Obra Rodovia Liberdade: MAB se soma à luta dos atingidos e reforça necessidade de um modelo popular de desenvolvimento

Audiência revela que a Rodovia Liberdade aprofunda o desmatamento, ameaça comunidades tradicionais e evidencia a ausência de diálogo com os povos atingidos na Região Metropolitana de Belém

Comunidades atingidas pela Rodovia Liberdade se reúnem com o Ministério Público em audiência marcada pela denúncia de violações e pela luta por justiça. Foto: Rafael Zan / MAB
Comunidades atingidas pela Rodovia Liberdade se reuniram com o Ministério Público, no último dia 06, em audiência marcada pela denúncia de violações e pela luta por justiça. Foto: Rafael Zan / MAB

Na segunda-feira (06), o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) participou de uma audiência decorrente da ação civil pública movida pela Defensoria Pública do Estado do Pará, que busca garantir um direito urgente: pedido de reparação das famílias atingidas pela Rodovia Liberdade.

A Rodovia Liberdade é uma obra viária em execução na Região Metropolitana de Belém, projetada para ligar o município de Marituba à Alça Viária, na capital paraense. Apresentada como solução para o congestionamento urbano e parte de um pacote de intervenções para a COP30, a rodovia, na prática, prioriza o escoamento de cargas e o acesso rápido aos portos privados, servindo aos interesses logísticos de grandes empresas. Com previsão de desmatamento de mais de 60 hectares de floresta urbana e custo estimado em R$ 400 milhões, a obra ignora comunidades tradicionais ao longo do traçado, como o Quilombo Abacatal, colocando em risco a permanência das populações em seus territórios.

Essa obra representa a reprodução de um modelo desenvolvimentista que tem deixado para trás as comunidades tradicionais, urbanas e quilombolas. Sem consulta prévia, livre e informada às populações diretamente afetadas – como determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) –  a obra avança sobre territórios já vulnerabilizados, com impactos diretos no meio ambiente, na qualidade de vida dos moradores e no direito à permanência em seus lugares de origem.

No último mês, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) também esteve presente em assembleia com comunidades impactadas pela construção da Rodovia Liberdade, em Marituba (PA), somando forças com a população na luta contra mais um projeto de destruição disfarçado de desenvolvimento. A obra, que tem sido vendida como sustentável e essencial à mobilidade urbana, evidencia na prática um modelo de cidade excludente, violento e alinhado aos interesses do mercado, em detrimento da vida, dos territórios e da soberania popular.

Na audiência, vozes antes silenciadas ocuparam o centro do debate. Famílias atingidas pela Rodovia Liberdade exigem respeito, reparação e o direito de decidir sobre seus próprios caminhos. foto: Rafael Zan / MAB
Na audiência, vozes antes silenciadas ocuparam o centro do debate. Famílias atingidas pela Rodovia Liberdade exigem respeito, reparação e o direito de decidir sobre seus próprios caminhos. foto: Rafael Zan / MAB

Durante a assembleia, o MAB se somou aos debates populares que vêm sendo construídos pelos atingidos da região, dialogando sobre os efeitos do avanço do desmatamento, da especulação imobiliária e da intensificação das mudanças climáticas na Amazônia urbana. O movimento defende que esse tipo de projeto, que privatiza os benefícios e socializa os prejuízos, precisa ser enfrentado com organização de base e uma proposta de país que coloque os trabalhadores e as trabalhadoras no centro das decisões.

Apesar de ser apresentada como um avanço para a mobilidade da região metropolitana de Belém, a Rodovia Liberdade está sendo construída sem garantir acesso às próprias comunidades que vivem em seu entorno. Muros e cercas impedirão a travessia de pedestres e veículos, reforçando a segregação urbana e aprofundando desigualdades já existentes. Trata-se de uma via pensada para atender aos interesses logísticos de grandes empreendimentos, portos privados e transportadoras, e não para servir à população.

“A Rodovia Liberdade não é um caso isolado. Ela faz parte de um conjunto sistêmico de obras pensadas para servir à lógica de um projeto capitalista de desenvolvimento, que transforma o território em mercadoria e a vida das pessoas em obstáculo. Esse modelo se repete: grandes empreendimentos que prometem progresso, mas deixam destruição, expulsão e violação de direitos por onde passam.” Afirma Iury Paulino, da Coordenação Nacional do Movimento.

Ao mesmo tempo, o desmatamento de mais de 60 hectares de floresta urbana compromete os ciclos naturais, expulsa a fauna silvestre, agrava o calor e reduz a produção agrícola de base familiar. Os relatos sobre o aumento da temperatura, a perda de produtividade de açaí e pupunha, e o impacto sobre os corpos d’água – acúmulos significativos de água, como lagos, rios e aquíferos – região demonstram que não se trata apenas de um problema de mobilidade, mas de uma crise ambiental e social em curso.

O MAB reforça que os atingidos por grandes obras, como a Rodovia Liberdade, também são atingidos pelas mudanças climáticas, que é preciso atualizar a compreensão sobre quem são os verdadeiros impactados nos territórios brasileiros. Trata-se de um novo ciclo de violações promovidas por projetos que, sob o discurso de progresso, aprofundam o racismo ambiental, a desigualdade social e a violência contra os povos do campo, das águas e das cidades.

“Nós, do Movimento dos Atingidos por Barragens, seguimos firmes na luta por um projeto popular, onde a infraestrutura esteja a serviço do povo e da natureza, não do lucro de poucos”, reforça Naelson Pantoja, da coordenação estadual do movimento.

Ao lado das comunidades atingidas, o MAB tem construído alternativas populares que apontam para outro caminho: o fortalecimento da organização coletiva, a defesa do direito ao território, a exigência de consulta prévia e a luta por um projeto energético e de mobilidade que respeite os limites ambientais, colocando a vida no centro. O verdadeiro desenvolvimento é aquele que nasce dos povos e atende às suas necessidades, não o que destrói a floresta para encurtar o trajeto de mercadorias.

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