A crise da água e a sede dos tucanos
Você ainda não percebeu a falta de água em São Paulo? Talvez, porque não more na periferia da cidade ou então não esteja tomando banho com muita frequência. Mas muito […]
Publicado 15/05/2014
Você ainda não percebeu a falta de água em São Paulo?
Talvez, porque não more na periferia da cidade ou então não esteja tomando banho com muita frequência. Mas muito em breve, certamente vai perceber.
Imagem da internet
De qualquer maneira, São Paulo vive hoje uma das mais caóticas crises no abastecimento de água de toda sua história. O governo estadual, do PSDB, na figura do tucano Geraldo Alckmin tenta negar, mas é fato: grande parte dos bairros periféricos já sofrem com racionamento noturno de água, alguns outros sofrem com o chamado revezamento, com água, dia sim, dia não.
“Entre 21h e 22h já não sai mais água da torneira, nem do chuveiro. As pessoas não têm condições nem de tomar um banho após um longo dia de trabalho. A situação está muito complicada”, aponta Maria Fernanda, moradora da região da Barra Funda.
O Sistema Cantareira, principal fonte de abastecimento da região metropolitana de São Paulo, atualmente, tem operado com cerca de 8,4% de sua capacidade total. Esse nível vem sendo reduzido gradativamente de forma preocupante nos últimos anos.
Porém, para entendermos as origens da crise da água, devemos antes entender a lógica que envolve essa sujeira toda.
Em São Paulo, a grande empresa que mantém o monopólio da água chama-se “SABESP”. Vamos conhecer um pouco da sua história.
SABESP, “Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo S/A.”
(S/A: abreviação do termo “Sociedade Anônima”, forma jurídica de constituição de empresas na qual o capital social não se encontra atribuído a um nome específico, mas está dividido em ações que podem ser transacionadas livremente, sem necessidade de escritura pública ou outro ato notarial, prevê a obtenção de lucros a serem distribuídos aos acionistas).
Ou seja, a SABESP, é uma empresa privada, de capital aberto e de economia mista. Suas ações são negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) e, acreditem se quiser, na Bolsa de Valores de Nova York (NYSE).
E vocês sabem quem é o principal acionista da SABESP?
O Governo do Estado de São Paulo, claro.
Portanto, há tempos a água passou a ser tratada como uma simples “commoditie”, negociada sem nenhum tipo de fiscalização, inclusive no mercado internacional, gerando lucros absurdos, como no caso da SABESP, que tem um lucro anual que beira os R$1,9 bilhão de reais.
O lucro da companhia vai muito bem, em constante evolução, parece bem diferente da preocupação com os investimentos em infraestrutura.
A companhia foi criada em junho de 1973, ou seja, durante a Ditadura Militar.
Segundo Adriano Diogo, Deputado Estadual, ex-preso político e atual presidente da Comissão da Verdade no estado de São Paulo, a SABESP e a grande maioria das outras companhias de saneamento básico, ainda são resquícios do período militar.
” Grande parte destas companhias e também a SABESP foram criadas por figuras como Paulo Salim Maluf, Reynaldo de Barros, Laudo Natel, durante o período da ditadura. Eles desenvolveram essas novas companhias, desapropriando as que já existiam e, com isso, criaram novas taxas como, por exemplo, a “tarifa de esgoto”, um absurdo que é cobrado até os dias de hoje”, afirma Adriano.
A questão da taxa de esgoto é extremamente contraditória e já foi contestada até mesmo por meio de ações judiciais. Por falar nisso…
Ações no Ministério Público contra a SABESP
No final de 2012, o Ministério Público moveu uma ação judicial contra a SABESP, pedindo uma indenização de R$ 11,5 bilhões. A ação envolve diversas acusações, a principal delas diz respeito ao “lançamento” de esgoto sem tratamento adequado nos rios e represas da Região Metropolitana de São Paulo.
Segundo João, ex-funcionário da companhia, essa é uma prática comum.
