Violência contra indígenas desgasta relação do Brasil com órgãos internacionais de Direitos Humanos

Por Leonardo ManffréNo ano de 2014, 138 índios foram assassinados, segundo relatório do Cimi. Nos dias 20 e 21 de outubro, na sede da OEA, em Washington, os indígenas foram […]

Por Leonardo Manffré
No ano de 2014, 138 índios foram assassinados, segundo relatório do Cimi.


Nos dias 20 e 21 de outubro, na sede da OEA, em Washington, os indígenas foram o foco em duas de três audiências da Comissão Interamericana de Direitos Humanos que tiveram o Brasil como tema.  A CIDH é um braço da OEA, Organização dos Estados Americanos, e contribui na promoção e proteção dos direitos humanos no continente americano.  

As denúncias se baseiam principalmente na violência contra povos indígenas no interior do Mato Grosso do Sul, onde os índios da etnia Guaraní Kaiowá sofrem com a violência e a falta da demarcação de terras. A função das audiências é denunciar as violações e pressionar internacionalmente o Estado brasileiro para discutir medidas e adotar políticas públicas relativas ao tema.

Na oportunidade, as organizações responsáveis e lideranças indígenas apontaram o Estado brasileiro como conivente com a violência e o “genocídio” dos índios no país. Também foi lançada, no dia 21, a versão em inglês do relatório Violência Contra os Povos Indígenas – dados de 2014, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Nele consta que, no Brasil, em 2014, aconteceram 138 assassinatos e 135 casos de suicídios de índios. Só no estado do Mato Grosso do Sul foram 41 assassinatos e 48 suicídios. Os motivos principais apresentados são conflitos com proprietários de latifúndios na região.

Laura Waisbish, assessora do Programa de Política Externa e Direitos Humanos da Conectas, quando indagada se o Brasil tem sido irresponsável na questão indígena, responde ironicamente. “Você quer que eu afirme que ele [Estado brasileiro] tem sido irresponsável, né?”. Logo depois, de maneira séria, afirma que ele tem sido omisso nessa questão. “O Brasil é um Estado complexo, mas a questão indígena tem sido negligenciada e a gente vê esses resultados aqui. Tem um número crescente de lideranças  que são mortas. A violência contra indígenas, para além de toda a questão de terem o direito a suas terras serem demarcadas pelo executivo, para além do estrago cultural e ambiental, é uma pedra no sapato do Brasil como Estado”.

Nos últimos anos o Brasil vive uma tentativa de reconciliação com a Comissão Interamericana de Direitos Humanos – CIDH. Após desentendimentos diplomáticos em 2011, o Ministério de Relações Exteriores brasileiro retirou o então representante da organização em represália à cobrança da entidade para que o Brasil suspendesse o licenciamento de obra da Usina de Belo Monte, no Pará.

Entre essas recomendações estavam principalmente as que se referiam aos impactos causados ao meio ambiente e aos povos indígenas da região, e pediam uma consulta “prévia, livre, informada, de boa-fé e culturalmente adequada” com cada umas das comunidades afetadas pela obra. Também determinava que o país adotasse medidas vigorosas para proteger a vida e a integridade dos indígenas isolados na bacia do Xingú, cuja presença foi reconhecida pelo próprio Estado Brasileiro. Confira o documento, assinado pela CIDH.

Na época, o governo classificou essas avaliações e medidas cautelares do órgão como “precipitadas e injustificáveis”, retaliou a organização e declarou que o Sistema não tinha competência de exigir isso do Brasil, sobretudo em projetos de grande montante e valor estratégico, como projetos de desenvolvimento. Desde lá o país também parou de contribuir financeiramente com o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, SIDH, e vem sendo cobrado por isso.

Para Laura “a relação com o Sistema é uma relação de tensão, sempre é, sempre foi e provavelmente sempre será. Em 2011 foi Belo Monte o tema de tensão, mas sempre haverá outros”. A assessora diz que o que se espera hoje do Estado brasileiro é que “esteja à altura das responsabilidades, de tratar com maturidade essas tensões e acreditar num sistema que pode trazer melhorias internas”.

Nos últimos anos o governo brasileiro busca diplomaticamente a reaproximação com os órgãos internacionais de defesa de direitos humanos. O novo embaixador na OEA, José Luiz Machado e Costa, foi nomeado ainda neste ano. O país se encontra em um momento no qual, depois de 4 anos, retoma suas relações com o Sistema Interamericano de Direitos Humanos e outras organizações internacionais. Porém, o país não cumpre metas, não contribui financeiramente com o órgão e se esquiva de cobranças internas.

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| Publicado 21/12/2023 por Coletivo de Comunicação MAB PI

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