brasil?” Esse é um dos temas da Ciranda Infantil que acontece durante a Jornada de Lutas do Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB, que vai até o próximo dia 07, em Brasília – DF. O espaço se utiliza de linguagens lúdicas para envolver as crianças nos debates sobre a reparação e a luta por direitos dos atingidos por barragens do Brasil.
Ao todo, cerca de 130 crianças participam da Ciranda mediada por 60 educadores de todos as regiões do país que estão na capital participando da Jornada. No espaço, eles instigam reflexões através de músicas, desenhos e brincadeiras que trazem lições não só para as crianças, mas para os seus pais, outros militantes do Movimento e todas as comunidades onde vivem.
Para além de um lugar em que os pais, mães ou avós podem deixar os filhos e netos enquanto participam da programação de atos e demais atividades da Jornada, a Ciranda é um ambiente de acolhimento e aprendizado pensado para as crianças e com a participação delas.
“Há uma frase que resume bem a importância desse espaço para a luta do povo atingido: a Ciranda do MAB é a energia do movimento”, afirma Diego Ortiz, que faz parte do Coletivo Nacional de Educadores Infantis da Ciranda.
O dirigente conta que o envolvimento das crianças é levado a sério pelo Movimento. “A Ciranda Infantil é um espaço que viabiliza a participação política das crianças em todas as suas formas e expressões: na brincadeira, de forma lúdica, com linguagens próprias para que elas também possam construir o projeto de luta do Movimento, que é o projeto energético popular e de reivindicação dos direitos dos atingidos”, avalia.
Segundo Diego, “durante a construção, operação e rompimento de barragens, os direitos das crianças sempre são violados. E é a partir do olhar delas que caminhos podem ser traçados para a construção de um mundo melhor e mais justo”.
É na Ciranda que as crianças, literalmente, desenham e colorem sonhos e possibilidades para o seu futuro. Um exemplo é o da Valentina, de 5 anos. Natural de Rondônia, ela deixou a cadeira de rodas por alguns minutos para brincar no tapete do espaço com a ajuda da sua educadora Natália. Com tintas nas mãos, ela fez novos amigos e se empolgou com a brincadeira. “É muito bom. Estou brincando de tinta azul e rosa”, contou ela mostrando as mãos.
Ao longo da programação da Jornada, a Ciranda vai abordar três temas: a identidade de crianças atingidas, os direitos das crianças atingidas e suas pautas e o que as crianças fariam se elas governassem o Brasil.
Sem a Ciranda o Movimento não anda
Durante as atividades, as crianças são organizadas por faixa etária, mas algumas atividades são realizadas envolvendo participantes de todas as idades, para promover uma interação geral entre elas.
Para Diego Ortiz, é na Ciranda que o Movimento renova suas forças e é por meio dela que os adultos são sensibilizados e animados. “Ao longo do tempo, a Ciranda também foi educando os adultos, mostrando que é importante o cuidado com as crianças e com os temas que elas trazem. Isso anima o Movimento, anima a luta”, afirma.
Histórico da Ciranda
Desde os anos 90, os movimentos sociais organizam espaços voltados para as crianças durante suas atividades. Os Círculos de Cultura Infantis cubanos são uma referência que contribuiu para a criação de atividades como a Ciranda no Brasil.
Nos anos 2000, começou ser desenvolvida uma política com objetivos e abordagem pedagógica focada nas crianças a partir dos temas debatidos no MAB.
“A partir de 2010, foi criado um plano de formação para educadores infantis no MAB e, em 2013, aconteceu a primeira experiência de Ciranda no Encontro Nacional do MAB. Foi aí que nasceu o Coletivo de Educadores e, a partir de então, foi crescendo a participação das crianças no Encontro”, lembra Ortiz.
Jornada de lutas em Brasília
Ao todo, 2.500 atingidos estão em Brasília (DF) para a Jornada Nacional de Lutas do MAB, que acontece até o dia 7 de novembro. A proposta é dar visibilidade às principais reivindicações do Movimento: reparação, efetivação dos direitos e políticas de proteção social para os atingidos por parte do Estado brasileiro. Durante esses dias, atingidos de todas as regiões do país vão participar de atos, assembleias e reuniões para apresentar suas pautas para a população em geral e para diferentes órgãos do executivo e do legislativo.
A principal demanda do MAB é a aprovação da Política Nacional de Direitos da População Atingida por Barragens – PNAB. O PL, que está em tramitação no Senado, define responsabilidades, formas de reparação e cria, também, mecanismos de prevenção e mitigação de impactos dos empreendimentos com barragens no Brasil. Se sancionada, a lei será considerada um avanço inédito no tratamento dos atingidos no Brasil.
Outra reivindicação do Movimento é a criação de um “Fundo Nacional Para a Reparação das Populações Atingidas” com foco em garantir recursos para projetos que previnam novas tragédias no Brasil relacionadas à construção, operação e rompimento de grandes obras (de represamento de água, mineração e produção de energia), a partir do envolvimento ativo da população na formulação das ações. O fundo também deve servir para lidar com prevenção de tragédias e reparação dos prejuízos causados pelas mudanças climáticas, como inundações, secas extremas e deslizamentos.
A data escolhida para iniciar a jornada, 5 de novembro, marca os oito anos do rompimento da barragem da Samarco (Vale e BHP Billiton) em Mariana (MG). O Movimento espera sensibilizar o governo para que ele possa atuar efetivamente na reparação dos atingidos. Enquanto as empresas e o poder público discutem na justiça uma nova “repactuação”, os atingidos, defendem que haja participação popular em todas as etapas do processo.