Nota | Contra a Hidrovia da Morte, em defesa do Rio Tocantins e dos povos amazônidas
MAB denuncia graves retrocessos e violações de direitos, caso a Hidrovia Tocantins-Araguaia avance, ameaçando a vida e o território das comunidades ribeirinhas, quilombolas e indígenas. O movimento exige a imediata suspensão das obras, o respeito às consultas prévias e informadas, e a garantia de justiça e reparação para os povos atingidos
Publicado 09/07/2025

O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) vem a público denunciar os retrocessos, as violações de direitos e as ameaças irreversíveis provocadas pelo projeto da Hidrovia Tocantins-Araguaia, que avança de forma autoritária sobre os territórios das populações ribeirinhas, quilombolas e indígenas do Baixo Tocantins, no Pará.
Sob o falso discurso do progresso, este megaprojeto, idealizado para servir ao escoamento de commodities como soja, gado e minério, representa, na prática, um projeto de morte para os povos que vivem do rio e com o rio. A adaptação forçada do Tocantins, com derrocagem, dragagens e construção de portos, atinge diretamente comunidades que há gerações pescam, plantam e sobrevivem da biodiversidade e da cultura ribeirinha. É um ataque frontal à vida, à água, à alimentação, à identidade e à soberania popular na Amazônia.
A Licença de Instalação concedida pelo Ibama, em maio deste ano, para a derrocagem do Pedral do Lourenço, representa um retrocesso gravíssimo na garantia dos direitos das populações ribeirinhas e preservação do meio ambiente. A decisão ignora recomendações do Ministério Público Federal, ignora as comunidades diretamente atingidas e ignora a sentença judicial que condicionava o avanço da obra ao cumprimento de medidas legais e ambientais. No mais, desrespeita a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, ao não garantir às comunidades o direito à consulta livre, prévia e informada.
O Estado brasileiro repete o mesmo roteiro de violações que marcou obras como a Hidrelétrica de Tucuruí: licenciamento atropelado, negação dos atingidos, invisibilização das mulheres e das comunidades tradicionais, violência institucional e a imposição de uma lógica de desenvolvimento que destrói o que encontra pelo caminho. Tucuruí deixou um rastro de abandono e a Hidrovia Tocantins-Araguaia ameaça fazer o mesmo.
Rejeitamos com indignação a narrativa de que os impactos são “baixos e temporários” ou “tecnicamente mitigáveis”. O rio não é um canal fragmentado em trechos. O Tocantins é um corpo vivo, integrado, cuja destruição em um ponto afeta tudo ao redor, inclusive as 23 comunidades que vivem próximas ao Pedral do Lourenço, invisibilizadas por decisões judiciais que negam sua própria existência.
Não aceitamos que condicionantes sejam utilizadas como moeda de troca para empurrar projetos de morte goela abaixo das comunidades. Saúde, educação, saneamento e outros direitos fundamentais não podem ser apresentados como “benefícios” para justificar a destruição dos nossos territórios. Esses são direitos garantidos por lei e não devem ser manipulados como ferramenta de barganha para enganar o povo. O MAB existe justamente para defender os atingidos e não permitirá que as comunidades sejam manipuladas por promessas vazias.
Seguiremos denunciando com firmeza qualquer tentativa de iludir o povo com falsas promessas de compensação. Não há, até o momento, qualquer garantia concreta de reparação ou mitigação dos impactos no processo de licenciamento da Hidrovia Tocantins-Araguaia. O que existe é a repetição de um padrão já conhecido: violação de direitos, omissão do Estado e favorecimento do agronegócio e da mineração. Nossa luta é por justiça, respeito e pela vida dos povos da Amazônia.
Essa obra não foi feita para nós. É um projeto feito contra nós. Ela visa atender às demandas de um modelo de desenvolvimento extrativista, violento e capitalista, que transforma rios em estradas, florestas em mercadoria, comunidades em obstáculos e vidas em dano colateral.
Durante o Mutirão dos Atingidos, realizado entre os dias 17 e 21 de junho nos municípios de Cametá, Baião e Mocajuba, estivemos em diálogo direto com as comunidades atingidas. Escutamos o povo, debatemos direitos, denunciamos violações e reforçamos a organização popular. É nesse chão que nasce a resistência. É a partir da luta coletiva que construiremos caminhos para barrar esse projeto e defender a Amazônia com justiça social.
Levaremos essa denúncia à COP30 e à Cúpula dos Povos, em Belém. Mostraremos ao mundo que, por trás das obras de infraestrutura vendidas como “soluções verdes”, se escondem interesses sujos do capital internacional, que massacram os povos da floresta e aprofundam a crise climática.
Não aceitaremos que a destruição do rio siga em nome do lucro de poucos. Exigimos:
- A suspensão imediata das obras da Hidrovia Tocantins-Araguaia;
- O cumprimento da Convenção 169 da OIT, com consultas livres, prévias e informadas às comunidades atingidas;
- O reconhecimento e a reparação integral às populações atingidas, nos marcos da Política Nacional dos Atingidos por Barragens (PNAB);
- Um modelo de desenvolvimento que respeite os territórios, os povos e os ciclos da natureza.
O rio é nosso. A vida é nossa. O futuro também será.
