“Estamos vendo as pessoas terem que ir buscar água no rio Amazonas, o comércio está todo fechado, muitos prejuízos, filas quilométricas nos postos de gasolina e nos grandes mercados que têm gerador”, conta atingido em Macapá
Publicado 06/11/2020 - Atualizado 21/08/2024
Desde a noite da última terça-feira (3), o estado do Amapá, na região Norte, está sem abastecimento de energia elétrica e água em 13 das 16 cidades, com mais de 730 mil pessoas afetadas.
Nesta sexta-feira (6), o governador Waldez Góes (PDT) assinou um decreto estabelecendo “estado de emergência”.
O apagão generalizado ocorreu por conta de um incêndio na subestação de Macapá, na capital. Dois dos três transformadores foram danificados, e o outro está fora de operação porque passa por manutenção desde o ano passado. A empresa responsável é privada: a Isolux.
Devido à falta de energia, a situação se tornou ainda mais grave porque o fornecimento de água também foi interrompido, já que as bombas hidráulicas pararam de funcionar.
Para reestabelecer a energia no Amapá, o governo federal, por meio do ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque, declarou haver três planos para solucionar o problema. O primeiro, a curto prazo, é consertar o transformador menos afetado, reestabelecendo 70% da energia até este final de semana, de acordo com previsão. Os outros dois são a médio prazo, com reestabelecimento completo da energia no estado somente em 30 dias.
SOS Amapá
Em registros de veículos de imprensa e nas redes sociais, há grandes filas para abastecer em postos de gasolina, pessoas em busca de gelo para conservar alimentos, prateleiras de supermercados totalmente vazias, além de grandes aglomerações em shoppings, aeroportos e outros locais onde a energia é mantida por geradores. Hospitais são motivo de preocupação. Tudo isso, em meio à pandemia de Covid-19.
A hashtag #SOSAmapá está sendo utilizada para chamar a atenção sobre o caso que começou a ter repercussão na mídia somente ontem, dois dias após a queda de energia.
O atingido Moroni Guimarães, morador de Ferreira Gomes, está na capital Macapá e relatou o quadro à reportagem do MAB.
“Imagina como estão as cidades do interior? Uma verdadeira calamidade! Tivemos que vir pra cá pra conseguir carga no celular e comunicar, divulgar o caos que estamos vivendo. Estamos vendo as pessoas terem que ir buscar água no rio Amazonas, o comércio está todo fechado, muitos prejuízos, filas quilométricas nos postos de gasolina e nos grandes mercados que têm gerador. A população está toda na rua atrás de alimento, está sendo difícil achar água até para beber, uma situação muito difícil mesmo”, conta Moroni.
Empresa privada
A fragilidade da empresa espanhola Isolux não é novidade para a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica). Em 2017, a agência constatou que a companhia descumpria os prazos do cronograma de obras e não possuía capacidade financeira para implantar os projetos que havia arrematado em leilão.
Assim, a diretoria da ANEEL recomendou ao Ministério de Minas e Energia a cassação de dois contratos de linhas de transmissão que estavam no domínio da empresa que estava em recuperação extrajudicial.
O CNE (Coletivo Nacional dos Eletricitários) destacou, em nota, que a Eletronorte, empresa estatal, foi acionada para ajudar o restabelecimento da energia no estado, o que não poderia acontecer no caso de o governo levar adiante o plano de privatização da Eletrobras.
“Embora o setor elétrico esteja sujeito a intempéries climáticas, o que ocorre no Amapá só demonstra o equívoco de privatizar a Eletrobras e suas empresas, que no estado é representado pela Eletronorte”, afirma a nota dos eletricitários.
Posição do MAB
O Movimento dos Atingidos por Barragens que atua no estado produziu uma nota sobre a situação:
O Movimento dos Atingidos por Barragens, no estado do Amapá, repudia o desrespeito com que as geradoras e distribuidoras de energia tratam a população. O estado está sem fornecimento de energia desde 3 de novembro, devido a um incêndio na subestação de energia em Macapá.
Chamamos à responsabilidade as autoridades dos três poderes de nosso estado, que deveriam vigiar e zelar para o bem estar de nossa população.
Nos solidarizamos com a população trabalhadora que luta no dia a dia para sobreviver e que agora está sofrendo até com falta de água, pois o abastecimento depende de bombas hidráulicas. Nos solidarizamos também com os trabalhadores do setor elétrico, que sofrem com precarização e terceirização.
A situação em Macapá é desoladora. Há enormes filas nos postos de combustível e muitas pessoas não conseguem sequer comprar medicamentos porque as farmácias estão sem sistema de pagamento. Até para comprar açaí são formadas filas nos poucos estabelecimentos que contam com gerador de energia.
Como o apagão demonstra, empresas só visam lucro e não priorizam o bem-estar da população. Enquanto isso, os atingidos esperam há anos por justiça.
Aos governantes que representam e governam para os grandes empreendimentos, fazemos aqui uma pergunta: foi interrompido o fornecimento gerado aqui no estado do Amapá pelas quatros hidrelétricas que são interligadas ao linhão de Tucuruí e que abastece outros estados do Brasil?
Acreditamos que não, pois se fosse assim, já teriam resolvido o problema. Lembramos que o Amapá é um estado que exporta energia e sua população ainda sofre sem acesso e com a péssima qualidade do serviço.
Aqueles que dizem querer o bem da população, na verdade, só visam lucro acima da vida. Exigimos ação das autoridades e denunciamos o descaso das empresas.
Também não podemos admitir que se faça uso político do apagão para defender a privatização da Eletronorte/Eletrobras, inclusive porque o incêndio teve início nas instalações de uma empresa terceirizada.
Precisamos de um projeto energético com soberania, distribuição da riqueza e controle popular.