A burguesia fede

Nos últimos dias, a mídia burguesa divulgou, amplamente, o ‘crime’ gravíssimo do ex-bispo católico, Fernando Lugo, hoje presidente do Paraguai. Qual é o objeto do crime? É que ele teria, enquanto bispo, desrespeitado a lei do celibato, o que foi suficiente para acusarem-no, sumariamente, de traição à igreja e ao povo.

Entre as poucas declarações de Lugo sobre o caso, ele mostrou a que veio, afirmando que irá trabalhar com o princípio da verdade. Ou seja, ele deixa claro que, se alguma das crianças apresentadas for mesmo seu filho, ele a assumirá como pai. É bonito ver a sua honradez de um pastor e pai responsável, não caindo simplesmente na defensiva ou buscando uma ‘solução’ nos bastidores como, nesses casos, é comum acontecer.

O episódio ganha proporções enormes e imprevisíveis. Uma questão disciplinar da igreja, como é o celibato, pode se tornar o estopim de um Golpe de Estado, reabrindo o caminho para o Partido Colorado, que comandou e oprimiu o povo paraguaio nos últimos 60 anos. A conjuntura fica bastante desfavorável a Lugo, num país com maioria católica, com suas relações estremecidas com a igreja e com um Vice oportunista, da Direita, querendo ocupar-lhe o lugar.

Fragilizado internamente, Lugo ganha fôlego sustentado pela solidariedade internacional. Nesse particular, porém, um dos seus principais vizinhos, o Brasil, insuflado pela mídia e por interesses imperialistas, deu um mau exemplo. Lula sequer se lembrou de que, o que ocorre com Lugo agora, é semelhante ao que lhe ocorreu em 1989, quando a revelação de uma amante o derrubou na corrida presidencial, derrotado por Collor de Melo.

Em recente reunião entre Lula e Lugo em Brasília para possível revisão dos contratos da Usina Hidrelétrica de Itaipu, celebrados na época da Ditadura Militar, nosso Governo preferiu a relação imperialista à solidariedade. Construída na divisa dos dois países, de acordo com os contratos de Itaipu o Paraguai fica com a metade da energia, mas é obrigado a devolver ao Brasil, a preço de custo, toda energia não consumida. Mais de 90% da energia  é vendida pelo Brasil, depois, a preço de mercado, constituindo-se em grande prejuízo ao povo paraguaio. A insensibilidade e falta de visão estratégica de nosso governo podem comprometer uma das principais e justas bandeiras de Lugo, qual seja, a de usar o dinheiro da energia de Itaipu para garantir direitos básicos negados historicamente a seu povo.

É importante lembrar que Lugo não é um aventureiro qualquer. Com uma bela história de luta, ele serviu à igreja, sendo uma grande expressão entre os teólogos da libertação e, inclusive, destacando-se como um dos principais assessores de nosso saudoso e querido Dom Luciano Mendes de Almeida. Seu envolvimento na história do Paraguai não é expressão de fuga, mas de coerência. Não lhe  teria sido mais cômodo ir para Roma ou ficar aposentado para o resto da vida?

É essa sua vida e história que incomodam, profundamente, os capitalistas. Essa Direita nefasta, no Paraquai, Brasil e em boa parte da América Latina, atolada na sua própria podridão – que só não fede muito porque tem dinheiro para comprar perfume -, se aventa agora no direito de derrubar um Presidente com um moralismo barato.