Especialistas explicam o processo de privatização da água em SP e suas consequências à população

O próprio nome já diz: SABESP, “Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo S/A.” S/A é a abreviação do termo “Sociedade Anônima”, forma jurídica de constituição de empresas […]

O próprio nome já diz:

SABESP, “Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo S/A.”

S/A é a abreviação do termo “Sociedade Anônima”, forma jurídica de constituição de empresas na qual o capital está dividido em ações que podem ser transacionadas livremente, prevendo a obtenção de lucros a serem distribuídos aos acionistas. Ou seja, a SABESP, é comandada pelo governo do estado, mas na verdade é uma empresa de capital aberto e de economia mista. Sendo que 50,3% de suas ações são controladas pelo governo, na figura de Geraldo Alckmin, e  47,7% estão nas mãos dos acionistas, estes são em parte nacionais e em parte estrangeiros, pois atualmente, as ações da SABESP são negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) e, também na Bolsa de Valores de Nova York (NYSE). 

 *Foto divulgação NYSE              

Estimativas feitas através de um relatório divulgado em março de 2014 pela própria SABESP apontam que, entre 2003 e 2013, cerca de um terço do lucro líquido total da companhia foi repassado aos acionistas. O montante é da ordem de R$ 4,3 bilhões, o dobro do que a Sabesp investe anualmente em saneamento básico. Um rápido comparativo revela que com este valor, seria possível bancar cerca de 10 milhões de caminhões pipas, cada um, com 10 mil litros de água. Segundo Gabriel Gonçalves, membro do Coletivo de Luta Pela Água, esse é o ponto chave para entendermos a crise no abastecimento em SP.

“O povo está sem água e os acionistas estrangeiros estão nadando em dinheiro, a água hoje é negociada sem nenhum tipo de fiscalização, como uma simples “commoditie”, sobretudo no mercado internacional. A SABESP, teve um lucro absurdo, cerca de R$1,9 bilhão de reais nos anos de 2012 e 2013 e deve ter um lucro, em 2014, da ordem de R$ 900 milhões apesar da crise”, aponta Gabriel.

Grandes consumidores de água

Segundo Liciane Andrioli, coordenadora do MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens)  o processo de privatização/corrupção é amplo e envolve ainda outras instâncias, por exemplo os acordos firmados com as grandes empresas consumidoras. “Sabemos que a SABESP fornece descontos e incentivos para diversas empresas privadas que consomem muita água, é um processo claro de mercantilização deste, que é o direito humano mais básico de todos”.

Em um documento obtido e revelado pelo jornal El País, em fevereiro deste ano, vemos claramente esse processo descrito por Liciane, inclusive revelando os nomes dos grandes clientes. Ao todo são 294 empresas que recebem descontos nas tarifas. 
De acordo com o El País, o contrato vigente com os grandes consumidores premia o consumo, pois quanto mais água usar, menor será o preço pago por litro. O Shopping Eldorado, na zona oeste de SP, por exemplo,  tem um desconto de 55% no valor pago por cada mil litros de água (R$ 6,27). A Viscofan, fábrica de celulose na zona sul da capital paulista, tem um desconto ainda maior, de 75%, e paga apenas R$ 3,41 para cada mil litros de água consumidos. 

 * Vitor Teixeira              

A lista inclui ainda diversos veículos de comunicação, shoppings (Higienópolis, Villa Lobos), clubes (Esporte Clube Pinheiros, Clube Hebraica), empresas de cosméticos (Colgate, Palmolive, Avon), condomínios privados e até mesmo hospitais particulares (Albert Einstein).

“Para estes grandes clientes e acionistas, temos certeza que a água não falta. Como sempre o povo é penalizado, com racionamentos, taxas abusivas e má qualidade no abastecimento, isso tudo para garantir os altos lucros dos “donos da água”. Não podemos pensar que a culpa é do povo, ou da falta de chuva. Devemos lutar, pois água não é mercadoria”, conclui Liciane.      

Emenda Constitucional pela reestatização da SABESP

No último dia 24 (de fevereiro), uma “Proposta de Emenda Constitucional” (PEC) foi apresentada à mesa da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. A proposta da emenda diz respeito a chamada “reestatização” da Sabesp, ou seja, uma alteração na constituição afim de torná-la 100% pública. A proposta foi apresentada pelo líder da bancada do PT, Deputado João Paulo Rillo.

Dentre os argumentos utilizados como justificativa está o alinhamento da Constituição do Estado de SP aos princípios da Constituição Federal de 1988, especificamente, a Lei Nacional de Saneamento Básico na perspectiva da garantia da universalização do acesso aos serviços de saneamento, conforme resolução da ONU aprovada em 2010, na qual declara que o acesso à água limpa e segura e ao saneamento básico são direitos humanos fundamentais.

Para a PEC ser protocolada são necessárias 32 assinaturas. Hoje a bancada de oposição soma 24 parlamentares: 21 do PT, 1 do PSOL e 2 do PCdoB. Após ser protocolada, a PEC precisa ainda passar por dois turnos de votação, nestes, arrecadando 57 votos.  

Ato público de Luta pela Água!

Na próxima sexta, 20 de março, se realizará o Ato de Luta pela Água, com concentração a partir das 14h30, no vão livre do Masp, na Avenida Paulista nº 1578, na capital. A iniciativa é do Coletivo de Luta pela Água, criado em janeiro e que agrega quase 90 entidades, entre as quais organizações não governamentais, técnicoas e especialistas do setor, representantes dos movimentos sociais e sindical, como a Central Única dos Trabalhadores de São Paulo (CUT/SP). 

 

por Bruno Ferrari, do coletivo de comunicação do MAB

 

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