Atingidos cobram participação na reconstrução do Vale do Taquari (RS)

Atingidos reivindicam participação no processo de implementação de um plano de prevenção a eventos climáticos no território

Foto: Artur Macfadem / MAB

Cerca de 1.000 famílias organizadas pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) no Vale do Taquari (RS) pedem por mais participação nos espaços que debatem sobre a crise climática na região. Um ambiente a ser considerado é a mesa de discussão aberta recentemente pelo Ministério Público Federal (MPF) para tratar da implementação de um plano de prevenção a eventos climáticos. Por isso, o MPF entrou com uma ação civil pública estrutural contra a União, o Estado e mais de nove municípios do Vale do Taquari.

O processo está tramitando na 1ª Vara Federal de Lajeado e teve, nesta segunda-feira (22), a primeira audiência de conciliação para discutir a entrada de mais um participante no processo: os próprios atingidos. Juridicamente quem representa os atingidos é a Associação Nacional dos Atingidos por Barragens (ANAB). Segundo Djeison Diedrich, uma das lideranças do Movimento no Vale do Taquari, esta será a porta de entrada por onde as reivindicações oficiais do movimento devem passar.

“Foi um momento para os atingidos cobrarem um espaço de participação. A gente entende que a demanda é complexa e que a solução deve ser de longo prazo, mas os atingidos terão que participar.”, afirmou o dirigente sobre a reunião com MPF.

Prevenção também é segurança

Em alguns casos, a falta de vegetação causada pela existência de moradias construídas perto das encostas dos rios agravaram a passagem da enchente. As áreas verdes são importantes para combater o avanço acelerado da água.

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Por isso, a revitalização florestal desses territórios deve ser feita como parte de um plano de contingência. Na visão do Movimento, outras medidas também precisam ser adotadas, como o mapeamento das áreas regularmente afetadas, a manutenção do cadastro dos atingidos, a implementação de um sistema de alerta para as zonas de risco, o reassentamento das famílias que moram nesses locais.

Moradia adequada, segura e saudável

Foto: Artur Macfadem / MAB

A principal proposta dos atingidos é que a retirada das famílias das áreas de risco para locais seguros possa ser feita em condições melhores daquelas que têm sido apresentadas pelo poder público.  Afinal, o que fez o Rio Taquari ultrapassar a cota dos 30 metros no mês de maio não foi a existência da população ribeirinha. Mas o aumento da crise climática que o Rio Grande do Sul vem enfrentando juntamente com o descaso dos governos em relação a prevenção contra as cheias.

Durante a organização dos trabalhos de grupos que o Movimento atua, nas diferentes localidades impactadas pela catástrofe climática, seja em Lajeado, Estrela ou Arroio do Meio, a moradia tem sido a maior preocupação dos atingidos. Alguns estão querendo mudar de cidade, outros querem uma nova casa sem ter que deixar seu município e uns estão tentando retomar a infraestrutura que tinham em suas residências. 

Por que a participação dos atingidos é importante?

Sem a presença dos atingidos, as propostas pensadas para reconstrução do Vale do Taquari, e para o Plano de Proteção contra situações extremas de mudanças climáticas, podem não gerar o resultado esperado. Como, por exemplo, a iniciativa que o governo federal publicou semana passada, disponibilizando as moradias do programa Minha Casa Minha Vida aos atingidos com a renda per capita baixa.

O problema é que os atingidos que possuem uma renda superior à estabelecida pelo Programa não conseguem custear uma nova moradia. Oferecer um financiamento às famílias que perderam tudo só tende a aumentar o endividamento dos atingidos. Por isso, a proposta do MAB é dialogar sobre como o reassentamento pretende aprofundar na qualidade em que ele será realizado. Porque essa política preventiva significa a criação de uma nova comunidade, onde será essencial assegurar o acesso à escola, creche, posto de saúde, transporte público e Centro de Referência de Assistência Social (CRAS).

A participação dos atingidos impõe o respeito à cultura local. A maioria dos militantes do movimento construiu suas antigas casas coletivamente, com as próprias mãos, e não querem que o recomeço de suas vidas, após uma tragédia como essa, seja diferente.

O Ministério Público Federal busca para o próximo passo obter um diagnóstico da situação atual dos município de Arroio do Meio, Bom Retiro do Sul, Colinas, Cruzeiro do Sul, Encantado, Estrela, Lajeado, Muçum e Roca Sales. As prefeituras saíram da reunião com o compromisso de enviar os dados levantados relativos à enchente de maio ao MPF.

Na avaliação de Djeison, o encaminhamento tirado na reunião é insuficiente para garantir a participação dos atingidos, porém é um avanço no acesso a informações básicas que jamais deveriam ter sido omitidas.

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