Codevasf assina termo de acordo com o MAB em Montes Claros

Nesta quarta-feira (27), ocorreu na Casa Pastoral Santo Antônio, em Montes Claros, audiência pública para discutir os Projetos de Gorutuba e Jequitaí. Estiveram presentes aproximadamente 150 atingidos por barragens da […]

Nesta quarta-feira (27), ocorreu na Casa Pastoral Santo Antônio, em Montes Claros, audiência pública para discutir os Projetos de Gorutuba e Jequitaí. Estiveram presentes aproximadamente 150 atingidos por barragens da região e de outros dois estados, São Paulo e Bahia, além de representantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Levante Popular da Juventude, Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos de MG (CONEDH), e Companhia Nacional de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (CODEVASF).

O evento teve o objetivo de reafirmar a importância de diálogo permanente com a CODEVASF, responsável pelos projetos de Gorutuba e Jequitaí, onde se comprovaram diversas violações dos direitos da população, anteriormente constatadas em documento do Conselho de Defesa dos Direitos Humanos da Secretaria Estadual Minas Gerais.

A audiência denunciou os conflitos gerados em decorrência dos projetos. “Chegaram lá o povo da CODEVASF com um oficial de justiça e derrubaram nossa casa sem nenhuma consulta ou justificativa. Mas agora eu pergunto, porque não derrubam as mansões que tem na beira do canal? Os grandes sempre tem prioridade, a gente não. Hoje nós não temos para onde ir, perdemos tudo”, relatou Marlete, moradora da Vila dos Goianos, comunidade atingida pelo Projeto Gorutuba. A derrubada das casas ocorreu em outubro do ano passado.

Outro ponto destacado na audiência foi o direito de acesso à água, historicamente violado. Houve muitos relatos de famílias da região sobre a privação do uso e dos altos preços das tarifas da água.

Entretanto, a CODEVASF se eximiu, em diversos momentos, da responsabilidade sobre as violações cometidas em decorrência dos projetos. “Nós somos um órgão executor do governo, o patrão da CODEVASF é o governo, nós só executamos as políticas”, afirmou Athadeu Ferreira, representante da empresa.

Por outro lado, o MAB cobrou da CODEVASF uma posição em relação aos conflitos. “É evidente a culpa desta empresa na violação dos direitos das famílias atingidas; hoje conseguimos um primeiro passo para o avanço na pauta das nossas reivindicações”, ressaltou Moisés Borges, da coordenação nacional do MAB.

Por fim, foi assinado termo de acordo entre o MAB, a CODEVASF e as organizações presentes, no qual a empresa se compromete a analisar a pauta de reivindicações e apontar soluções para os problemas junto aos atingidos.

 

Projeto Gorutuba

Grande parte das regiões por onde passa o Velho Chico sofre pela seca. Na bacia do Vale do São Francisco já existem cerca de 50 perímetros irrigados, extensões de terra no meio do sertão mantidas por canais de irrigação. Mas, na maioria das vezes, beneficiando uma pequena parcela da população e desrespeitando a proposta de convivência consciente com o sertão. O Distrito Irrigado de Gorutuba é um exemplo dessa tendência que já está em prática há alguns anos.

Gorutuba é o nome de um quilombo que foi expulso de suas terras, para ceder lugar ao projeto elaborado nos anos 40, com o discurso de incentivar pequenos e médios agricultores. Entretanto, entre 1978 e 1979, quando a Barragem do Bico da Pedra foi construída, foram retiradas à força centenas de famílias que viviam nas áreas alagadas.

A obra possibilitou o escoamento da água por uma ramificação de canais com 103 quilômetros de extensão utilizados como irrigação para agricultura. As áreas irrigadas que deveriam contribuir no combate à seca e como incentivo a pequenos produtores foram arrendadas à Banavites e Uvale, empresas de monocultoras de banana e uva, respectivamente.

Mas após um longo período de exploração da terra e da água, estas empresas decretam falência no ano de 1992, deixando uma grande dívida pendente com o Estado. Com isso, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (CODEVASF), empresa pública federal que assume o projeto, loteia e vende, na sua maioria, para os próprios colonos que haviam sido expulsos de suas terras, uma década antes, para a construção da barragem.

PELO BEM COMUM FIM DO K1, PELO FEIJÃO COM ARROZ FIM DO K2

E, após de comprar a própria terra, a população ainda está pagando a titulação, mais de 20 anos depois, a dívida deixada pelas empresas Banavites e Uvale. Além disso, os colonos ainda são cobrados por mais três tarifas: o k1, tarifa federal destinado à CODEVASF referente ao reembolso dos custos da obra que já foi construída há mais de 30 anos; o k2, tarifa referente ao consumo da produção; e a tarifa, referente ao consumo humano, paga à Companhia de Abastecimento do São Francisco (COPASA).

Para Moisés Borges, da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a cobrança das tarifas da água não pode continuar. “É um absurdo as mesmas famílias expulsas terem que comprar novamente suas terras, pagar pelos custos da obra responsável por seu sofrimento, sofrer com os agrotóxicos dos latifúndios de banana pulverizados por avião e ainda pagar pela água que é um direito de todos”, esclarece Moisés.

A CODEVASF mantém ainda um projeto que pretende fechar o canal e colocar medidores nas tubulações com a justificativa de impedir perdas técnicas, mas, para o MAB, é mais uma forma de impedir o acesso à água à população do entorno. Os atingidos exigem participar de todo o processo da elaboração e possível implantação do projeto.

Além disso, no ano passado, a CODEVASF derrubou 4 casas na Vila Goianos, justificando-se que as margens do canal são áreas de preservação ambiental. Entretanto, nenhuma propriedade de banana, por exemplo, foi desapropriada. A desocupação aconteceu sem nenhuma documentação e ou consulta às famílias desapropriadas.

 

Projeto Jequitaí

No extenso São Francisco e sub-bacia Jequitaí, o projeto da barragem de Jequitaí é apresentado para a capitação de água, com objetivo de irrigação das terras do agronegócio do semiárido mineiro. A construção atingirá os municípios de Claro dos Poções, Engenheiro Navarro, Francisco Dumont, Jequitaí, Lagoa dos Patos e Várzea da Palma.

A CODEVASF conseguiu, segundo depoimento do representante na audiência, a aprovação do licenciamento para instalação. Sua capacidade de acumulação será de 786 milhões de m³, quantidade que deverá abastecer o meio urbano e rural em torno de 19 municípios, equivalente a uma população de 147.000 pessoas. Sua área irrigada será de 35 mil hectares. As principais culturas na região onde a barragem será construída são de abacaxi, algodão, alho, arroz, banana, feijão, manga, melão, milho, tomate e uva.

“Serão milhares de famílias atingidas pelo empreendimento, com isso exigimos a negociação coletiva do projeto, além da apresentação pela CODEVASF de um diagnostico sério para as famílias atingidas, com cadastro socioeconômico e revisão das indenizações já feitas”, concluiu Moisés. 

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| Publicado 21/12/2023 por Coletivo de Comunicação MAB PI

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