Sem aviso, abertura de comporta da barragem Pedra do Cavalo (BA) coloca ribeirinhos em risco

No final de semana, a barragem teve as comportas abertas, sem aviso, colocando a vida de ribeirinhos em risco, e prejudicando a pesca

Foto: Gabrielle Sodré / MAB

Comunidades dos municípios de São Félix e Cachoeira, no Recôncavo Baiano, foram pegas de surpresa com a abertura das comportas da Hidrelétrica de Pedra do Cavalo, administrada pelo Grupo Votorantim, na noite do último sábado (29).

A ação da empresa, que não teve nenhum aviso prévio, assustou os moradores com o barulho intenso da vazão da água e a total escuridão da hidrelétrica, já que as luzes da usina foram apagadas para impedir a documentação dos fatos.

A atividade da empresa colocou em risco a vida de pescadores que, neste horário, saem para o rio em busca do sustento de suas famílias. “Já estávamos acostumados com a água das turbinas abertas nos horários certos, eles mudaram os horários. Deveriam ter avisado a gente da abertura do vertedouro, eles têm meu contato. Eu ia sair pra pescar lá no pé da barragem, só não fui porque no outro dia é meu aniversário e minha filha falou que era pra eu ficar, aí só coloquei minha rede no rio. Perdi minha rede, duzentos metros de rede foram embora com a água, meu vizinho e meu irmão também perderam redes, não deu tempo da gente correr pra tirar. Eu podia ter morrido”, conta Seu Ginho, pescador de 62 anos.

Além do iminente risco de vida das pessoas, a abertura das comportas ocasionou prejuízos, barcos foram arrastados pela força da água, redes de pesca destruídas e animais ficaram ilhados.

No domingo (30), o Movimento dos Atingidos por Barragens reuniu-se com a comunidade do bairro 135 no município de São Félix e constatou que os direitos humanos daquela população estão sendo sistematicamente violados pela Votorantim, como afirma Moisés Borges, da coordenação do MAB.

“O que presenciamos aqui é mais um crime que a Votorantim comete contra a população atingida, e segue impune. Há um padrão histórico de violações na região, nos mesmos moldes do que foi publicado no relatório de 2010 do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana. Violações que se iniciaram na construção da barragem e permanece com a operação irregular da hidrelétrica”, afirma Borges.

Em 2010, o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana aprovou o relatório da Comissão Especial que, durante quatro anos, analisou denúncias de violações de direitos humanos no processo de implantação de barragens no Brasil. A Comissão identificou, nos casos analisados, um conjunto de 16 direitos humanos sistematicamente violados.

Na avaliação do MAB, a barragem de Pedra do Cavalo segue violando 16 direitos, sendo três destacados com o ocorrido do último sábado (29): o direito à informação e participação; o direito ao trabalho e a um padrão digno de vida e o direito a um ambiente saudável e à saúde.

Barragem Pedra do Cavalo. Foto: Gabrielle Sodré / MAB

“Entramos em contato, eles (Votorantim) estão sempre com meias palavras, dizendo que não havia risco, que não precisava se preocupar. Nós queremos clareza da Votorantim e do INEMA do que realmente está acontecendo na barragem Pedra do Cavalo”, reivindica Marijane Oliveira, moradora do bairro 135.

“ A comunidade se mobilizou e eles vão ter que nos responder se essa barragem é segura ou não, sendo que nós ribeirinhos não tivemos vantagem nenhuma com essa usina. Pagamos água cara, energia mais cara ainda. Só trouxeram malefícios, nós tínhamos um rio próspero, os pescadores viviam dos peixes, hoje não tem peixe nem para comer, quanto mais pra vender”, relata Marijane.

O grupo Votorantim opera a Hidrelétrica desde 2009 de forma irregular, sem a licença ambiental necessária e com a conivência do INEMA (Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia) , órgão responsável por monitorar e fiscalizar irregularidades em empreendimentos desse tipo.

“O que podemos fazer para responsabilizar a Votorantim para que tenham mais clareza com a gente? Quando eles chegaram aqui, nós já estávamos, e desde o princípio da barragem que não houve respeito. Eles fazem o que bem querem, informam quando querem a população, e mesmo quando passam as informações, nós percebemos, porque não somos leigos, que é o mínimo. Eles não informam com clareza”, conclui a ribeirinha.

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