Situação crítica da estatal privatizada no governo FHC remete ao debate da desestatização da Eletrobras, contestada por Lula. Carlos Alberto Sicupira, um dos maiores acionistas das Americanas, é também um dos principais sócios da elétrica do Rio
Publicado 10/02/2023 - Atualizado 10/02/2023
Depois da derrocada da Lojas Americanas, a Light – concessionária que fornece energia elétrica para 31 municípios do Rio de Janeiro, inclusive a capital – começa a semana como a bola da vez no noticiário de empresas à beira do abismo. O endividamento líquido da companhia é de R$ 8,7 bilhões e as informações são de que a dívida bruta chega a R$ 12,8 bilhões. Não passa despercebida a “coincidência” de que o empresário Carlos Alberto Sicupira, que também é acionista “referência” da gigante varejista, está entre os maiores acionistas da empresa de energia.
Sicupira é sócio do grupo 3G, em parceria com Jorge Paulo Lemann e Marcel Telles, os maiores acionistas da Americanas. Ronaldo Cezar Coelho, do Grupo Samambaia, é outro acionista de peso da Light. A empresa avisou a Agência Nacional de Energia Elétrica que não tem caixa para sustentar suas operações.
As desconfianças em torno da Light – que fornece energia para cerca de 5 milhões de usuários – começaram a ficar aparentes e, mais do que isso, indisfarçáveis, no final do mês passado. Foi quando veio a público que a companhia havia contratado a Laplace, especializada em reestruturação de empresas em dificuldade.
Com os graves problemas para rolar suas dívidas tornados públicos, os papéis LIGT3, na terça-feira, fecharam em queda de 14,19%, a apenas R$ 2,66. Já caíram mais de 40% em 2023. A situação da companhia é ainda mais complicada porque sua concessão vence em 2026, o que torna ainda mais difícil a rolagem da dívida para depois desse prazo.
Lula e Eletrobras
A crise da privatizada Light coincide com a declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ontem (7), a respeito do processo de privatização da Eletrobras, tocada pelo governo de Jair Bolsonaro. Em encontro com jornalistas da imprensa alterativa, Lula classificou de “lesa-pátria” e “quase uma bandidagem”. O chefe de governo indicou que a Advocacia-Geral da União (AGU) deve estudar meios para “rever esse contrato leonino contra o governo”.
Isso porque, segundo Lula, o governo detém 40% das ações da companhia, Eletrobras, “e o governo só pode participar na direção como se tivesse 10%”. “Se amanhã o governo tiver interesse de comprar as ações, as ações para o governo valem três vezes mais do que o valor normal para outro candidato. Ou seja, foi feito quase que uma bandidagem para que o governo não volte a adquirir maioria”, disse.
Ele acrescentou que executivos da Eletrobras privatizada aumentaram os próprios salários de R$ 60 mil para R$ 360 mil. Disse ainda que um conselheiro recebe R$ 200 mil. “Isso é privatizar para quê?”, questionou.
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Light: situação complicada
A Light foi privatizada em 1996 pelo governo de Fernando Henrique Cardoso. Sua situação é delicada também pela geografia de suas operações. Apesar de ser uma das maiores distribuidoras de energia brasileiras, grande parte do território que atende fica em regiões dominadas por facções e milícias.
Evidentemente, nesse contexto, criminosos fazem ligações clandestinas – os chamados “gatos” – apropriando-se da energia gerada pela empresa para cobrar taxas dos moradores pelo fornecimento. Mas, em vez de desenvolver formas de controlar e conter o extravio, a empresa foi encarecendo o serviço, aprofundando a fuga dos consumidores. Com isso, baixa a arrecadação e aumentam ainda mais os investimentos necessários à atividade da concessionária, que não tem ido muito além de prestar manutenção e reparos na rede “oficial”, e já com dificuldades.