Projetos de energia justa, popular e democrática são debatidos na Tenda do MAB durante Fospa

Durante 4 dias, evento reuniu participantes de nove países na Universidade Federal do Pará para debater a defesa do território e dos direitos dos povos da Amazônia

Foto: Igor Meirelles / MAB

No último sábado, 30, o MAB organizou um debate sobre experiências de transição energética na Amazônia durante o X Fórum Social Pan-Amazônico (Fospa), que aconteceu em Belém (PA) de 28 a 31 de julho.

“Esse sol que a gente está pegando aqui, é um sol muito forte. Vai esquentar essa tenda e ela vai passar de quarenta graus à tarde. O sol que irradia em um dia aqui em Belém do Pará, capital das resistências, é o suficiente para gerar mil dias de energia que o mundo precisa para sobreviver”, afirmou Francisco Kelvim, integrante da coordenação nacional do MAB, durante sua fala no encontro, ilustrando o potencial da Amazônia para a produção de energia solar.

O debate também contou com a participação de Marcelo Montenegro, da Fundação Heinrich Böll, de Luz Gon, assessora de meio ambiente da Central única dos Trabalhadores – CUT, e de Jordi Besora, da Alianza Contra la Pobreza Energética – organização da Catalunha (Espanha). 

Ainda segundo Kelvim, os países precisam garantir a produção, geração e distribuição de energia para as suas populações de forma justa e com soberania, porque existe uma corrida pelo domínio do setor energético. “Os nossos rios, os nossos territórios e até a vida do nosso povo e das nossas comunidades são disputados por empreendedores que colocam o lucro acima da vida”, ressaltou.

A matriz energética mundial é composta, em sua maioria, por fontes não renováveis – os combustíveis fósseis como petróleo, carvão mineral e gás natural ainda constituem grande parte da energia utilizada em todo o mundo. Essas fontes estão concentradas em alguns países da América Latina e são as maiores causadoras da emissão de gases do efeito estufa no mundo. Por isso, Luz Gon defendeu que o povo precisa ser protagonista das soluções para a transição energética e garantir os direitos dos trabalhadores do setor. “A gente não quer uma transição a qualquer custo. Isso é uma coisa que a gente vem discutindo dentro da CUT. Então, o que a gente quer? A gente tem feito a discussão sobre uma transição justa, que precisa ser construída coletivamente a partir do diálogo”, afirmou a assessora.

Princípios de um modelo energético popular

Foto: Igor Meirelles / MAB

Na segunda edição da revista enMARcha, publicada em maio deste ano, o Movimiento de Afectados por Represas – MAR apresentou princípios que norteiam um modelo energético popular para o Brasil, para a América Latina e para o mundo. As diretrizes foram estabelecidas a partir de uma discussão entre representantes de dezenove países, com diferentes contextos econômicos e sociais.

O primeiro princípio diz que a energia é um direito humano e todo mundo tem que ter acesso garantido a ele. “Isso é uma premissa chave para se satisfazer de forma direta e indireta todas as necessidades da população, porque a gente precisa ter energia pra estudar, pra trabalhar, pra ter saúde. Ou seja, a energia não pode ser uma mercadoria”, explica Kelvim. 

O segundo princípio é relacionado à sustentabilidade energética, porque as fontes renováveis precisam ser priorizadas e adotadas pelos governos. “E não é só sobre tecnologia que estamos discutindo. A gente está falando também que não podemos mais ter essa quantidade de atingidos e atingidas por barragens no Brasil e no mundo. E o nosso papel é não deixar que esse próximo governo permita que o setor energético do Brasil seja de novo sequestrado pelas grandes empresas”, explica Kelvim.

O terceiro princípio é a apropriação popular das tecnologias alternativas, como no caso do chamado projeto “Veredas Sol e Lares”, uma usina híbrida (hidrelétrica e solar), que está sendo construída com a participação popular, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. De forma pioneira, a população será envolvida na pesquisa de campo, na construção da usina e na criação de um plano de desenvolvimento social para o território.

Na Amazônia, outra referência é o projeto “Uso de Tecnologias Sociais para a Redução do Desmatamento”, implementado em Rondônia, Mato Grosso, Pará e Tocantins. Financiada pelo Fundo Amazônia, a iniciativa possibilitou a instalação e a capacitação para a gestão de placas solares em propriedades de famílias atingidas nestes estados. Além disso, o projeto permitiu o reflorestamento dos territórios beneficiados com o plantio de cinquenta e seis mil mudas de árvores.

Em sua fala, Marcelo Montenegro, coordenador da área de justiça socioambiental da Fundação Heinrich Böll, apresentou novas fontes de energia renovável, como o hidrogênio verde. Ele explicou que no estado do Ceará, por exemplo, já há pelo menos 18 projetos que estudam a implementação dessa alternativa. “Há uma necessidade a médio e longo prazo de se diversificar a matriz e buscar fontes de energia mais limpas e o hidrogênio pode contribuir para essa transição”, defendeu. Marcelo ressaltou que – como essa é uma alternativa nova – existe a possibilidade de se discutir democraticamente sua implementação desde o início. “Quais são as necessidades e as condições para que isso possa acontecer sem que haja um impacto naqueles que moram, nas pessoas do território?”, questionou o dirigente.

Ao todo, o Fospa reuniu mais de cinco  mil pessoas incluindo Indígenas, quilombolas, ribeirinhos, camponeses e integrantes de diferentes movimentos sociais para debater de questões econômicas, sociais e ambientais relacionadas à região Amazônica.

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