Cúpula dos povos saúda a construção do movimento internacional de atingidos por barragens e pela crise climática

Organizações presentes na Cúpula dos Povos reconheceram a criação do Movimento Internacional de Atingidos como passo decisivo para fortalecer a resistência global diante dos desastres ambientais e da crise climática

Mais de 1.000 organizações entregam Carta Política ao presidente da COP 30, André Corrêa do Lago. Foto: Marcelo Aguilar / MAB
Mais de 1.000 organizações entregam Carta Política ao presidente da COP 30, André Corrêa do Lago. Foto: Marcelo Aguilar / MAB

No encerramento da Cúpula dos Povos, neste domingo (16), mais de de 1.000 organizações de todos os países presentes em Belém saudaram a criação do Movimento Internacional de Atingidos por Barragens e pela Crise Climática, em um gesto de reconhecimento à importância que esta organização tem em vários países e terá no caráter internacional. 

A articulação nasce reunindo representantes de cinco continentes e consolidando, pela primeira vez, uma organização global permanente dedicada a enfrentar desastres socioambientais, violações de direitos e a crise climática, e foi oficializada durante o IV Encontro Internacional de Atingidos por Barragens e Crise Climática, realizado em Belém, de 06 a 11 de novembro. 

Plenária de criação do Movimento Internacional de Atingidos, no dia 11 de novembro, em Belém. Foto: Marcelo Aguilar / MAB
Plenária de criação do Movimento Internacional de Atingidos, no dia 11 de novembro, em Belém. Foto: Marcelo Aguilar / MAB

A fundação foi celebrada em meio à entrega da carta política da Cúpula ao presidente da COP 30, André Corrêa do Lago, documento que reúne reivindicações como desmatamento zero, demarcação imediata dos territórios tradicionais, reforma agrária, combate ao racismo ambiental, tarifa zero no transporte público, fim da exploração de combustíveis fósseis e reparação justa para todos os atingidos por barragens, mineração e eventos climáticos extremos.

“Para as organizações que estão construindo o movimento internacional dos atingidos, o reconhecimento da Cúpula é um passo muito importante de apoio e respaldo ao trabalho realizado em vários países de resistência dos atingidos. E também reforça a indicação da necessidade de haver fortes movimentos organizados para proteger a população e reivindicar os direitos frente a atual crise climática, que tem sido dramática para milhões de pessoas em todo o mundo”, afirmou o integrante da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), Luiz Dalla Costa. 

Raoni: “Se não defendermos o que resta nesta terra, haverá um caos muito grande”

A plenária final foi aberta com a fala emocionada do cacique Raoni, liderança do povo Kayapó Mebêngôkre. Ao alertar para o agravamento da crise climática, ele afirmou: “Os rios estão cada vez mais secando; o ar está cada vez mais difícil de podermos respirar; a chuva não está vindo. Se não tivermos a consciência de defender o que resta nesta terra, haverá um caos muito grande.”

Raoni encerrou sua participação deixando uma mensagem de união: “Estou aqui passando a minha mensagem para todos. Que possamos ser amigos, em harmonia, nessa luta pela vida.”

Multidões, vitórias e sonhos

Ao longo de cinco dias, mais de 20 mil pessoas passaram pela Cúpula dos Povos, enquanto diplomatas de 195 países negociavam a agenda oficial da COP 30 no espaço da ONU. Foram mais de 1.100 organizações signatárias da carta política e representantes de mais de 60 países, segundo os organizadores.

Cúpula dos Povos celebra criação do Movimento Internacional dos Atingidos por Barragens e Crise Climática. Foto: Marcelo Aguilar / MAB
Cúpula dos Povos celebra criação do Movimento Internacional dos Atingidos por Barragens e Crise Climática. Foto: Marcelo Aguilar / MAB

A mobilização conquistou uma vitória significativa: após protestos de povos indígenas do Baixo Tapajós e do povo Munduruku, o governo federal anunciou que nenhum empreendimento será realizado no Rio Tapajós sem consulta prévia, livre e informada. A decisão foi comunicada pelo ministro Guilherme Boulos durante o ato final. A notícia arrancou aplausos de centenas de lideranças indígenas e ribeirinhas presentes. Na plenária, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, leu a carta enviada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos participantes. No texto, Lula afirma:“A COP 30 não seria completa sem a participação de vocês. O combate à mudança do clima precisa da mobilização de toda a sociedade, e não só dos governos”.

O presidente reforçou, ainda, o alinhamento entre ciência e sociedade civil: “Esta é uma COP da verdade, e as demonstrações da sociedade civil estão aliadas com a ciência. Temos urgência. Não podemos adiar decisões que há tantos anos vêm sendo debatidas, como transição justa e adaptação.” E conclui defendendo um marco global para o abandono progressivo dos fósseis: “Precisamos do mapa do caminho para que a humanidade, de forma justa e planejada, supere a dependência dos combustíveis fósseis e pare e reverta o desmatamento”.

Ao apresentar a carta presidencial, a ministra Marina Silva destacou a força da mobilização popular. “As demonstrações da sociedade civil estão aliadas com a ciência. Avançamos de forma inclusiva e transparente, e esta semana será fundamental para o resultado da COP 30.”

Uma agenda popular para o Brasil e para o mundo

A carta entregue à presidência da COP 30 denuncia o avanço das desigualdades, do racismo ambiental e da financeirização da natureza. Reafirma que os bens comuns, ar, água, florestas, minérios, energia, não podem ser privatizados e condena falsas soluções que repetem modelos extrativistas.

O documento também demanda:

  • Fim da exploração de petróleo, gás e carvão;
  • Transição energética justa e popular;
  • Demarcação de todas as terras indígenas;
  • Reconhecimento dos saberes tradicionais;
  • Combate às empresas responsáveis por crimes socioambientais e;
  • Justiça reparatória para atingidos no Brasil e no mundo.

Leia a Declaração da Cúpula dos Povos rumo à COP 30 aqui.

Um marco histórico para os atingidos

A  criação do Movimento Internacional de Atingidos por Barragens e Crise Climática representa um passo sem precedentes na articulação global dos povos afetados por megaempreendimentos, desastres socioambientais e pela crise climática.

A partir da Cúpula de Belém, atingidos de dezenas de países assumem o compromisso de articular ações conjuntas, fortalecer solidariedades, denunciar violações e construir alternativas energéticas, territoriais e econômicas baseadas no bem viver, na justiça e na soberania popular. O mundo dos atingidos, antes fragmentado por fronteiras, agora se reconhece como parte de uma só luta dos povos do mundo. 

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