CPI responsabiliza Braskem por afundamento de bairros em Maceió (AL), mas atingidos seguem sem reparação

Relatório final da CPI prevê o indiciamento de três empresas e de 11 pessoas, porém apresenta insuficiências no tratamento das vítimas

Foto: Gabrielle Sodré / MAB

Após meses de investigação, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) incumbida de analisar a atuação da Braskem em Maceió (AL) concluiu seus trabalhos nesta terça-feira (21). O relatório final do senador Rogério Carvalho (PT/SE) apresenta 14 pedidos de indiciamento por crimes ambientais, tanto contra pessoas físicas como contra empresas. Além disso, o documento confirma que a Braskem é a principal responsável pelo afundamento de cinco bairros da capital alagoana.

“A criação da CPI da Braskem representou uma conquista significativa para as vítimas e para a luta popular por justiça. A aprovação unânime do relatório é um marco, embora, sob a perspectiva das vítimas, apresente algumas imperfeições que não podem ser ignoradas”, destaca Mauricio Sarmento, morador de uma das áreas atingidas e membro do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB).

A exploração desenfreada de sal-gema em Maceió, intensificada a partir dos anos 1970, deixou um rastro de denúncias e apreensão entre os moradores, mas foi em 2018 que tremores causados pela formação de cavidades subterrâneas, devido à extração do mineral, abalaram os alicerces da cidade e causaram o afundamento dos bairros Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e Farol. Nas últimas décadas, moradores dessas localidades conviveram com rachaduras nas casas, afundamentos de ruas e tremores de terra, que se tornaram frequentes.

“É importante observar que o crime ambiental de Maceió não começou com um tremor de terra no dia 3 de março de 2018. Trata-se de um crime permanente, cuja consumação perdurou por décadas”, destacou o relator da CPI Rogério Carvalho (PT/SE) durante sessão na quarta-feira (15).

Em 2019 as minas tiveram seus trabalhos encerrados, mas os impactos já eram gigantescos. Cinco bairros afundados, cerca de 60 mil famílias obrigadas a abandonar suas casas e, pelo menos, 12 casos de suicídio. Além disso, a Lagoa Mundaú, um importante ecossistema local, pode perder espécies nativas, como o sururu, um molusco de grande importância para a culinária e a economia local.

Entre os pontos apresentados no relatório final, a classificação do crime cometido e a designação da empresa como criminosa representam avanços importantes do processo de reparação das vítimas. A CPI reuniu informações suficientes para indiciar oito pessoas ligadas à Braskem, entre diretores, gerentes, engenheiros e técnicos responsáveis ​​pela empresa. O relatório ainda aponta a necessidade de revisão, por parte da Procuradoria Geral da República e do Ministério Público, dos acordos de compensação financeira, socioambiental e de reparação de danos firmado com a prefeitura de Maceió, na gestão do prefeito JHC (PL), processo que beneficiou especialmente a Braskem em detrimento dos atingidos.

Leia também

Ato em Maceió cobra moradia segura e participação dos atingidos em acordo com Braskem

Para Moisés Borges, integrante da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), “o relatório da CPI comprova a denúncia dos atingidos, de que o que está acontecendo em Maceió é um crime. Ela destruiu e segue destruindo a vida de milhares de famílias. Assim como em Mariana (MG) e Brumadinho (MG), as empresas sabiam dos riscos e ainda sim escolheram colocar o lucro acima da vida”, aponta.

Diante da apuração feita, o relatório criminaliza a Braskem por lavra ambiciosa – que indica a exploração além do permitido, deixando minas improdutivas, por crime contra a ordem econômica e falsificação ideológica por meio de relatórios falsos entregues às agências reguladoras. Ainda responsabiliza os órgãos reguladores e a prefeitura de Maceió por trabalho “negligente” na fiscalização das atividades da petroquímica. Por fim, o documento propõe medidas para evitar a autorregulação das mineradoras, como a exigência de auditorias externas.

Conteúdos relacionados
| Publicado 21/12/2023 por Coletivo de Comunicação MAB PI

Desenvolvimento para quem? Piauí, um território atingido pela ganância do capital

Coletivo de comunicação Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) no Piauí, assina artigo sobre a implementação de grandes empreendimentos que visam somente o lucro no território nordestino brasileiro

| Publicado 06/12/2023 por Coletivo Nacional de Comunicação do MAB

Ato em Maceió cobra moradia segura e participação dos atingidos em acordo com Braskem

Durante ato, atingidos pelo crime ambiental de petroquímica pediram também indenizações para as vítimas e instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito da Braskem, responsável pela retirada de 60 mil pessoas de suas casas

| Publicado 03/12/2023 por Lucas Weber - Brasil de Fato

O que é colapso catastrófico e o que pode ocorrer em Maceió por conta da mineração da Braskem

Desde 2018, cinco bairros da capital alagoana estão “afundando” devido à atividade da empresa

| Publicado 24/05/2024 por Amélia Gomes / MAB

Conheça os atingidos pela enchente que são voluntários na Cozinha Solidária de Canoas (RS)

Além de alimentar 700 pessoas por dia, o trabalho na Cozinha também tem sido fundamental para a saúde mental dos atingidos