Sentimentos em tempos de coronavírus em Minas Gerais
Foto: Nilmar Lages A pandemia do novo coronavírus colocou o mundo em alerta máximo. Uma contaminação que, de início, foi considerada de menor importância por boa parte dos líderes mundiais, […]
Publicado 13/04/2020
Foto: Nilmar Lages
A pandemia do novo coronavírus colocou o mundo em alerta máximo. Uma contaminação que, de início, foi considerada de menor importância por boa parte dos líderes mundiais, rapidamente ganhou status de pandemia global e colocou o mundo em alerta. Hoje, com mais de 1 milhão e 500 mil infectados e mais de 100 mil mortes, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) , os países correm contra o tempo para impedir um caos maior.
A crise global produzido pela COVID-19 se alastrou pela economia, pelos sistemas de saúde e também pela vida cotidiana mundo afora. As medidas de isolamento, impostas em diferentes níveis e com diferentes graus de intensidade a depender do país, convergiram para que, em fins de março, aproximadamente 2,8 bilhões de pessoas possuíssem alguma restrição à circulação, de acordo com o número de países em quarentena.
Apesar das incertezas e confusões produzidas pelo Presidente da República Jair Bolsonaro, que dá show de irresponsabilidade, má fé, ignorância e incapacidade ao adotar discurso, posicionamento e práticas anticientíficas, na contramão do que tem sido orientado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), pelo seu próprio Ministro da Saúde e do que tem feito todos os países e líderes mundiais, a população, em sua maioria, está preocupada. É o que relata a geraizeira Alaíde Almeida, residente no distrito de Vale das Cancelas, município de Grão Mogol, em Minas Gerais.
Para Alaíde não tem como não ter medo do coronavírus. Ela relata que “toda população está amedrontada, tendo em vista que a gente mora às margens de uma BR federal, a BR-251, e aqui transitam pessoas não só do estado, mas de todo o Brasil e inclusive de fora. O povo fica apreensivo, ninguém sabe ao certo como esse vírus pode ter a possibilidade de chegar até a gente ou um da família afirmou.
Segundo pesquisa realizada entre os dias 18 e 20 de março e divulgada pelo Datafolha em fins do mês, 74% dos entrevistados disseram ter medo de ser infectado pelo novo coronavírus, 83% declararam correr algum risco de se infectar, 88% avaliaram que o surto no Brasil é muito sério e 73% se disseram favoráveis às medidas de isolamento para diminuir o contágio.
Diante desse quadro, a postura dos responsáveis pela adoção de medidas de combate ao vírus e de assistência à população também está sujeita à avaliação, que está diretamente relacionada à forma como as pessoas têm enxergado a situação e o nível de receio ou medo que possuem em relação à COVID-19.
Outra pesquisa realizada pelo Datafolha entre os dias 01 e 03 de abril, em linha com o que havia sido apurado em levantamento anterior, revela que 76% dos entrevistados considera que o mais importante neste momento é ficar em casa, 65% acredita que o comércio não essencial deve permanecer fechado. Para 87% as aulas devem permanecer suspensas e 71% se manifestou a favor da proibição de sair de casa para quem não trabalhe em serviço essencial.
Atrelada a esse receio há outro, de natureza econômica, que se relaciona com as perspectivas sobre o futuro. Leandro Pereira, militante do MAB, ao traçar um panorama do que se passa na região do Médio Jequitinhonha aponta que o que as pessoas estão mais preocupadas é com o pós, as questões financeiras que vai acarretar, muitos não estão conseguindo vender mais afirmou. De acordo com Leandro, “ao mesmo tempo eles estão tomando os cuidados necessários. Mas a preocupação que eu vejo mais é na parte financeira depois que passar isso, como vai ficar relatou.
A pandemia traz, também, impactos no dia a dia das pessoas. Alaíde Almeida relata os desafios de seguir as medidas rigorosas de higiene para evitar a contaminação, as quais exigem disciplina e vigilância constantes que não são tarefa fácil.
Claro que a gente não consegue tomar todos os cuidados de usar máscara, mesmo porque não temos. Muitas das vezes a gente esquece de tomar os cuidados. Quando você pensa que não, cê quer levar a vida normal, aí cê tem que lembrar dessa coisa de lavar a mão toda hora, então isso tá ocupando parte da mente da gente, tá sendo um transtorno afirmou.
Em locais como o Vale das Cancelas as medidas de contenção do contágio têm acarretado outros problemas: a ofensiva das empresas. Nessa região conflituosa na qual comunidades tradicionais geraizeiras precisam, constantemente, defender seu território da ofensiva do grande capital, a empresa Mantiqueira, concessionária de uma linha de transmissão ligando a usina de Irapé, em Grão Mogol/MG ao município de Janaúba/MG. O conflito se arrasta desde 2018, quando os geraizeiros iniciaram a resistência à empresa que pretendia instalar algumas torres de transmissão de energia dentro do território sem autorização das comunidades e violando seus direitos. A luta levou à paralisação das obras, situação em que se encontra. Porém, tentando tirar proveito da ocasião da pandemia do coronavírus, a empresa resolveu aproveitar as medidas de isolamento social para dar andamento às obras dentro do território tradicional geraizeiro, forçando as comunidades a se organizarem e deixarem o isolamento para fazer esse novo enfrentamento.
Toda vez que eles estão avançando a gente chega e eles param. Só que a gente tá meio apreensivo, né. Tem muitos empregados que eles já tinham que ter mandado embora, tem que ter a quarentena e eles não podem mandar o pessoal embora porque não terminou o serviço e a gente fica sem poder fazer o serviço da gente porque tem que ficar de olho neles afirmou Alaíde. Para ela isso está sendo um transtorno para a comunidade, que fica preocupada com os cuidados necessários diante da pandemia do coronavírus e, ao mesmo tempo, com a empresa.
Em que pese a situação preocupante as pessoas seguem acreditando em dias melhores, apegando-se, sobretudo, à fé. É o que aponta o Sr. Gentil Durães, residente na comunidade Rio das Antas, município de Salinas/MG: Eu tenho bastante conhecimento com o pessoal, um pessoal religioso, graças a Deus, e estão com fé em Deus que nós vamos vencer. […] é pedir Papai do Céu para que suma com esse vírus e nós continuamos a nossa luta.
Como lembra Alaíde, porém, a confiança em Deus é fundamental, mas também é preciso que cada um de nós faça a sua parte.