Unidos pelo Rio Doce: a igreja é uma voz que não se cala! Diocese de Colatina (ES)
No dia 5 de novembro de 2018, a sociedade lembra, estarrecida, os 3 anos da maior tragédia socioambiental cometida na história do Brasil: o rompimento da barragem de rejeitos de […]
Publicado 04/11/2018
No dia 5 de novembro de 2018, a sociedade lembra, estarrecida, os 3 anos da maior tragédia socioambiental cometida na história do Brasil: o rompimento da barragem de rejeitos de minério da empresa Samarco (Vale e BHP Biliton), que destruiu toda a bacia do Rio Doce e boa parte do litoral capixaba.
Apesar da gravidade do caso, as políticas de reparação não tem sido vistas como satisfatórias pela população atingida. E é por isso que a Diocese de Colatina, reafirma, mais uma vez, de não deixar cair no esquecimento essa tragédia sem precedentes e suas graves consequências.
A cada ano, vamos manifestar nosso repúdio e cobrar a reparação dos danos causados.
A seguir apresentamos alguns fatos que nos preocupam:
- Processo de reparação:
– O processo de reparação integral acordado entre governos e empresas por meio do termo de ajuste de conduta (TTAC) vem sendo sistematicamente descumprido pela Fundação Renova;
– três anos se passaram e nem todas as vítimas foram reconhecidas e devidamente reparadas, sendo inclusive possível apontar a gravidade do não reconhecimento das mulheres como atingidas;
– A reconstrução das áreas afetadas não está contando com a participação dos atingidos e atingidas, sujeitos centrais nesse processo e conhecedores dos modos de vida das referidas regiões;
- Saúde das populações atingidas:
– Há falta de informação sobre os danos causados à saúde, principal desafio para a recuperação da dignidade da vida das famílias;
– Depois da tragédia, não encontramos sequer uma comunidade atingida que não apresente abalo psicológico por inúmeros motivos :perda dos laços com o rio, perda da renda, ansiedade diante de um futuro incerto, falta de dinheiro. São inúmeros os casos de depressão, alcoolismo, violência doméstica e outros problemas psicossociais;
– A falta de estudos sobre a potabilidade da água, somada à sua turbidez, em grandes regiões, como Colatina e Governador Valadares, é acompanhada de problemas de pele, quedas de cabelo e doenças gástricas;
- Violação de Direitos legais:
– A maioria das famílias está sendo alvo de extorsão diante da falta de informação sobre seus direitos, como acesso à justiça gratuita, sendo vítimas de toda uma indústria da indenização construída em paralelo a tragédia ;
– Há falta de prepara do sistema judiciário em acolher um caso emblemático como esse, atuando em detrimento dos direitos dos atingidos e atingidas;
– A demora no andamento das ações implica em maior vulnerabilidade das vítimas;
– Outro grande problema é o acesso à justiça para a reparação das comunidades. A ausência de informação tem levado os atingidos a ser influenciados por muitos oportunistas que propõem indenizações e acordos abaixo dos valores dignos para restabelecimento da vida. Os atingidos estão desprotegidos no que se refere ao sistema de justiça que nada entende de direitos humanos;
– O predomínio do acordado frente ao legislado leva os atingidos e atingidas em situação de pobreza a ter que negociar sozinhos, sem assessoria jurídica, nos escritórios da Fundação Renova ;
– Há magistrados que desconhecem a realidade e magnitude do problema e da matéria de direitos fundamentais.
- Criminalização das organizações da sociedade civil e Igreja
– Ao homologar dois TACs celebrados entre o Ministério Público Federal e a Samarco com o objetivo de impedir que a mineradora continue a poluir o meio ambiente (Rio Doce) e repare os danos causados com o rompimento da barragem de Fundão , um juiz federal de Belo Horizonte (MG), determinou algumas sanções que , de certa forma, impõe o voto de silencio, coíbem a liberdade de expressão e dificultam a atuação de entidade religiosas, bem como das organizações da sociedade civil na luta e na defesa dos direitos dos atingidos.
Diante dessas nossas preocupações, percebemos que os 3 anos do maior crime socioambiental do Brasil são marcados pela reprodução de Injustiças. De um lado temos, os atingidos e atingidas, que não possuem acesso a informação adequada sobre seus direitos, nem assessoria técnica de sua confiança e imparcial perante as empresas. Essas pessoas vem sendo desrespeitadas na garantia de seu direito à participação e livredeterminação na construção do processo reparatório por parte dos representantes do sistema de justiça. Esse é o lado frágil de uma sociedade desigual, agravado num contexto de insegurança e vulnerabilidade .
De outro lado, temos as empresas que dominam os mecanismos negociais e afirmam a primazia dos interesses econômicos frente a garantia dos direitos humanos. Há exemplos de situações que foram colocados 12 advogados dessas empresas contra um atingido em situação de analfabetismo funcional para estabelecer uma negociação. Isso é descabido!
São 3 anos de impunidade, mas nós não esquecemos!