Feminismo Popular e Resistências das Mulheres nos Territórios: o que diz o Eixo 6 e o que o MAB leva para o debate
Na Cúpula dos Povos, o MAB defende que as soluções para a crise climática passam pela organização coletiva, pelos saberes dos territórios e pelo protagonismo feminino nas decisões políticas
Publicado 07/11/2025 - Actualizado 07/11/2025

Há lugares onde a luta nasce no corpo. No corpo que resiste às cheias, à rachadura da terra seca, ao despejo forçado pelas grandes obras. Não é incomum que, nesses lugares, sejam as mulheres que permanecem de pé. Elas seguram a vida no colo, plantam o feijão, organizam a comunidade, lavam o barro das margens do rio e recolhem os pedaços deixados pela barragem e pelo descaso.
É por essas mulheres, e com essas mulheres, que a Cúpula dos Povos criou o Eixo 6 – Feminismo Popular e Resistências das Mulheres nos Territórios. Um espaço que diz, com todas as letras, que não há justiça climática sem enfrentar também o patriarcado, o racismo ambiental e a lógica que transforma rios, florestas e corpos em mercadoria.
O Movimento dos Atingidos por Barragens construiu esse debate devagar, como quem cuida de uma semente. Em círculos de conversa, encontros de formação, assembleias nas margens dos rios. “Através de nossos encontros de formação em todas as instâncias – nacional, estadual, nas regiões – debatemos as violações dos direitos das mulheres atingidas no contexto das grandes obras e como a crise climática agrava esse processo”, relata a integrante da coordenação do movimento, Elisa Estronioli.

Essas conversas revelaram algo que o mundo e o patriarcado insistem em ignorar: quando a água some ou transborda, quando a terra é tomada para erguer uma barragem, quando a memória vira lama, as mulheres são as primeiras a sentir e as últimas a serem ouvidas.
Quando o clima toca o corpo e o território
A crise climática tem endereço, cor e gênero. Ela avança sobre cozinhas cheias de fumaça, sobre quintais onde faltou água, sobre lideranças que tentam falar e são caladas. “A crise climática intensifica as violações de direitos. As mulheres são as mais atingidas, mas sempre encontram maiores obstáculos para garantir seus direitos e exercer o papel de lideranças”, explica Elisa.
Por isso, o movimento tomou uma decisão política: fortalecer a presença feminina desde as margens até os espaços nacionais. “O MAB prioriza a organização das mulheres nas instâncias, desde as coordenações de base até a nacional”, afirma.
O Eixo 6 não é apenas denúncia, é anúncio. Anúncio de outras formas de viver e produzir, que já existem dentro das casas, dos quintais e das memórias transmitidas entre mulheres.
“As mulheres já têm as soluções, que passam pelo cuidado coletivo, pela produção de alimentos saudáveis, pela manutenção dos saberes e da cultura popular, pela priorização das condições de vida e não do lucro”, defende.
Essas soluções têm cheiro de fogão à lenha, gosto de comida feita em mutirão, cor de horta agroecológica plantada sobre a terra que insistiram em alagar. Elas não cabem em gráficos nem em metas de carbono; cabem no cotidiano e no futuro.

O que elas pedem são condições para existir. Pedem políticas públicas, participação real nas decisões, territórios protegidos. Pedem que o Estado deixe de ser omisso e que a sociedade enxergue o que se passa para além dos muros das grandes cidades. “Para apoiar a resistência das mulheres é importante incentivar sua organização coletiva”, resume Elisa.
Para a Cúpula dos Povos elas levam a certeza de que esse debate não pode ser restrito a mesas ‘sobre gênero’. “Nós, mulheres, precisamos ocupar espaços em todas as discussões – não só nas específicas de gênero, mas no todo da elaboração política.”
Levam também perguntas urgentes: Quem paga o preço da conta de luz, que todo mês aumenta? Quem decide sobre rios e territórios? Quem ouve as mulheres que vivem onde o mapa esconde?
