Povos se unem e lançam movimento internacional de atingidos por barragens, crimes socioambientais e crise climática
O IV Encontro Internacional dos Atingidos por Barragens e Crise Climática, em Belém, marcou a fundação de um movimento global que pretende fortalecer lutas locais e articular ações conjuntas em todos os continentes em defesa da água, da energia e dos direitos humanos
Publicado 12/11/2025

Nesta terça-feira (11), organizações populares dos cinco continentes lançaram, durante IV Encontro Internacional de Atingidos por Barragens e Crise Climática, realizado em Belém do Pará, na Amazônia brasileira, um movimento internacional de atingidos. A partir de agora, militantes de dezenas de países irão compor uma mesma organização de populações afetadas por barragens, pela crise climática e por crimes socioambientais. A proposta é construir coletivamente uma frente global, com organização própria e unificada, capaz de fazer frente à empresas, instituições e o capital, e que unifique as lutas das populações de diferentes nações.
O movimento, que já reunia países da América Latina, amplia agora seu alcance para os cinco continentes. Seu propósito é fortalecer a articulação política e a solidariedade internacional entre comunidades de diferentes países, unindo forças diante dos impactos socioambientais e econômicos causados por grandes empreendimentos – muitos deles de atuação global – e pelas crises ambientais que afetam, sobretudo, os povos tradicionais.
O movimento também busca denunciar violações de direitos humanos, defender o acesso justo à água e à energia como bens comuns e impulsionar políticas públicas que priorizem a soberania energética e o protagonismo das populações atingidas.

Marilin Peña Pérez, do Centro Memorial Martin Luther King Jr., de Cuba, falou sobre a importância histórica deste dia em que nasce o movimento, em um cenário de disputas profundas sobre o futuro do planeta.
“Creio que o lançamento de um movimento internacional que abarca os cinco continentes – neste cenário histórico que é a COP -, que sabemos que é um espaço que não gera nenhum tipo de transformação social nem de esperança para os povos, é a expressão, no cenário de Belém, da contradição que há entre o capital da vida e o capital para a morte”, destacou.
Ela também reforçou que o encontro simboliza um projeto de vida construído desde os territórios, com base no poder popular e no respeito à natureza e às culturas locais.
“Apostamos em um projeto de desenvolvimento amigável com a natureza, por respeito aos bens comuns, pela defesa dos territórios, por um desenvolvimento que nasce desde o local, que tenha em conta as sementes autênticas da nossa terra, que respeite nossos sabores, nossas cores e nossa diversidade cultural”, complementou.
Durante a plenária que consolidou a criação do movimento internacional, foi feita a leitura coletiva de uma carta de intenções coletiva pela luta internacionalista, distribuindo em 10 pontos os principais passos políticos que a organização deverá seguir a partir do IV Encontro Internacional. São elas:
1. Em todos os países, devemos trabalhar pela união e entendimento da luta e da organização das populações atingidas;
2. Nossa luta é contra todas as formas de exploração e opressão dos povos que trabalham e produzem riqueza;
3. O atual modo de produção hegemônico é nosso inimigo;
4. Construir um forte Movimento Internacional dos Atingidos;
5. Nosso Movimento será um movimento forte das populações atingidas em cada país e terá uma liderança internacionalista de militantes;
6. A mensagem política do Movimento articula o horizonte da transformação social com a conquista de direitos;
7. Persistir na pedagogia do exemplo como a melhor forma de convencer;
8. Persistir na construção nacional do Movimento em cada país;
9. Uma coordenação inicial formulará um programa sistemático de formação política com base na educação popular e;
10. Fortalecer o trabalho em aliança com forças que tenham os mesmos objetivos.
Luiz Dalla Costa, integrante da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), disse que “o dia é histórico porque é fruto de muitas construções ao longo das últimas décadas”. Afirmou aos delegados, delegadas e participantes do encontro que “cada um de nós carrega o compromisso de voltar para seu povo e responder: para onde vamos a partir daqui? O que faremos depois deste encontro? É com essa consciência – e também com alegria – que iniciamos este debate, prontos para começar a construir juntos essa coordenação internacional.”

Ainda durante a plenária de lançamento do movimento, os delegados e delegadas debateram as diretrizes iniciais e sugeriram complementações ao texto final, que discorre sobre cada um dos passos. A partir de agora, com o movimento lançado, os representantes poderão criar a estrutura da organização internacional, o que significa, entre outros pontos, decidir nome, conceito, estrutura de coordenação e calendário.
“A partir de agora, pacientemente, sem pressa e sem pausa, vamos construir. Com a particularidade de cada país, de cada povo, e sempre buscando pontos de unidade. Temos que buscar as convergências que nos permitem ter uma visão teórica e simbólica da organização. Mas a principal decisão está tomada: essa é a decisão histórica do rumo da construção internacional do movimento dos atingidos e atingidas. E, para isso, podemos nos desafiar a assumir alguns compromissos”, reforçou Dalla Costa.
O nascimento do movimento internacional de atingidos marca um passo histórico na luta popular por justiça ambiental e soberania dos povos. O que antes era um esforço articulado de forma organizativa entre países latino-americanos, transforma-se agora – três décadas após o primeiro encontro de atingidos de países diversos -, em uma frente global, sem fronteiras, que une vozes, territórios e esperanças em torno de um mesmo propósito: enfrentar o poder das grandes corporações e afirmar o direito à vida.
A decisão tomada em Belém, regada pelas águas da Amazônia, simboliza mais do que um marco organizativo, é a semente de uma nova etapa de solidariedade internacional, construída com paciência, coragem e convicção de que só a união dos povos poderá mudar o curso da história.
