Atingidos pela Samarco cobram início de assessorias técnicas no Rio Doce

Comissões Locais entregaram ofício e enviaram cartas para o MPF reivindicando a imediata contratação das equipes As assessorias técnicas independentes são equipes multidisciplinares que atuam no território atingido com duas […]

Comissões Locais entregaram ofício e enviaram cartas para o MPF reivindicando a imediata contratação das equipes


As assessorias técnicas independentes são equipes multidisciplinares que atuam no território atingido com duas tarefas principais: 1) mobilização social objetivando o aumento da participação dos atingidos e atingidas no processo de reparação integral e 2) elaboração de argumentos técnicos nas mais variadas áreas para empoderar os atingidos e atingidos nos processos de disputas com as empresas. Esta é uma conquista fundamental dos atingidos e atingidas por crimes socioambientais em Minas Gerais no último período e que tem ampliado a possibilidade de uma reparação justa de danos.

Na bacia do rio Paraopeba, atingida pelo crime da Vale, em Brumadinho, no dia 25 de janeiro de 2019, a Justiça já garantiu o processo de escolha das entidades sem fins lucrativos sob a coordenação do Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público Estadual (MPE), Defensoria Pública da União (DPU) e Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPEMG). O prazo para as contratações é setembro de 2019.

Esta velocidade de decisão e garantias não existe no processo de bacia do rio Doce, que foi atingida pelo crime da Samarco (ValeBHP Billiton) em 5 de novembro de 2015. A luta organizada dos atingidos e o empenho valoroso das instituições de Justiça garantiram este direito a partir do Aditivo ao Termo de Ajustamento Preliminar (TAP) divulgado em 16 de em novembro de 2017.

Este acordo assinado pelas empresas resultou em um avanço imenso porque trouxe a centralidade da dor da vítima e a legislação de direitos humanos para o centro do debate e garantiu que todas as comunidades atingidas teriam assessorias independentes que seriam escolhidas por meio de um processo de edital público ordenado por uma série de pré-requisitos, critérios e condições. Para organizar e executar este processo foi indicado e contratado o Fundo Brasil de Direitos Humanos (FBDH).

Em janeiro de 2018, o FBDH começou a sua atuação com duas fases. Primeiro, visitou as comunidades da bacia do Rio Doce e fez um amplo processo de diálogo para propor como deveria ser esta escolha e como seria a divisão territorial da atuação das entidades a serem escolhidas.

A conclusão do trabalho resultou na divisão da bacia em 16 territórios, 8 em Minas Gerais e 8 no Espírito Santo. Em cada um deles, haveria uma equipe de assessoria técnica contratada por uma entidade sem fins lucrativos. Esta entidade seria escolhida de forma soberana em uma organização mediada pelas Comissões Locais de Atingidos e Atingidas.

Após longa espera, o Fundo Brasil começou a executar esta divisão e entre outubro de 2018 e fevereiro de 2019, os 16 territórios escolheram suas entidades. Nesta fase, foram escolhidas a Associação de Desenvolvimento Agrícola Interestadual – ADAI, a Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social – AEDAS, a Cáritas da Diocese de Governador Valadares, a Cáritas da Diocese de Itabira e o Centro Agroecológico Tamanduá – CAT. Neste período, foi acrescentado um 17º território que foi a comunidade quilombola de Degredo, em Linhares, Espírito Santo, que ainda não fez sua escolha.

Passado quase 8 meses da primeira escolha de entidade, os atingidos ainda não tem prazo real para o início dos trabalhos. Para denunciar a situação e cobrar das autoridades ações para resolver esta questão, representantes de diversas comunidades atingidas estiveram na 37ª reunião do Comitê Interfederativo (CIF), órgão do IBAMA responsável pela execução dos trabalhos da Fundação Renova, entidade de direito privado criada pelas mineradoras.  

Miguelito Teixeira, integrante da Comissão Local dos Atingidos e Atingidas de Conselheiro Pena, é uma das milhares de pessoas que aguardam a efetivação deste direito. “Eu sou agricultor rural, vendi o que tinha para ter este canto na beira do rio Doce, ter outro estilo de vida. Fiz um grande investimento na minha propriedade e hoje recebo um cartão manutenção. Fizeram para mim apenas uma proposta de indenização final de 30 mil reais e nada mais. Como eu posso depender apenas da Fundação Renova para garantir meus direitos?”, questiona.

Miguelito foi um dos ativos participantes do processo de escolha conduzido pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos (FBDH) na sua comunidade e aposta na assessoria como um instrumento para melhorar a situação do conjunto dos atingidos. “A atuação desta equipe, no caso a AEDAS que foi escolhida por nós em assembléia em novembro de 2018, é uma esperança que animou os produtores rurais, os pescadores e as demais categorias de atingidos. Uma forma de pressionarmos a Renova que não apresenta nenhuma novidade, não tem nenhuma atuação de longo prazo”, comenta.

Miguel é um dos atingidos que participaram da reunião do CIF nesta segunda e terça, em Belo Horizonte. Eles vieram de várias localidades cobrar urgência na resolução dos problemas. Na oportunidade, entregaram um oficio para o Ministério Público Federal (MPF), responsável pela negociação, assinado por comissões de diversas cidades atingidas cobrando que a instituição acelere as contratações.  

“É uma vergonha para o processo na bacia do Rio Doce que os atingidos do rio Paraopeba já tenham prazo definido para o início das atividades de suas assessorias (o que é uma grande e importante conquista) enquanto nós, que sofremos há mais de 3 anos e meio, não temos nenhum prazo real para este início. Enquanto isto, sofremos com o descaso e a falta de respeito da Fundação Renova que nega nossos direitos e causa muitos conflitos em nossas comunidades.”, afirma um trecho do documento.

Alem do ofício, foram entregues cartas escritas pelas comunidades e comissões que relatam os problemas e cobram agilidade. Uma delas foi feita à mão e assinada por 50 atingidos e atingidas de Pedra Corrida, distrito de Periquito.  Colocando o assunto da carta como “o desprezo da Renova com a população”, eles narram muitas situações de violações de direitos humanos na localidade, citam exemplos de idosos e doentes sem nenhum tipo de atenção e finalizam:

“Senhores do Ministério Público Federal, nos ajude pelo amor de Deus, pois tanto o consórcio UHE Baguari, a Renova, a Vale do rio Doce, que é hoje é chamada de Vale e Samarco, cruzaram os braços, não querendo nos indenizar e nem tão pouco olhando a saúde da população e nem tão pouco o lazer da população… agradecemos ao Ministério Público Federal, crendo que vossas senhorias possam ajudar essa humilde comunidade que sofre e muito”.

Agora, as comunidades aguardam resposta do Ministério Público Federal MPF) e das mineradoras.

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