Moradores das margens da rodovia Transamazônica resistem a desapropriações por obras de manutenção
Publicado 24/01/2023 - Atualizado 24/01/2023
O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) vai suspender as notificações de desapropriação para as famílias que vivem às margens da rodovia Transamazônica, no perímetro urbano de Altamira (PA). O anúncio foi feito em uma reunião na sede do órgão com a presença de moradores organizados pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) na manhã desta terça-feira (24/02) e ocorre após uma semana de lutas para denunciar as notificações irregulares.
O DNIT iniciou neste mês um projeto de manutenção e recuperação da rodovia, em um trecho de 15 km dentro da cidade de Altamira. As famílias que vivem em ocupações às margens da via reclamam que foram coagidas a deixar suas casas em um prazo de 30 dias sem que o órgão apresentasse nenhuma proposta de indenização ou reassentamento. Centenas de famílias serão atingidas, tanto em casas de palafitas quanto alvenaria. Algumas vivem há mais de 10 anos no local, uma das poucas áreas públicas que restou para os mais pobres ocuparem em Altamira depois que a Norte Energia removeu os moradores das áreas alagadiças devido à construção da hidrelétrica de Belo Monte.
“A reunião foi favorável, eles deram bastante informação e resolveram algumas questões porque, pelo que entendi, a gente não vai sair de mãos abanando. A nossa luta ainda vai ser bastante grande, mas a nossa vitória vai ser bem maior”, afirmaTainá da Silva, moradora da área e coordenadora do grupo de atingidos do MAB.
O projeto do DNIT, que vai custar cerca de R$25 milhões durante três anos, ficou “congelado” durante o governo Bolsonaro. Serão construídos acostamentos, estacionamento, troca de bueiros e recapeamento. O órgão ainda não tem uma estimativa de quantas casas devem ser demolidas. Mais de 600 famílias vivem no local, mas só alguns trechos sofrerão desapropriações.
Risco de desabamento
Além do DNIT e do MAB, estiveram presentes na reunião representantes da prefeitura de Altamira e do Ministério Público Federal (MPF). A prefeitura informou que há 11 casas com risco de desabamento na localidade. Uma grande preocupação dos moradores é que as obras do DNIT, que já iniciaram, podem afetar a estrutura dos imóveis e agravar o problema, em especial no período das chuvas, como agora.
Com a finalização do levantamento topográfico, o DNIT vai pedir o Decreto de Utilidade Pública para a área “diretamente afetada”. Depois disso, em um prazo de 30 dias, virá uma equipe de Brasília para fazer o cadastro socioeconômico das famílias atingidas. “Só então é que vamos saber quem deverá sair e vamos conhecer quais as propostas de tratamento”, afirma Jackson Dias, da coordenação do MAB, que participou da reunião. “O MAB continuará em luta para garantir que nenhuma família seja invisibilizada e tenha direito a uma reparação justa”, pontua.
A rodovia Transamazônica (Br 230) teve sua construção iniciada nos anos 1970, durante a ditadura militar. A visão do período era que a Amazônia era um grande vazio demográfico que precisava ser ocupado e a floresta uma “selva” que precisava ser derrubada para a produção agropecuária. A cidade de Altamira foi um dos principais polos que recebeu migrantes para trabalhar na abertura da estrada e serem assentados ao longo da rodovia. Inicialmente pensado para agricultores familiares, logo este projeto foi abandonado pelo governo federal em favor do investimento em grandes fazendas e projetos de mineração, que agravaram as contradições fundiárias e ambientais na região.
Com o crescimento de Altamira, primeiro por causa da própria rodovia e, 30 anos depois, por causa de Belo Monte, um trecho da Transamazônica acabou “engolido” pela mancha urbana. O DNIT já enviou ao IBAMA o Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA) para a abertura de um traçado alternativo para a rodovia, “desviando-a” pela zona rural do município. O órgão não divulga detalhes deste projeto para não incentivar a especulação imobiliária.