Foz do Chapecó: Terras alagadas, direitos não reconhecidos

De São Paulo, da Radioagência NP, Danilo Augusto Em maio deste ano, aproximadamente três mil famílias de 13 municípios do estado do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina […]

De São Paulo, da Radioagência NP, Danilo Augusto

Em maio deste ano, aproximadamente três mil famílias de 13 municípios do estado do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina tiveram que deixar suas casas. O motivo: suas terras foram alagadas pelas águas do Rio Uruguai, que subiram por causa da Usina Hidrelétrica Foz do Chapecó. A empresa responsável pela obra, a Foz do Chapecó Energia S.A., reconheceu que pouco mais de 2,4 mil famílias seriam atingidas pelo empreendimento, porém, de acordo com o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o número não confirma a realidade.

Dentre essas famílias, a situação de oito delas chama a atenção. Isso porque, foram alojadas, há quatro meses, em um ginásio de esportes da Prefeitura de Rio dos Índios, região do Alto Uruguai, no Rio Grande do Sul. Desde então, as famílias, que podem ser despejadas do local a qualquer momento, ainda não receberam qualquer indenização da empresa. O trabalhador Milto Girelli, um dos 24 moradores do ginásio, sendo oito deles crianças, relata como foi o processo de despejo das casas atingidas pela empresa.

“Estávamos morando em nossas terras, aí chegaram com ordem judicial, demoliram nossas casas, jogaram nossas mudanças na rua e nos deixaram lá. Fomos tratados como bandidos.”

Segundo Milto, as dificuldades são grandes. Ele espera que a situação seja resolvida o mais brevemente possível.

“Não estamos querendo nada que não nos pertence. Só queremos nossos direitos. Tínhamos onde morar e onde viver e agora estamos na ‘rua’. Nossa situação é de calamidade, tem dias que não temos nada para comer.”

Versão da empresa

Em nota, a empresa Foz do Chapecó Energia afirma que as “famílias alojadas no ginásio não fazem parte do público atingido pela usina”. E que “as indenizações e benefícios oferecidos pela empresa foram direcionados aos moradores que fossem proprietários de terras atingidas e posseiros de boa fé de terras atingidas.”

De acordo com o diretor superintendente da Foz de Chapecó, Paulo Eduardo de Almeida, Godói, as famílias são frutos de um problema social e a empresa está cumprindo com suas obrigações e atribuições.

“Não temos nenhuma responsabilidade. Eles não são proprietários de terra e nunca foram. Essas famílias não foram atingidas diretamente pelo reservatório da usina. Nenhuma das pessoas preenche qualquer um dos requisitos que foram estabelecidos. Elas são de fato problema social da região. Por isso não vamos assumir um problema social que não é nosso.”

Prefeitura

O prefeito de Rio dos Índios, Valdemar Veloso Batista (PDT), estranha a postura da empresa. Ele relata que, inicialmente, a Foz de Chapecó fez até mesmo uma proposta para as famílias, que por vários motivos foi negada. Ele afirma que, se a empresa não tivesse nenhuma responsabilidade, não teria sentido tentar fazer acordo de reconciliação com as famílias.

Ele ainda relata que o município perdeu mais de 500 moradores por causa da hidrelétrica, fato que vai gerar problemas até mesmo com arrecadação. Ao final, ele afirma que a Prefeitura não tem condições de manter as famílias no ginásio e que está sofrendo pressão dos munícipes. O ginásio é o único lugar de lazer da cidade que conta com pouco mais de 4 mil habitantes e está inativo por causa do problema.

“Agora fica muito fácil para a Foz de Chapecó dizer que é um problema do município. Não foi um problema gerado pela Prefeitura. A Prefeitura não desapropriou ninguém; não desapropriou terrenos e nem terras. Pelo município, estariam todos tranquilos nas suas terras. A situação está bem ruim aqui. Veja, eles moravam na beira do rio, local que foi atingido e que já está submerso. Sabendo disso, procuramos todos os meio para fazer um acerto para essas pessoas permanecerem no município, mas não está sendo possível. A Prefeitura, por se tratar de um município pequeno, não dispõe de recursos para ficar mantendo essas pessoas na totalidade.”

Modelo nacional

Para o integrante da coordenação do MAB na região, Pedro Eluis Nilchiurs, a prática de não reconhecimento de famílias atingidas por esses grandes projetos é comum entre essas empresas que geram energia. Ele também lembra que mais de 60 famílias tiveram ordem de despejo e diz que é irregular a forma que é definida se uma família é ou não atingida por uma hidrelétrica.

“É arbitrária a forma como a empresa determina qual o conceito de atingido, qual a área atingida e qual o próprio direito do atingido. Então, o MAB sempre denuncia que essa é uma prática das empresas ligadas à indústria da geração de energia, que usam dinheiro público para praticamente expulsar as famílias de suas terras. É uma falta de respeito da empresa que tenta empurrar os problemas para cima dos órgãos públicos, seja na esfera federal, estadual e até municipal”.

A Usina Hidrelétrica Foz do Chapecó tem um faturamento de R$ 60 mil por hora. O contrato de concessão da empresa é de 35 anos, com funcionamento de 24 horas por dia. 75% dos custos da construção, que corresponde a R$ 1,65 bilhão, vieram do BNDES. A Foz do Chapecó Energia S.A. é formada em sociedade pela Camargo Correia e pela Chapecoense Geração.

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| Publicado 21/12/2023 por Coletivo de Comunicação MAB PI

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