Mundurukus reafirmam luta contra barragens no Tapajós

Indígenas exigem que a regulação da Consulta Prévia determinada pela OIT seja realizada antes dos estudos de viabilidade das barragens e cobram maior respeito do Governo Federal Cerca de 200 […]

Indígenas exigem que a regulação da Consulta Prévia determinada pela OIT seja realizada antes dos estudos de viabilidade das barragens e cobram maior respeito do Governo Federal

Cerca de 200 lideranças do povo indígena Munduruku se reuniram entre os dias 23 e 25 de abril na Aldeia Sai Cinza, município de Jacareacanga, oeste do Pará, para apontar possíveis ações diante da ameaça da construção de sete barragens na bacia do rio Tapajós. Além disso, as lideranças debateram sobre a consulta prévia determinada pela Convenção 169, instrumento internacional que trata dos direitos dos povos indígenas e tribais, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o governo se compromete, depois de inúmeras denúncias de desrespeito, a regulamentar com as populações da região.

Durante os primeiros dois dias, dezenas de caciques, guerreiros e outras lideranças representando 123 aldeias debateram, em língua Munduruku, o conjunto dos problemas que afetam os mais de 12 mil indígenas da bacia do Tapajós, entre infra-estrutura precária nas aldeias, falta de acesso à saúde e educação, conflitos relacionados à garimpagem, além dos impactos que a possível construção do Complexo Tapajós poderá ocasionar para 16 aldeias, atingidas total ou parcialmente, inviabilizando a caça, a pesca, além de alagar diversos lugares sagrados.

Foi unânime o repúdio à Operação Tapajós, que desde o final de março reúne cerca de 250 membros do Exército, da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal e da Força Nacional de Segurança Pública, com o objetivo de garantir o avanço dos estudos técnicos no período de cheia máxima do rio. Depois de uma breve vitória, com a liminar expedida no dia 16 de abril que suspendeu a expedição e exigiu a consulta prévia de indígenas e comunidades ribeirinhas que podem ser afetadas, a Operação continua por força de outra liminar expedida no dia 23, que derrubou a anterior.

Em relação à consulta prévia, um direito das populações indígenas e tribais de serem consultadas sobre qualquer intervenção em seus territórios, determinada pela Convenção 169 da OIT, os presentes exigiram que a regulamentação seja feita antes dos estudos de viabilidade das barragens. Apesar de ser signatário desde 2003, o informe da Comissão de Peritos da OIT divulgado este ano, mostrou diversas situações nas quais o direito à consulta foi desrespeitado no país.

 

Governo rompe compromisso e não se reúne com indígenas

Embora acordado anteriormente que o terceiro dia de encontro contaria com a presença do Governo Federal, os representantes da Secretaria Geral da Presidência da República chegaram à cidade de Jacareacanga acompanhados de forte aparato policial e se negaram a comparecer à aldeia Sai Cinza, com a justificativa de que o encontro estava previsto para acontecer na cidade e não na aldeia, e que, por isso, não queriam correr riscos.

A coordenação da Associação Indígena Pusuru, organizadora do encontro, repudiou a atitude e apresentou um documento onde confirmava que desde o início a aldeia foi o local acertado. A Associação também negou a acusação de que haveria violência e que eles fariam os representantes do governo reféns na Sai Cinza, conforme ameaça que teria sido veiculado pela internet.

Ao final do encontro foi aprovada uma Carta ao governo brasileiro e à sociedade em que os Mundurukus exigem “que o governo pare de tentar dividir e manipular, pressionando individualmente nossas lideranças… Somos um povo só, todas as nossas decisões são sempre coletivas e nós expressamos sempre através das associações”. Também reafirmam que eles não querem guerra e sim a paz e por isso exigem a saída das tropas da região. “A partir de agora, exigimos que todos os encontros e reuniões com o governo sejam sempre acompanhados pela procuradoria do Ministério Público Federal do Pará. Queremos que nossa posição sobre a barragem seja respeitada e que o governo regulamente a consulta prévia aos povos indígenas como manda a Convenção 169 da OIT, tudo isso antes de qualquer decisão, estudo ou construção de barragem”.

Para fortalecer as decisões do encontro, na sexta-feira (26) os Mundurukus fizeram uma caminhada na cidade Jacareacanga onde reafirmaram o compromisso com a mobilização, a resistência e a cobrança permanente de que seus direitos constitucionais devem ser respeitados.

 

Aliança na luta contra as barragens

Diversas organizações entre conselhos, ONGs e movimentos sociais estavam presentes no encontro prestando assessoria e reafirmando seu apoio à luta contra as barragens.

Thiago Alves, membro da direção estadual do Movimento dos Atingidos por Barragens, falou sobre as origens da luta dos atingidos no Brasil, as diversas conquistas alcançadas pela luta dos atingidos organizados e os desafios para o próximo período. “Estamos propondo uma aliança de luta entre todos aqueles que querem uma Amazônia para o povo: indígenas, ribeirinhos, pescadores, agricultores e população urbana, que devem se reunir para juntos construir uma alternativa de desenvolvimento que respeite os direitos humanos e preserve a natureza. Precisamos aprender com vocês e sua longa história de luta para construirmos uma aliança duradoura”, afirmou.

Também estavam presentes a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Greenpeace, a International Rivers, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), representantes do Departamento de Antropologia e Arqueologia da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), da Rádio Rural de Santarém e do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (CITA), que representa 7.500 indígenas de 12 povos do baixo Tapajós.

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| Publicado 21/12/2023 por Coletivo de Comunicação MAB PI

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