Marcha dos povos indígenas mobiliza Belém e reforça defesa dos territórios 

Ato reuniu povos de várias regiões na luta pela demarcação, pela vida e pela Amazônia

Marcha dos Povos Indígenas ocupa Belém e reforça: não há justiça climática sem territórios protegidos e sem a liderança dos povos originários. Foto: Rafael Zãn / MAB
Marcha dos Povos Indígenas ocupou Belém e reforçou que não há justiça climática sem territórios protegidos e sem a liderança dos povos originários. Foto: Rafael Zãn / MAB

A capital paraense viveu um dia histórico, na última segunda-feira (17), com a Marcha dos Povos Indígenas, que coloriu as ruas de Belém em defesa dos territórios, da demarcação e da vida dos povos originários. O ato começou na Aldeia COP, espaço de articulação indígena durante a COP 30, e seguiu em caminhada firme até o Bosque Rodrigues Alves, onde o encerramento reuniu cantos, rituais e pronunciamentos de lideranças de vários povos.

Ainda cedo, as delegações começaram a se organizar com pinturas, maracás, cantos e rezas. Por volta das 09h da manhã, o cortejo tomou as avenidas centrais da cidade, formando uma longa aldeia em movimento. Povos Xikrin, Munduruku, Karipuna, Kaiowá, Tupinambá, Baré, Apinajé, Makuxi e muitos outros fizeram ecoar pela cidade o grito que exige demarcação já, proteção territorial e respeito às comunidades. Entre as lideranças presentes, destacou-se Ronaldo Amanayé, que fez uma avaliação firme do momento político vivido pelos povos:

Ronaldo Amanayé, liderança indígena. Federação dos Povos Indígenas do Estado do Pará (FEPIPA). Foto: Rafael Zãn / MAB
Ronaldo Amanayé, liderança indígena. Federação dos Povos Indígenas do Estado do Pará (FEPIPA). Foto: Rafael Zãn / MAB

“A marcha global pelo clima, realizada pelos povos indígenas do Brasil e do mundo, tem como principal objetivo mostrar a realidade e a importância dos nossos povos. É também o momento de reafirmar nossas reivindicações centrais: a demarcação e homologação dos nossos territórios, a proteção ambiental e territorial, o financiamento direto para nossas comunidades. Esses são alguns dos temas que estamos debatendo nos nossos painéis, na programação da COP e também na Blue Zone, onde seguimos externando essas pautas. Tudo isso para garantir aquilo que é obrigação do Estado brasileiro: demarcar, proteger e assegurar o bem-viver dos povos indígenas”.

Associação AIUE: mulheres indígenas na linha de frente 

A Associação Indígena Unindo Etnias (AIUE), de Manaus, marcou presença com a liderança de Norma Ferreira Chaves, que caminhou à frente de um grupo de mulheres, jovens e anciãs. A participação da AIUE simboliza a continuidade das lutas e a defesa radical do território como projeto de vida.

“Marchamos para preservar nossos povos indígenas, nossas mulheres guerreiras, nossos guerreiros, nossas parentas e parentes. Eu não marcho por um só, mas por todos. Marcho pela paz, pela preservação da natureza, pela felicidade que nasce nela e pela vitória que brota dela”.

Norma Ferreira Chaves, Associação Indígena Unindo Etnias (AIUE), de Manaus. Foto: Rafael Zãn / MAB
Norma Ferreira Chaves, Associação Indígena Unindo Etnias (AIUE), de Manaus. Foto: Rafael Zãn / MAB

Vozes da marcha: o grito que atravessa gerações 

A caminhada reuniu lideranças que reforçaram a espiritualidade, a resistência e a urgência da luta indígena. Entre elas, Voninho Kaiowá, do Mato Grosso do Sul, cuja presença chamou atenção pela energia e pela firmeza das palavras:

Voninho Kaiowá Guarani é defensor dos direitos dos povos Indígenas. Mato Grosso do Sul. Foto: Rafael Zãn / MAB
Voninho Kaiowá Guarani é defensor dos direitos dos povos Indígenas. Mato Grosso do Sul. Foto: Rafael Zãn / MAB

“Quero dizer aqui, durante a COP, a importância da nossa manifestação como povo indígena. A importância da nossa presença, da nossa participação nesse momento histórico que o Brasil vive. O grito que vocês ouvem é para dizer ao mundo que a resposta somos nós. Somos nós o único caminho para minimizar esse impacto global que está acontecendo e o impacto climático, a destruição e a falta de demarcação dos nossos territórios”.

O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) acompanhou todo o percurso, reforçando que a luta indígena é também a luta dos atingidos e atingidas: ambos enfrentam violações, perda de território, ausência de consulta e impactos causados por megaprojetos.

Durante o trajeto, militantes do MAB mantiveram diálogo com lideranças, movimentos e delegações. A bandeira se destaca entre grafismos corporais e instrumentos tradicionais. O movimento reforçou que a luta indígena é parte da luta por soberania territorial; não existe transição energética justa sem consulta e participação popular, e os impactos das barragens dialogam diretamente com os impactos vividos pelos povos originários.

Iury Paulino, da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens. Foto: Rafael Zan / MAB

“A marcha dos povos indígenas foi extremamente importante. Ela coroa uma semana inteira de lutas e mobilizações puxadas pela Cúpula dos Povos. Esse ato reafirma a centralidade da demarcação e da defesa da vida dos povos indígenas. E mostra que, sem os povos originários e os povos tradicionais, não haverá solução real para salvar o planeta. O MAB somou como parceiro da luta indígena, parceiro da luta pela justiça ambiental, e avaliamos que a participação dos atingidos neste processo é fundamental”, afirma Iury.

Chegada ao Bosque Rodrigues Alves: território vivo no coração da cidade 

Ao longo do percurso, estudantes, trabalhadores, turistas e moradores se juntaram à marcha. Belém não apenas assistiu, como também participou. Para o MAB, o ato é também um alerta ao Estado brasileiro: demarcação é dever, não concessão. A Marcha dos Povos Indígenas saiu da Aldeia COP, atravessou Belém e terminou no Bosque Rodrigues Alves, mas a luta que ela anuncia continua nos territórios onde a vida insiste em florescer, apesar de todas as ameaças.

Após atravessar ruas e avenidas, a marcha chegou ao Bosque Rodrigues Alves, onde o ato foi encerrado. O Bosque é um dos espaços verdes mais simbólicos de Belém e se tornou território indígena por algumas horas. Rodas de canto, rituais, denúncias, agradecimentos e a presença de crianças correndo entre as árvores deram tom ao encerramento. Lideranças denunciaram a demora na demarcação das terras, a violência crescente contra povos, a contaminação dos rios, o avanço de garimpo, desmatamento e petróleo. Anciãos conduziram rituais para proteger a floresta e fortalecer os espíritos dos lutadores e lutadoras.

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