Fortalecendo a Luta pela Saúde: MAB e Fiocruz promovem oficinas junto aos coletivos em todo o país
O objetivo é promover o direito à saúde plena e à dignidade das populações atingidas
Publicado 26/03/2025 - Atualizado 27/03/2025

Desde 2024, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) tem realizado uma série de oficinas de formação, por meio da parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), para fortalecer os coletivos de saúde nas comunidades atingidas por grandes empreendimentos, como barragens. Entre os estados contemplados no projeto estão Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Rondônia e Pará.
O projeto tem como foco principal a compreensão dos impactos causados pelos grandes projetos de infraestrutura na saúde das comunidades locais. Além disso, busca defender o Sistema Único de Saúde (SUS), garantir o acesso a um território saudável e sustentável e fomentar a participação das comunidades na construção de políticas públicas voltadas para a saúde.
As oficinas
A parceria entre o MAB e a Fiocruz já resultou em diferentes ações voltadas para a saúde dos atingidos, como a realização de pesquisas, eventos e um projeto sobre Saúde e Direitos Humanos que está em fase de consolidação. A atual iniciativa visa o fortalecimento de coletivos de saúde, que irão atuar diretamente nas comunidades atingidas por barragens e pelos efeitos das mudanças climáticas. Esse tipo de iniciativa é um avanço significativo na implementação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB), que se compromete a garantir os direitos à saúde e à reparação dos danos causados por essas obras.

Moisés Borges, integrante do coletivo de saúde do MAB, explica que a proposta das oficinas vai além da promoção da saúde física: “Um dos objetivos do projeto é aprofundar no entendimento de que saúde vai para além da ausência de doenças. A saúde precisa ser vista sob um conceito mais amplo, que leve em consideração as relações históricas, socioeconômicas e ambientais, entre outras. Não é possível ter saúde se somos ameaçados todos os dias por uma barragem que diz que vai nos expulsar de nossas casas. Não é possível ter saúde se a água e a energia deixam de ser direitos humanos para se tornarem mercadorias.”
Borges também destaca a importância da vigilância popular em saúde como um dos pilares dessas oficinas: “Temos três objetivos principais. O primeiro é o debate sobre o conceito amplo de saúde, que é a chamada determinação social da saúde. O segundo é como agir no território para alterar a realidade do adoecimento, o que propomos por meio da vigilância popular em saúde. E o terceiro é o fortalecimento dos coletivos de saúde do MAB, onde esse debate será aprofundado e se tornará referência política e de ação na organização.”
O que é a Determinação Social da Saúde?
A Determinação Social da Saúde é um conceito que propõe que a saúde das populações não depende apenas de fatores biológicos ou do acesso a cuidados médicos, mas também de fatores sociais, econômicos, culturais, políticos e ambientais. Isso significa que as condições de vida, como o acesso à alimentação saudável, à moradia, à educação, ao saneamento básico e à qualidade do ambiente em que as pessoas vivem, influenciam diretamente a saúde delas. No contexto das oficinas do MAB, a Determinação Social da Saúde destaca a importância de olhar para as condições sociais e históricas das comunidades atingidas por barragens, que muitas vezes vivem em situações de vulnerabilidade e precariedade, impactando diretamente sua saúde.




A Vigilância Popular em Saúde
Uma das abordagens centrais nas oficinas é a Vigilância Popular em Saúde, um método de monitoramento e identificação dos danos à saúde das populações atingidas por barragens. Olívia Santiago, integrante da coordenação do MAB, explica que a vigilância popular é uma ferramenta essencial para que as próprias pessoas atingidas possam monitorar os danos que sofrem e reivindicar políticas públicas adequadas. “A ideia é que a comunidade participe ativamente do processo de identificação e acompanhamento dos danos à saúde, contribuindo para um diagnóstico mais fiel à realidade dos territórios e pressionando por medidas de reparação e prevenção”, afirma Santiago.
Guilherme Camponês, da coordenação do MAB em Minas Gerais, complementa, afirmando que esse trabalho de construção de conhecimento coletivo sobre a vigilância é fundamental para a organização das comunidades: “Construir um conhecimento coletivo sobre a Vigilância Popular em Saúde é fundamental para que possamos monitorar os danos causados e atuar de forma mais ativa na luta pela saúde. Além disso, este é um momento importante, porque estamos organizando os coletivos de saúde em nível regional e estadual, o que nos permitirá dar mais unidade a essa pauta, fortalecer nossa organização e qualificar a luta pela reparação e pela garantia de direitos no país.”
Saúde Mental nos territórios atingidos por barragens
A saúde mental é outra questão abordada durante as oficinas, especialmente considerando os efeitos devastadores de tragédias como as de Mariana e Brumadinho. Estudos da Fiocruz indicam que, além dos danos físicos, as populações atingidas têm enfrentado graves problemas de saúde mental. Em Brumadinho, mais de 80% dos afetados relataram sintomas como ansiedade, insônia e depressão após o desastre. A falta de assistência contínua para esses danos invisíveis tem agravado ainda mais a situação de sofrimento psicológico.
“O luto pelas perdas humanas, a incerteza quanto ao futuro e a sensação de abandono por parte das instituições responsáveis pela reparação têm gerado um sofrimento psicológico prolongado nas populações atingidas”, afirma um estudo realizado pela Fiocruz, destacando a urgência de políticas públicas mais eficazes que considerem os impactos sociais, ambientais e de saúde causados por essas grandes obras.
A Importância do SUS
Outro ponto crucial debatido nas oficinas é a defesa do Sistema Único de Saúde (SUS). Profissionais da Fiocruz têm enfatizado a importância do SUS como um instrumento fundamental para a construção de uma saúde emancipadora, universal e gratuita. “É essencial que a população entenda o SUS como um direito e um instrumento de luta para garantir uma saúde que seja para todos, sem exceção. O SUS é a base de um sistema de saúde democrático e acessível, que não pode ser privatizado ou desmantelado”, explica um dos facilitadores das oficinas.



Um Futuro Coletivo para as Comunidades Atingidas
O trabalho realizado nas oficinas é um passo importante para transformar as comunidades atingidas por barragens em agentes ativos na defesa de seus direitos à saúde e à reparação dos danos sofridos. A proposta de criar coletivos de saúde locais é uma forma de fortalecer a participação comunitária e garantir que as necessidades de saúde dessas populações sejam atendidas de forma autônoma e eficaz.
Ao final de cada oficina, os participantes têm a oportunidade de discutir estratégias de ação política e comunitária. Além de elaborar planos para monitorar e mitigar os impactos da saúde, com o apoio contínuo de profissionais da saúde, pesquisadores e organizações do MAB.
Em um país marcado por desigualdades regionais e pela falta de políticas públicas adequadas para as populações atingidas por grandes empreendimentos, iniciativas como essas surgem como um farol de esperança para as comunidades atingidas, que continuam a lutar por um futuro mais saudável e justo.