“É normal jogar esgoto em pequenos córregos da cidade, sem nenhum tipo de tratamento. Para isso, eles se baseiam no estatuto da SABESP, que em um de seus artigos prevê o “afastamento do esgoto”, não o tratamento. Sempre questionei essas pontos enquanto funcionário, deve ser por isso que fui demitido”, afirma João.
Os R$11,5 bi foram calculados com base na indenização ambiental e ao patrimônio público causados pelo despejo de esgoto in natura.
O Ministério Público também pede na ação civil pública que a Justiça obrigue a SABESP a providenciar a coleta e tratamento de esgoto em toda a Região Metropolitana de São Paulo até 2018, sob pena de multa diária.
Sobre a crise deste ano, o MP quer que o racionamento seja instituído de forma oficial no estado. A falta de prestação de contas sobre o caso pode resultar em uma ação de improbidade administrativa contra o governador Geraldo Alckmin.
A questão do DESPERDÍCIO
O Governo do Estado de São Paulo (tucanos), criaram uma “proposta” para tentar amenizar a situação da crise. A ideia é aplicar uma “multa” aos consumidores que apresentarem aumento no consumo mensal de água, de modo a punir e evitar o desperdício. O valor da multa seria de 30% em relação ao valor da conta.
Se essa medida absurda fosse adotada, o próprio Palácio dos Bandeirantes, sede do governo, seria multado, pois apresentou aumento de consumo nos últimos meses.
Criando campanhas do tipo “Economize Água”, “Seja consciente”, o governo e a SABESP tentam jogar a culpa para o povo, para os consumidores, como se a culpa do racionamento fosse do desperdício residencial.
O que pouco se fala é a respeito da quantidade de água consumida pelas grandes indústrias, como por exemplo, do setor têxtil, que consome por ano, cerca de 20 bilhões de litros apenas com “tingimentos de roupas”.
Outro ponto ignorado diz respeito aos desperdícios que ocorrem dentro da própria SABESP. Segundo dados da própria companhia, cerca de 25% da água tratada é desperdiçada na rede de distribuição antes mesmo de chegar aos consumidores.
A luta
Na última terça-feira (13), movimentos sociais, centrais sindicais e parlamentares se reuniram na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, em um Seminário para discutir a Crise da Água.
O Movimento dos Atingidos por Barragens também estava presente, representado pela coordenadora nacional Liciane Andrioli, que participou do debate ao lado do deputado João Paulo Rillo (PT), o ex-prefeito de Diadema Mario Reali, o presidente da CUT-SP, Adidos Santos Lima e o coordenador da Central de Movimentos Populares (CMP), Eduardo Cardoso.
Foram discutidos temas relacionados aos impactos sociais causados pela crise da água no que diz respeito ao emprego, meio ambiente e energia.
Segundo Liciane, o processo de privatização causa impactos altamente danosos, precarizando o trabalho e os serviços prestados a população.
“Pra nós, a água deve estar a serviço da população, pois é um bem público. Porém nesse sistema capitalista, nesse governo de direita que temos aqui em São Paulo, a água não passa de uma mera mercadoria. Isso justifica tudo, por isso, não há interesse de investimento, de tratamento, distribuição e por isso a SABESP é privatizada. Ela não atende a população, mas sim aos acionistas, e sobretudo as grandes empreiteiras, que, muitas vezes, são as mesmas envolvidas na construção das barragens”, avalia Liciane.
Jadir, coordenador estadual, também fez uma fala e brincou:
“O governo está “tucanando”a crise. Eles já estão chamando o racionamento de “stress hídrico”. Eles dizem para o povo rezar pra São Pedro, já rezamos, mas acho que essa causa ele não vai atender, porque esse governo não é de Deus não”, provocou o militante e músico do MAB.
De lá, foram tirados alguns encaminhamentos importantes. Foi proposto um grande ato, reunindo as entidades do movimento popular e sindical e os próprios parlamentares, lutando lado a lado, pela defesa da água no estado de São Paulo.
Água e Energia não são mercadorias!