“A água é fétida, tem dia que não dá para beber”: atingidos pelo crime em Brumadinho (MG) denunciam situação do abastecimento

No Dia Mundial da Água, mais de 250 atingidos da Bacia do Paraopeba fazem protesto por reparação ambiental integral


De acordo com o Plano de Recuperação Socioambiental apresentado pela Vale para a Bacia do Paraopeba, 54 dos mais de 300 quilômetros de extensão do rio passariam por uma dragagem dos rejeitos até o fim deste ano. No entanto, a limpeza do leito aconteceu em apenas 1% dessa extensão, ou seja, 550 metros. Os dados foram publicados neste mês pela assessoria técnica do Instituto Guaicuy. Como consequência direta, o abastecimento na região segue comprometido, agravando a saúde dos atingidos. Para denunciar a situação, cerca de 250 atingidos da Bacia do Paraopeba realizaram um protesto nesta sexta (22), em frente à 2ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte (MG). 

“A água é fétida, tem dia que nem dá para beber. O chuveiro, temos que trocar de dois em dois meses porque ele não aguenta de tanto calcário. Se um equipamento está assim, imagina o nosso corpo?”, relata Quésia Martins dos Santos, moradora de Pompéu.

Michelle Rocha, integrante da coordenação regional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), denuncia que o fornecimento de água tem sido negado pela Vale em diversos municípios. Ela conta que em Betim, cidade da região metropolitana de Belo Horizonte, a empresa parou de fornecer caminhão pipa às famílias atingidas. Por isso, a atingida reforça que a execução dos direitos individuais no formato coletivo é o caminho com melhores chances de construir critérios de reconhecimento das indenizações justas dos danos causados pelo rompimento. 

Opinião reforçada por Joelisia Feitosa, moradora de Juatuba. “Eu sou uma das pessoas que está comprovadamente contaminada por metais pesados. Vivemos com medo do que isso pode ocasionar no nosso organismo agora e no futuro. Enquanto as pessoas adoecem, a Vale controla os estudos sobre a contaminação da água, solo e ar”, denuncia. “Hoje os atingidos não têm informações sobre os estudos de contaminação e não têm participado das decisões sobre o que vai ser o Plano de Recuperação Socioambiental”, completa.

Os relatos e ponderações foram direcionados ao juiz Dr. Murilo Silvio de Abreu, responsável pelo julgamento da reparação no território. Além de mais celeridade na execução coletiva das indenizações individuais, os atingidos também reforçaram ao magistrado a preocupação sobre os impactos que a estagnação da recuperação ambiental podem trazer aos projetos de desenvolvimento socioeconômico que estão sendo elaborados pelos atingidos. 

“O Anexo 1.1 é para as demandas de projetos comunitários dos atingidos, mas como vamos executar se não sabemos se podemos usar o território, por exemplo, para plantio?”, pontuou Maria Santana, do município de São Joaquim de Bicas. A moradora solicitou ao magistrado a aprovação do Plano de Trabalho das Assessorias Técnicas Independentes (ATI’s) para o acompanhamento das questões referentes à reparação ambiental. Ela reforçou ainda a importância da atuação das ATI’s no acompanhamento das questões emergenciais, estudos de risco à saúde humana e qualificação da participação dos atingidos nas decisões do Plano de Recuperação Socioambiental. “Nós somos a maioria idosos, pessoas vulneráveis e as ATI’s são nossa ferramenta de trabalho, nossa voz. Limitar as ATI’s é limitar os atingidos”,  justificou.

Audiência com Juiz Murilo de Abreu. Foto: Amélia Gomes / MAB

Sobre a demanda, o juiz Dr. Murilo Silvio de Abreu se comprometeu a agilizar a homologação do plano de trabalho do processo judicial, para que as assessorias técnicas independentes possam acompanhar as questões ambientais relatadas pelos atingidos. O direito à Assessoria Técnica Independente, em situações de rompimento de barragens, é assegurado pela Política Estadual e Nacional das Populações Atingidas por Barragens (PEAB e PNAB).

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